Elis Radmann: Em busca do conhecimento

Cientista social fala de sua satisfação em aprender e como despertou para a profissão

Elis Radmann - Reprodução

Por Vanessa Bueno

Os ensinamentos do campo lhe servem de base para tocar os negócios. A Filosofia e a Sociologia lhe norteiam a vida. Aos 37 anos, a cientista social Elis Radmann comemora o sucesso de suas escolhas. É fundadora e idealizadora do IPO - Instituto Pesquisas de Opinião e está prestes a dar a luz a seu segundo filho. "A vida fica diferente com a maternidade", diz, confessando a corujice por Carlos, que nasce em março, e por Vitória, a filha mais velha, de sete anos.

Já nos primeiros minutos de conversa, Elis dá indícios de ser uma pessoa inquieta e ávida por conhecimento, a ponto de engolir sílabas quando explica os ensinamentos filosóficos que permeiam sua vida. A primeira lição, porém, ela não tirou dos livros. Vem da infância numa colônia no interior de Pelotas quando, filha mais velha de seis irmãos, ajudava nos afazeres do campo. A agricultura era a base de sustento familiar. "A regra na colônia é que conforme a tua idade é a quantidade de lenha que tu podes carregar", explica.

Cresceu ajudando na colheita de batata e feijão, preparando os molhos de couve, e depois indo à feira livre para vender os produtos com os pais. "O atendimento na feira me deu uma habilidade matemática muito boa, porque eu tinha que calcular quanto custavam os quilos de alimentos, fui aprendendo diariamente", conta, confessando que, às vezes, sente saudades daquela época.

Hoje, a filosofia de trabalho que ela segue no IPO tem raízes na agricultura.

"Nós sabemos que precisamos preparar muito bem a terra e cuidar, para depois colher. Os resultados não são imediatos. Nunca espero nada a curto prazo", diz, em analogia. Mesmo assim, lembra ela, você está sujeito a uma grande margem de problemas, tempestades, granizos e secas. Por isso, quando alguma situação ruim acontece, ela já está preparada financeira, física e emocionalmente.

O despertar para a Sociologia

Elis arriscou e fundou o IPO aos 21 anos, recém-saída da faculdade. A ideia de cursar Sociologia surgiu por acaso. Com 15 anos, deixou de ajudar os pais com o cultivo e venda de produtos agrícolas para trabalhar no comércio. Ela atendia em uma livraria e foi lá que conheceu a esposa de um embaixador, da qual não consegue lembrar o nome, e tão pouco do marido. Mas lembra bem do que dizia a senhora que lhe apresentou as Ciências Sociais. "Nós conversávamos muito sobre as obras literárias e conceitos da vida e um dia ela me sugeriu que cursasse Sociologia", lembra. "Achei que tinha tudo a ver comigo e fui atrás". O curso, no início dos anos 90, estava reingressando para as universidades, após ter sido extinto no período da ditadura.

Ingressou na Universidade Federal de Pelotas e começou a faculdade, conciliando os estudos com a atividade de comerciária. Quando estava no segundo ano, porém, em função de suas boas notas, foi convidada a ser bolsista do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ). Começou a trabalhar então meio-turno no comércio e outro meio-turno com as pesquisas.

Desenvolvendo pesquisas eleitorais, viajou pelo país inteiro. Sua vontade de aprender, associada à sua identificação com o curso, lhe levou a buscar cada vez mais conhecimento e embasamento teórico para as pesquisas que fazia. Foi nesta época que conheceu o professor Marcello Barquero, doutor em Ciências Políticas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs). "Aprendi muito com ele", destaca.

Na cara e na coragem

Mas algo lhe incomodava. Acostumada com as tarefas práticas, tanto do dia a dia com a agricultura, quanto do trabalho que desenvolvia no comércio, Elis não queria ficar só na teoria. Seu interesse era testar, na prática, se os conceitos dos filósofos se aplicavam à população. Com essas ideias, aos poucos, foi tendo visão de como tocaria a vida profissional após a formatura.

Na cara e na coragem fundou o Instituto que, nos primeiros seis meses, resumia-se a ela e um computador instalado em seu quarto. Saiu batendo de porta em porta oferecendo seus serviços até que fechou com o primeiro cliente, a Prefeitura de Pelotas, dois meses após o início das atividades. Depois de um ano e já atendendo a um número razoável de empresas, órgãos públicos e entidades, associou-se a Gisele Mendes, ex-colega de faculdade, que toca os negócios com ela até hoje.

Atualmente, o Instituto conta com 15 colaboradores fixos, podendo chegar a 100 pessoas, de acordo com os projetos em atendimento. Com unidades em Pelotas e Porto Alegre, Elis e o marido, Martinho Orso, que cuida da administração do instituto, passam viajando para dar conta dos negócios. Acabaram instalando sede na Capital. "Nos instalamos na Capital porque muitos clientes são estaduais e, muitas vezes, é necessário estudar as praças de Porto Alegre e região Metropolitana.

Trabalho em família

Formando uma boa dupla no trabalho, o casal se conheceu meio que por obra do destino. Os dois estavam ligando para uma amiga em comum e acabaram em uma linha cruzada. Como acontece nos filmes românticos, engataram uma conversa sem fim e descobriram-se afinados e curiosos em saber mais um do outro. Após uma semana de conversas ao telefone, marcaram um cinema. O encontro seria às escuras, já que nenhum dos dois fazia ideia de como o outro era. A aprovação foi tanta que, em apenas três meses, estavam morando juntos.

Os caminhos profissionais dos dois se cruzariam anos à frente. Há sete anos, grávida de Vitória, Elis se viu em um dilema. "Para conseguir me dedicar a minha filha eu precisava de um gestor administrativo, daí decidimos que ele viria para cá", explica. Assim, Martinho, que trabalhava na AnBev de Pelotas (na época Antartica)como gerente de Recursos Humanos, tornou-se o diretor-administrativo do IPO. O primeiro ano, conforme conta Elis, foi de adaptação. "Com o tempo a dobradinha começou a avançar e ficou muito boa. Muitos dos clientes que a gente atende nem sabem que somos casados", diz.

Quando não estão trabalhando, os dois gostam de curtir a família. "Sempre que dá vamos à praia, campo ou reunimos familiares. Geralmente as atividades são muito tranquilas", conta. A cozinha fica mais a cargo de Martinho, que recebe a ajuda da esposa e da filha. "A Vitória é parceira para tudo", derrete-se a mãe.

Em casa, outra de suas paixões é a leitura. Os títulos preferidos, mesmo na hora do lazer, são de filósofos como Sócrates e Platão. Também gosta de ler livros espíritas, embora não pratique a religião, "porque é possível cruzar boa parte da filosofia com os princípios da religião", explica ela. Todas as leis de causa e consequência, que estão no espiritismo, segundo Elis, são possíveis de se encontrar nos conceitos dos filósofos gregos.

Elis orgulha-se de dizer que nunca precisou tomar qualquer tipo de calmante ou antidepressivo. "Tem coisas que a minha capacidade não vai resolver, mas ok, faz parte do processo. Essa resignação e discernimento são princípios filosóficos, mas também são princípios espíritas", ensina Elis, que acredita ter relações melhores, tanto no âmbito profissional como pessoal, em função de seu conhecimento em filosofia e sociologia. Outro princípio que carrega, agora em função de sua sede de conhecimento, é, sempre que necessário, buscar aconselhamento com as pessoas que acumulam mais vivência do que ela.

Sem desistir

Uma dessas pessoas é sua avó Hedwig, com quem mora desde a infância. De quando era criança, lembra-se de um episódio em que acordou no meio da noite com um barulho. Correu para ver o que era. A avó estava segurando uma raposa pelo rabo. O animal estava tentando comer o leitão que elas criavam na propriedade. Acuada, a raposa deu uma dentada na mão de Hedwig, que não a soltou. Pelo contrário, começou a bater o animal contra a parede. Aos apelos da neta para que a soltasse, respondia: "Não posso deixar ela ir, porque ela vai voltar e vai matar nosso leitão". E continuou batendo até matar a raposa. "Aprendi que não adianta desistir, problemas existirão sempre. É preciso enfrentá-los". É essa determinação que Elis tenta passar para sua equipe.

No IPO, Elis segue algumas regras, como, por exemplo, não publicar pesquisas eleitorais. "Isso é um princípio da empresa que não vai mudar por dinheiro nenhum", ressalta. Ela explica que o objetivo é trabalhar o princípio cientifico e estratégico da pesquisa e que, se publicado, o estudo poderá estar ajudando a concorrência e perderá o caráter científico.

A rotina puxada de 12 horas de trabalho por dia, além das aulas que leciona no curso de pós-graduação da Fatec Senac, em Pelotas, não lhe tira o bom humor. O segredo? "Escolha o trabalho de que gostas e não terás de trabalhar um único dia em tua vida". A teoria de Confúcio é usada para exemplificar sua fórmula de sucesso. Hoje, seu sonho de consumo para o instituto é que ele se torne uma empresa ainda mais organizada e certificada em pesquisa. "Quero ver o IPO com as normatizações e os procedimentos tão bem enraizados, que não precise de mim para funcionar", diz, almejando mais tempo para se dedicar à família e aos livros que ainda pensa em escrever. "Tenho várias ideias na cabeça, preciso achar um tempo para sentar e colocar no papel", comenta.

Só no começo

Na vida pessoal, o momento é de celebração, com a chegada do segundo filho e a mudança para a casa nova. A residência, localizada em Pelotas, foi toda projetada pelo casal e deve ficar pronta em novembro.O espaço, ela explica, é todo ecologicamente correto, com o uso de energia solar e uso inteligente de água. Além disso, terá uma horta e um pomar, para ela e para a filha, que já adquiriu o gosto pelas coisas da terra.

Os ensinamentos de Elis para Vitória também se estendem à Sociologia. "Desde cedo ela aprendeu a conviver com as diferenças sociais", diz. Os aniversários da filha, por exemplo, são realizados nos mesmos moldes dos primos com menores condições financeiras. A menina, segundo conta, recebe muito bem as informações e tem boa capacidade de discernimento. "Ela, com certeza, será uma matéria-prima muito melhor porque já sai com uma base muito boa", destaca.

Sem imaginar aonde chegaria e que seguiria para o campo da Sociologia, diz que, desde criança, sua única certeza era de que queria estudar. "Sempre me imaginei estudando, não sabia se seria professora, mas gostava muito de ciência", destaca, ressaltando que não existe o que ela não sabe. Existe o que ainda não aprendeu. Sobre os projetos futuros, menciona apenas: "Vou chegar em algum lugar. Ainda não tenho bem claro como ele é, mas, digamos que estou só no começo".

Comentários