Fábio Piucco: Sempre em beta

Não planejar o futuro e aceitar que as possibilidades para ele são diversas faz o publicitário Fábio Piucco se sentir em constante desenvolvimento

Fábio Piucco | Divulgação
Por Márcia Christofoli
Quando era criança, gostava de assistir às propagandas na TV, tais como o cachorrinho da Cofap, a marca Rider e suas praias belíssimas, o bordão "Bonita camisa, Fernandinho" e os episódios do Bombril. Essas recordações unidas ao dom para desenhar e ao fato de folhear as revistas para ver as fotos fazem Fábio Piucco acreditar que a escolha pela Publicidade e Propaganda nos anos 1990 foi natural. Segundo ele, para prestar vestibular, sequer cogitou outro curso, mesmo que este fosse bastante concorrido na época.
Formado pela Ulbra em 2002, o diretor de Arte do Sistema Dez afirma que também sempre teve certeza da área que seguiria desde o início da faculdade, a Criação. Ansioso para entrar no mercado de trabalho e sabendo que havia uma academia nova no bairro, se ofereceu para criar a marca da empresa. "Esta foi a primeira peça do meu portfólio", conta, sorrindo como quem gosta do que vem à memória.
Aos 38 anos, Piucco acumula premiações importantes, como Diretor de Arte pelo Prêmio Colunistas por duas vezes, e outra pelo Salão da Propaganda. Teve ainda dois títulos internacionais, pela Archive e pelo site Ads of the world. Admite que esses reconhecimentos são sempre bons, mas não os considera o ápice. "Não sonho em ganhar Leão (em Cannes). Se um dia vier de forma natural, orgânica, vou achar sensacional, mas não quero atropelar pessoas nem processos para conquistar isso", pondera.
Ensinamentos
Com cerca de 15 anos de carreira, o publicitário acumula passagens por agências como BN Propaganda, SLM e Escala. A experiência na Parla está entre as mais marcantes, pois considera o início de tudo. Foi também nessa época que diz ter tido o privilégio de aprender com o Marcelo Firpo, um dos nomes que ganha sua admiração até hoje. "Foi uma experiência muito bacana. É um cara muito focado na ideia, na criação em si, algo que carrego até hoje", elogia.
Ter atuado por sete anos na Paim também é ressaltado com carinho, pois aponta esta como a experiência que mais o fez crescer. Na agência, por exemplo, ganhou como Ideia do Ano na ARP, "em uma época na qual só se destacavam profissionais da Escala ou da DCS". Também é dela que carrega uma frase dita por Fábio Bernardi, então diretor de Criação: cada dia com a sua agonia. "Isso mudou a minha maneira de viver a Propaganda. Até hoje, quando aparece muito trabalho, penso na frase. Com ela, aprendi a sofrer menos com as exigências do dia a dia."
Entre as referências profissionais, aliás, cita diversos nomes, como Juliano Faerman, Márcio Blank, Saulo Szinkaruk e Ismael Goli. "Deles tentei extrair as melhores características para formar o meu perfil profissional. São pessoas que dou graças a Deus que passaram pela minha vida, com quem aprendi e ainda observo muito. Tive sorte, pois fora do mercado também são grandes amigos", explica.
Entre ensinamentos, referências e realizações, um sonho. Piucco ainda quer ver as agências se tornarem mais horizontais em estrutura, hierarquia e salários. Vê esse movimento como tendência, mas gostaria que não demorasse a se concretizar, uma vez que acredita que os pensamentos de modernizar fiquem apenas nos discursos e na estética. Se, de fato, isso acontecer um dia, ele aposta em locais de trabalho onde as pessoas serão 100% felizes, mesmo reconhecendo que o cenário é quase uma utopia.
Sorriso bobo
Ao lado da esposa Paula Alcaraz Gomes Santana, designer gráfica, há uma pequena pessoa que faz o sorriso ser constante no rosto do publicitário. Ela se chama Lis e tem dois anos e meio. É pela herdeira que mantém uma rotina puxada, que exige acordar por volta das 6h da manhã e ficar com a filha até umas 8h30, fazer seu café da manhã, vesti-la, etc - só então inicia o expediente na agência. Dois dias na semana usa uma parte do intervalo de almoço para fazer treinamento funcional; nos demais, leva Lis para creche.
O fim do dia também é dedicado à filha, e isso se dá com brincadeiras, banho e hora de dormir. Depois é que entra um lado mais difícil da vida do diretor de Arte, que se diz um fissurado por esporte. Então, após os compromissos paternos é que sai para correr ou pedalar, o que acontece por volta de 22h ou 23h. "Às vezes, a Lis desiste de dormir cedo, e eu acabo adiando ainda mais esse horário ou até mesmo desistindo", revela.
Falar da pequena, a propósito, é um assunto que faz com que, instantaneamente, Piucco não pare de sorrir. Isso porque, nas palavras dele, "pode ser clichê, mas ter uma filha é sensacional". Ele confessa que chegou a pensar em não ter, mas que, "graças a Deus, mudou de ideia" e hoje pode ser dizer alguém menos egoísta, melhor em todos os aspectos, que aprendeu a abrir mão das preferências, pois Lis é a prioridade do casal.
Paula também é um nome que o faz transbordar felicidade, pois a ela atribui definições como absolutamente parceira para qualquer coisa, mulher inteligente, sensacional, com quem pode ter muitas trocas. E diz mais: "Temos um clima que eu adoro que é o de sermos namorados ainda, e acho que essa é a essência da vida de um casal. Nada envelhece quando há isso", derrete-se, visivelmente "bobo". Para Piucco, ser família é estar disponível 24 horas por dia e sentir prazer nisso. E toda essa certeza o faz querer aumentar a prole assim que possível - de preferência, com mais uma menina.
Muitas possibilidades
Pensar no futuro não é fácil para alguém que diz nunca planejá-lo. Por outro lado, a característica não impede que ele almeje alguns feitos. Empreender, por exemplo, é algo que ainda gostaria de fazer, talvez dentro da Propaganda, talvez fora, não sabe ao certo, mas se prepara para isso lendo livros e matérias, ouvindo pessoas que têm seus negócios. Ser diretor de Criação também pode ser um passo natural, cargo que ele já recusou mais de uma vez. "Tenho medo de deixar a essência da criatividade de lado e entrar na burocracia do dia a dia", admite.
Entre as possibilidades empreendedoras, podem estar unir a propaganda com esporte, assim como abrir um escritório de design. Nota-se, então, que as opções são diversas, o que ele não vê como o lado ruim, pois acredita que hoje em dia está mais fácil realizá-las. O único sonho que alimenta de fato, depois que teve uma filha, é "ter dinheiro suficiente para não se preocupar com dinheiro". Ou seja, não precisa ser milionário, quer apenas ter para proporcionar uma vida boa para Lis e poder aumentar a família.
Fábio é filho único de Moacir e Jacira Piucco, que sempre trabalharam com venda de joias. O fato de ser sozinho nunca atrapalhou nos conceitos de coletividade, uma vez que cresceu rodeado de primos e amigos. Quando mais novo, porém, confessa que tinha medo de casar com alguém que fosse filha única, pois queria que os seus tivessem tios e primos - para sua tranquilidade, Paula tem uma irmã. "Meus pais foram muito abertos, me incentivaram a fazer o que gosto, nunca foram exigentes ao extremo e sou muito grato por isso. A única coisa que eles não abriam mão era de que eu fosse uma pessoa legal, com boa índole", diz, em tom de agradecimento.
O que inspira
Para o diretor de Arte, o mercado publicitário proporciona altos e baixos de humor, o que pode deixá-lo com a sensação de estar sempre devendo algo criativamente. Situações como essas o fazem ir pra casa se sentindo mal. No entanto, no dia seguinte, pode surgir uma ideia pequena, mas que resolve, e o resultado é pensar que tem algum dom para isso. A frequência com que essa instabilidade acontece faz com que ele tente se controlar o tempo todo, "para não parecer tão bipolar".
A inspiração para criar, conforme Piucco, pode surgir de tudo o que for diferente e funcional. Ou seja, gosta muito de filmes, mas se considera muito eclético nisso. É capaz de ver alguns títulos só pela fotografia, ou pela história, ou pela performance de algum ator. "Ou seja, gosto de ver algo verdadeiro ou original", explica, contando que o que mais assiste na TV é a Peppa Pig, que, aliás, adora, e Patatí Patatá, que detesta. Quando a televisão é só dele, escolhe assistir séries como The Walking Dead e Games of Trones.
Ser leve e bem-humorado é uma característica que tenta manter profissionalmente. Às vezes, pode até achar que exige pouco da equipe, mas prefere que as demandas sejam cumpridas assim do que à moda antiga, "quando um diretor quase humilhava alguém para que, então, ele surgisse das cinzas e provasse que era bom". Ser gestor foi algo que aprendeu com o tempo e que percebeu ser mais complicado do que parecia. Resolver a pauta pode ser difícil, mas fazer isso e ainda ter que cuidar de uma, duas, cinco ou 10 pessoas exige ainda mais tempo e energia para conquistar equilíbrio. "Acho que minha equipe diria que sou uma pessoa fácil de lidar, que briga por eles e que os deixa à vontade para exercitar alguma ideia", confia.
Longe da Propaganda
Esporte é a palavra que mais aparece quando se trata da rotina longe do mundo criativo. Adora pedalar e até admite que investe nisso - hoje menos, claro, por causa de Lis. Segundo ele, as bicicletas evoluem e gosta de acompanhar isso, então, sempre pensa que "precisa" de uma nova. O que o atrai no esporte, explica, é a superação, por isso sempre busca treinos diferentes e metas novas.
E, como não haveria de ser diferente, alguns ensinamentos são levados para o dia a dia, como o caso da palavra paciência. Ele esclarece: "Trabalhar em agência, ter filha pequena, lidar com equipe e ser paciente. Isso tudo parece não conversar, por isso busco me superar diariamente". No esporte, talvez seja uma das poucas áreas que não se considera eclético. Chegou a praticar natação, mas hoje se resume a pedalar e correr. Também já teve fase de amar futebol, mas só quando era mais novo - se diz gremista, aliás, mas "só de nome", pois sequer saber dizer o nome dos jogadores.
Música também é algo de gosto variado, e muito. Ele ouve Rihana - e algumas pessoas acham graça disso -, ao mesmo tempo em que é fã de John Frusciante, guitarrista do Red Hot Chili Peppers, assim como de Chico Buarque e Vinícius de Moraes. Diz não ter nenhum tipo de preconceito musical, como no caso do estilo eletrônico, que não gostava, mas como está presente em competições de corrida ou bicicleta, acabou se acostumando e, hoje, ouve até enquanto trabalha.
Cinco ovos
A cozinha não é, definitivamente, um local de intimidade, apenas a churrasqueira. Como um bom atleta, se alimenta muito bem, mas confessa que adora carne vermelha, bacon, hambúrguer e demais exageros. É falando em cardápios que lembra de uma história engraçada: "Uma vez, fui me aventurar a fritar um ovo e achei aquilo tão legal, que fritei cinco ovos seguidos. Não comi todos, mas achei bem divertido", conta, rindo bastante.
Quem gosta de cozinhar, na verdade, é Paula, mas só quando tem vontade, não é algo que ela faça toda hora. Aqui, aproveita para uma certa alfinetada: "Tem um prato em especial, que faz muito tempo que ela não faz, que é o meu preferido: risoto de maracujá. Pode colocar aí, para ver se ela se anima", brinca novamente. Apesar da culinária não estar entre seus dons, ainda há esperança, pois seu pai começou a fazer isso não tem muito tempo e, hoje, é um cozinheiro de mão cheia. "Se estiver no meu DNA, quem sabe?", indaga, sorrindo.
Se gastronomia não é sua praia, viagens, com certeza, estão na lista de lazeres preferidos. Conta que adorou conhecer Praga, capital da República Checa, local que define como sensacional em arquitetura. "Lembrei desse lugar há pouco tempo, usei como referência em um trabalho e consegui resolver o que precisava", recorda. Os Estados Unidos tinham seu preconceito, mas aprendeu a gostar tanto, que foi o destino nos últimos quatro anos. O próximo? Sonha com a Suíça, motivado pelas montanhas e demais paisagens diferentes.
O país, por enquanto, é apenas uma vontade, afinal, ele não gosta de fazer grandes planejamentos. "Sempre deixei as coisas acontecerem e tem dado certo", garante. Na profissão, por exemplo, diz que não é diretor de Arte, mas está diretor de Arte. Ou seja, se precisar em algum momento, pode muito bem virar planejamento, sócio, criação, é só a proposta seduzir. "Sou uma pessoa eternamente em beta, ou seja, sempre em desenvolvimento, sempre aberto, nunca acho que estou pronto. Isso justifica eu não projetar o futuro", encerra.

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