Carmen Langaro: coragem de mudar

Jornalista confidencia que é corajosa, tem um grande amor pela filha, pela cultura e pela arquitetura

Carmem Langaro - Crédito: Rafael Varela

Os olhos verdes, a pele bem clara e os cabelos escuros denunciam que a secretária de Estado Adjunta da Cultura, Carmen Sílvia Langaro, tem sangue italiano. Além dos traços na aparência física, ela também herdou a paixão por pizza - de preferência a da mãe-, e a personalidade forte.

Esta leonina de 58 anos recorda com orgulho do tempo em que o avô Aurélio era chacareiro na zona norte da Capital e da casa em que nasceu no Bairro Navegantes. São boas lembranças da Rua Padre Diogo Feijó, que se assemelhava a uma cidade pequena, com um beco cheio de casas.

Foi ali que a filha do contador José Francisco Langaro passou a infância, brincando com a escadinha de irmãos, Maria Emília, 63; Armando, 61; Augusto, 59;  e Angélica, 53, além dos amigos e primos. "Foi uma infância magnífica, num tempo em que as famílias conseguiam proporcionar isso, mesmo tendo poucos recursos financeiros", reflete. 

Desta época, ela também rememora as festas de Natal, em que os vizinhos se reuniam na rua e faziam uma cerimônia coletiva, e dos bons presentes que recebia dos pais, mesmo com a condição financeira limitada que eles tinham, não poupavam na hora de agradar a prole. 

Caminhar e ler

Carmen casou e se divorciou ainda muito jovem. E da relação nasceu o seu verdadeiro amor na vida, a filha Isadora. Também formada em Comunicação Social, a relações-públicas, hoje, trabalha com mídias sociais na Toyota, em São Paulo. Porém, a distância e saudade são amenizadas diariamente por meio das ligações e conversas via Whatsapp. Hoje, Carmen mora sozinha e diz que adoraria ter um cachorro, porém, não tem tempo para cuidá-lo e a mínima disposição para levá-lo para passear todos os dias na rua.

Seu dia começa tomando chimarrão e lendo os jornais. Desde que entrou no Governo, no final do ano passado, tem uma rotina de atividades intensas diariamente, inclusive fora do horário de expediente, como os eventos e atividades culturais que envolvem a Secretaria de Cultura, por isso, não tem muitos momentos de folga. Quando acontecem, gosta mesmo é de não fazer nada. De ficar em casa descansando, ou caminhar, ler livro, e ir ao cinema.

As caminhadas devem ser em locais que ela fuja do barulho do trânsito, como o miolo da Redenção. "Gosto de caminhar em locais silenciosos. Quando viajo visito muitos parques para caminhar e apreciar apenas o ruído dos pássaros e o voo das borboletas", brinca. As preferências de leitura são por ficção e os clássicos da Literatura, como Machado de Assis e Oscar Wilde. Além do escritor brasileiro Simões Lopes Neto e do alemão Thomas Mann, que escreveu "os livros da sua vida", 'A Montanha Mágica', de 1924, e 'Doutor Fausto', de 1947. Já o escritor norte- americano John Fante foge a estes, mas, conforme ela, tem uma escrita moderna e bem-humorada. 

Apaixonada por História, ela adora assistir a seriados do Netflix que tratem deste tema e que não contenham violência, pois de um tempo para cá decidiu que já assistiu muita violência na vida, como uma brasileira normal, então daqui para frente só quer coisas amenas. Evita o quanto pode filmes que a causem impacto negativo, por violência ou por dor. Compartilha que o cinema sempre teve um papel importante em sua vida, principalmente quando era jovem, pois era pobre, e a sétima arte era onde ela tinha a oportunidade de conhecer outras realidades, outros locais e culturas. Entre seus cineastas favoritos estão Carlos Saura, Pedro Almodóvar e Werner Herzog. 

Jornalismo e cultura

Formada em Jornalismo pela Unisinos, em 1983, e pós-graduada em Gestão de Negócios e de Pessoas, pela ESPM-Sul, em 2010, Carmen prestou seu primeiro vestibular para Arquitetura, mas não passou, então enveredou para  Comunicação. Porém, a paixão pela primeira área a fascina e adora conhecer o lar das pessoas. "A casa como ambiente em que as pessoas vivem para mim é reveladora. Sempre que viajo, gosto de conhecer como são suas casas, quais são os tipos de ambientes. Claro que isso envolve decoração de ambientes, design, conforto e aconchego no lar. Coisas que me encantam muito e com as quais eu me envolvo bastante ainda hoje", explica.

Começou na carreira com 23 anos, tinha pouco tempo de formada, estava recém-separada e com uma filha pequena. Por isso, não se sentia disponível para trabalhar como repórter em jornais, rádios ou TV, em função da disponibilidade de horários exigida. Então, foi trabalhar com Comunicação Empresarial, quando ainda era conhecida apenas como Assessoria de Imprensa e não era tão bem-vindo pela classe como um todo. Era início dos anos 80 e Carmen atuava como fornecedora de serviços de comunicação, atendendo a empresas do setor petroquímico, que também estavam começando.

Atuou nesta área até 2008, sempre atendendo ou trabalhando com a Copesul, até a empresa ser comprada pela Brasken e ela, demitida. Pouco depois, foi gerente de Marketing Institucional da Pública Comunicação (hoje, Moove), por um ano, porém já estava se sentindo como um 'peixe fora d'água' e, como não estava feliz, saiu da empresa, voltou a estudar e fez pós-graduação.

Incentivada por um amigo, montou a produtora Carmen Langaro Produção Cultural, que, entre seus clientes atendia à Orquestra Jovem do Rio Grande do Sul.  "De certa forma, esta área me devolveu as coisas que eu mais gosto, que é: habitar, ler e ouvir música. Ali, eu me achei e comecei tudo de novo e, aos poucos, fui conquistando clientes", explica.  

Passou ainda pelo jornal Correio do Povo e pela Plural Comunicação, nos anos 90. No final de 2018, foi convidada pela atual secretária de Cultura do Rio Grande do Sul, Beatriz Araújo, para integrar a pasta como adjunta, cargo que exerce desde então. "Como sempre fui meio tímida e reservada, fiquei pensando se estava à altura deste cargo, mas acho que sim. Estou aqui até hoje e ela não me mandou embora", brinca, dizendo que está neste barco até o fim do governo e que esta foi uma excelente oportunidade. Momento este em que estava querendo mudar outra vez e procurar novos rumos para a carreira.

Entre as referências profissionais, destaca os jornalistas Cláudio Abramo, Gilberto Dimenstein e o político, ministro da Agricultura no governo Emílio Garrastazu Médici, Luís Fernando Cirne Lima. Com ele, diz que aprendeu muito sobre política no mundo, não política partidária, e continua aprendendo sempre.

Valorizando o silêncio

Foi criada na religião católica, mas desde os anos 60 não é frequentadora de igrejas ou praticante desta religião, contudo, diz que o catolicismo está dentro dela. Além disso, tem uma admiração pelo espiritismo, já visitou a Sociedade Beneficente Espírita Bezerra de Menezes, que é perto de onde mora, e ainda quer ler o Livro dos Espíritos, de Allan Kardec.

"Viúva" assumida do cantor David Bowie, entre suas preferências musicais estão o rock, o blues e as músicas eruditas. Também sonha em ir para a Califórnia ouvir o cantor Neil Young tocar. Mas se tem um ritmo que ela abomina é o sertanejo universitário. Diz que detesta ter que ouvir e que são músicas que chegam a lhe causar um mal-estar.  Além disso, valoriza cada vez mais o silêncio. Dificilmente vai preferir alguma coisa a ele.

Sobre características, explica que a sua principal qualidade é a coragem, e como defeito destaca o pavio curto, a brabeza e a intolerância para frustração. Considerando-se uma pessoa feliz, diz que suas referências pessoais são os pais e a filha. "Sou muito fã dela, trocamos demais, aprendemos muito uma com a outra e ela é a coisa mais importante da minha vida", orgulha-se.

Para os próximos 10 anos, quer continuar trabalhando e achará bem bom se ocorrer alguma mudança, podendo ser de trabalho, empregador ou cidade, desde que possa continuar contribuindo para as pessoas terem mais acesso à cultura, ou para incluir as pessoas que são diferentes, negligenciadas ou oprimidas. Também está nos planos fazer uma viagem estradeira, com a Isadora, para os Estados Unidos ou México, tudo dependerá das condições financeiras e de agendas. Mais importante que o local, será a companhia entre mãe e filha.

Definindo-se como uma pessoa extremamente aberta a alterações, diz que não tem medo de mudar. É totalmente inconformada com a desigualdade do Brasil e sempre se coloca junto aos que estão em pior situação, pois acha que esta que é a grande massa dos brasileiros. "Aprendi com um professor que a nossa missão como jornalista é buscar a verdade e, por meio da informação, trabalhar para melhorar a vida das pessoas e reduzir as desigualdades. Assumi isso para minha vida". 

 

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