Daniel Herz: Democrata da comunicação

Ele se caracterizou por posições criativas e de vanguarda desde o tempo de estudante e hoje demonstra a mesma garra na luta contra um câncer

Daniel Koslowsky Herz nasceu em Porto Alegre em 29 de dezembro de 1954 e em pouco tempo já "estreava no meio editorial". Nos primeiros anos do ginásio, no Colégio Rosário, editou, junto com o colega e, em suas palavras, "bem-sucedido publicitário" Alfredo Fedrizzi, o jornalzinho de sua turma. Por isso não teve dúvidas quando terminou a escola. Foi cursar Jornalismo na Unisinos (Universidade do Vale dos Sinos). Embora estivesse bastante certo de sua vocação, resolveu fazer, paralelamente, Sociologia na Ufrgs (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), porém não levou o curso adiante.


Também freqüentou algumas disciplinas de Pedagogia, Psicologia, Direito e Economia - "para dar uma testada" -, mas acabou desistindo. "O ambiente acadêmico era muito fechado e acabei não me entusiasmando, queria era terminar meu curso para ter o diploma de jornalista", lembra Daniel. Sua primeira experiência no mercado foi no Diário de Notícias, quando ainda estava na faculdade.


Ficou algum tempo lá e, em seguida, participou do projeto Informação, um jornal independente semanal, que durou apenas oito meses, entre 1976 e 77. "Foi o único nanico, tirando o Coojornal - que tinha uma estrutura mais profissional -, que teve uma peridiocidade semanal, regular, fora do eixo Rio-São Paulo", conta. Já formado, teve a oportunidade de trabalhar em outro veículo alternativo, o Movimento, que tinha uma sucursal em Porto Alegre, até ingressar na Folha da Manhã.


Montando um curso acadêmico


No início de 1979, Daniel mudou-se para Brasília, para fazer mestrado, que só era oferecido na capital federal, no Rio de Janeiro e em São Paulo na área da Comunicação. Depois de um ano por lá, começou a lecionar na UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), onde a faculdade de Jornalismo estava sendo implantada. "Fui o primeiro professor do curso, junto com outra professora e o coordenador", recorda. A experiência em Santa Catarina Daniel considera "gratificante e intensa", pois esses primeiros professores tiveram envolvimento direto com a criação do curso e a liberdade de desenvolver soluções.


Muitos projetos que eles adotaram na faculdade, como um conselho de pais e alunos, foram precursores e hoje são comuns em diversas instituições de ensino. O curso da UFSC é considerado um dos melhores em Comunicação do Brasil até hoje, tendo sido premiado no último Congresso da Intercom (Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação) como Instituição Pragmática, troféu dado a entidades marcadas por trajetórias emblemáticas.


Daniel trabalhou por quatro anos na universidade, lecionando em disciplinas práticas e teóricas. Em 1982, começou a se envolver na luta pela democratização da comunicação. Estava se formando em Santa Catarina a Frente Nacional de Luta por Políticas Democráticas de Comunicação, que daria origem ao atual Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC).


De volta a Porto Alegre, em 1984, entrou numa fase de "conhecimento dos negócios da família", uma empresa do ramo comercial. Ficou na atividade, em função da qual chegou a morar no Paraná, apenas o tempo planejado, dois anos. Exatamente quando estava sendo lançada em livro sua dissertação de mestrado, "A história secreta da Rede Globo". A obra teve boa repercussão e Daniel passou a ser chamado para diversas palestras. Paralelamente, estava começando o processo da Constituinte, e a Fenaj (Federação Nacional dos Jornalistas) promovia um debate na sociedade para defender uma emenda popular sobre comunicação. O jornalista também se envolveu com esse projeto: "O ano de 1987, passei percorrendo o Brasil, atendendo a demanda do livro e fazendo campanha da Constituinte."


No ano seguinte, o trabalho teve continuidade, porém dentro do Congresso Nacional, coordenando a movimentação da Fenaj até que fosse aprovada a nova Constituição. "O capítulo de Comunicação foi um desastre", lamenta Daniel, "mas serviu para que se entendesse uma série de limitações que sofria a luta pela democratização da comunicação".


Comunicação na política


Terminada sua função em Brasília, retornou à capital gaúcha e se deparou com uma acirrada disputa no pleito municipal. Considerou ruim a campanha de Olívio Dutra, do PT (Partido dos Trabalhadores), e passou a integrar a coordenação das ações. "Achava que a campanha era puramente oposicionista e que o PT deveria tomar uma posição de protagonista da disputa", lembra.


Com a vitória de Olívio, Daniel passou a ser coordenador de Comunicação da Prefeitura, que ele também achava que precisava de mudanças: "A comunicação na esfera pública tinha os vícios de uma abordagem focada só em assessoria de imprensa. Queria um trabalho de coordenação de todas as funções de comunicação, em todos os órgãos, num sentido amplo." A experiência que começou do zero foi significativa para o jornalista, que acredita "ter resultado em novas definições sobre como estruturar a comunicação num serviço público".


Ficou na Prefeitura apenas nos primeiros dois anos da gestão Olívio Dutra e foi participar da criação do FNDC, que havia sido definida no Congresso dos Jornalistas, em Santa Catarina. Daniel atuou na secretaria do Fórum de 1991 a 1996, dando suporte para sua implantação. Como saldo desse processo, foram aprovadas as leis do Conselho de Comunicação Social, da TV a Cabo e da Radiodifusão Comunitária. "As duas primeiras foram mais tranqüilas, resultado de um consenso com o empresariado, mas esta última foi bem complicada e acabou bastante restritiva, mas foi importante por levantar a questão", avalia.


E também houve a formulação da nova Lei de Imprensa, que tramita há 13 anos na Câmara dos Deputados e já foi aprovada por todas as comissões. "Falta só levar para o plenário e votar, o que deverá acontecer em breve", acredita o jornalista.


Negócio próprio


Após mais dois anos envolvido com a empresa familiar, Daniel criou seu próprio negócio, um site de comunicação, que duraria cerca de três anos: o Acesso.com, e um instituto de pesquisas, que era responsável pelo serviço da página. O Epcom (Instituto de Estudos e Pesquisas de Comunicação) continua suas atividades, que hoje se limita a trabalhos de pesquisa e documentação.


 Sua estrutura reserva um espaço para o Fórum. Junto com Daniel, trabalha James Görgen, "que atua um turno no Epcom e outro na secretaria do Fórum" - brinca Daniel. O jornalista divide seu tempo hoje entre o Instituto, o Conselho de Comunicação Social, no qual representa sua categoria profissional, o Comitê Consultivo do Sistema Brasileiro de TV Digital, representando a Fenaj, e o Conselho Deliberativo da TVE, para o qual foi indicado, como representante da sociedade. E ainda toca os negócios familiares, que assumiu com seu irmão, depois da morte do pai.


É casado e tem três filhos. Com a esposa Célia, tem a Ada, de 9 anos, e o Guilherme, de 13, e do primeiro casamento, Fernando, de 19. Todos são estudantes, inclusive a mulher, que abandonou o jornalismo e cursa Psicologia na PUC (Pontifícia Universidade Católica do RS).


Apesar de ir freqüentemente para Brasília, Daniel diz que consegue manter uma rotina tranqüila. "Como as viagens são curtas, de dois ou três dias, no geral estou aqui e posso levar as crianças na escola de manhã e almoçar com eles em casa. É uma posição privilegiada", gaba-se. Em casa, não tem um hobby específico, "vou fazendo o que aparece", mas gosta de ler, está sempre lendo alguma coisa e passa por todos os gêneros. "Também gosto de cozinhar, mas ando meio preguiçoso", conta.


Esporte, então, nem se fala. Daniel confessa não ter o mesmo ânimo desde que começou a se tratar de um câncer de medula. "Não é segredo para as pessoas que se relacionam comigo que estou em tratamento há quatro anos", diz. Devido à gravidade da doença, o jornalista se trata num centro especializado em mieloma múltiplo nos Estados Unidos e já se submeteu a três transplantes de medula. Por isso, realiza viagens àquele país a cada dois ou três meses. Mas não se deixa abater, aproveita esses períodos para levar seu escritório ambulante e dar continuidade a seus trabalhos. Isso o ajuda a não ficar parado e serve ainda como terapia, ele garante.

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