Mocita Fagundes: Fôlego de sobra

Com 54 anos, ela não pensa em parar e garante que energia não lhe falta

Por Cinthia Dias

Contrariando a personalidade agitada, Mocita Fagundes se descobriu maratonista lentamente. Em 2016, decidiu trocar os deslocamentos de carro por caminhadas até o trabalho e, em seguida, passou a ir correndo. Cansada das passadas erradas, da falta de fôlego e da postura incorreta na prática do exercício, aproveitou a produção de um filme com uma corredora para pedir referências. A conversa resultou no começo dos treinos com especialista e, com eles, as primeiras provas em Porto Alegre e pelo interior do Rio Grande do Sul. Em quase dois anos, participou de competições tradicionais, como a Meia-Maratona do Rio de Janeiro, a Corrida de São Silvestre, em São Paulo, e a Maratona de Nova Iorque, nos Estados Unidos.

Inquieta, enjoou rapidinho do asfalto e logo se inscreveu para a primeira corrida de montanha. Quando os tênis sentiram a lama e o corpo se viu em meio à natureza da Patagônia, sabia o que queria fazer para o resto da vida. "Cheguei exausta, mas foi uma vitória", lembra, com tom de voz alto e entusiasmado. O misto entre corrida e caminhada lhe apaixonou, motivando-a a participar de uma prova no Chile, de 100 quilômetros em três dias, neste ano. A liberdade dá prazer à fundadora e diretora da Mythago, que necessita sair do confinamento diário da produtora.

Conexão Rio-Porto Alegre

Casada com o ator global Tarcísio Meira Filho há nove anos, compartilha que a história de amor nasceu do convívio com amigos em comum, que atuam na cena cultural brasileira. A união com Tarcisinho, como carinhosamente o chama, é considerada normal, ainda que as pessoas sejam "caretas" em julgar o fato de não dormirem juntos todos os dias, devido às rotinas de trabalho de ambos, um no Rio de Janeiro e outro em Porto Alegre. Atualmente, o casal se vê a cada 15 dias e a distância não atrapalha a harmonia. Confessa, às gargalhadas, que, quando chegar aos 60 anos - daqui a seis -, pensa em morar sob o mesmo teto que o amado.

Maravilhoso, tranquilo e lindo são os adjetivos que usa para descrever seu companheiro. Sem esquecer, é claro, dos dotes culinários. "Amo o bacalhau que ele faz", destaca. Ela garante que o marido é seu oposto em tudo, principalmente pela impulsividade, e dá o equilíbrio que precisa para conduzir a vida, além de lhe nortear no exercício da maternidade. Apesar de não terem herdeiros juntos, o ator e os três filhos de Mocita se dão muito bem. Gustavo, de 25 anos, e Bruno, 21, são fruto da relação com o publicitário Ingo Harter; enquanto Lisa, 15, do vínculo com o operador de câmera de Cinema, Marcelo Leite.

Para ela, a base da maternidade está no diálogo. Reconhece que exercer o papel de mãe é tranquilo, que o trio não causou problemas e sempre compreendeu sua ausência em função do trabalho. "Eles sabem que foi importante para que eu pudesse dar a eles o mínimo de conforto", declara, lamentando que sente falta de algumas passagens na vida deles. Também aproveita para reforçar que os pais nunca se ausentaram, tanto que, hoje, o primogênito reside com Ingo.

Fagundices

Criada no seio de uma família tradicionalista e, essencialmente, preocupada com a bagagem cultural passada a cada geração, é filha de Darcy Fagundes, declamador e apresentador do extinto programa Grande Rodeio Coringa, na rádio Farroupilha, e de Teresinha Fagundes. Vivia em meio aos corredores de emissoras e bastidores de apresentações musicais dos tios e primos. Entre eles, recorda com carinho a figura de Nico Fagundes, a quem atribui o apelido de tio-pai, devido à aproximação após a morte de Darcy, quando ela tinha apenas 19 anos.

"Ele me adotou afetivamente e me apresentava como filha." Interrompida pela emoção, entre lágrimas, lembra que a postura de Nico, no período em que enfrentou enfermidades, era encorajadora. Entre as recordações, destaca ainda o bom-humor, o nível intelectual e a memória do cantor, além das vezes em que lia revistas de história para ele no Hospital Ernesto Dornelles, em Porto Alegre. Mesmo após a morte do ex-apresentador do Galpão Crioulo, que lhe aconselhava e dava apoio e incentivos, ele continua sendo seu norte. Ao contrário da maior parte da família, que segue a crença metodista, afirma que, quando a situação aperta, pega a fotografia do pai adotivo, acende uma vela e pede: "Meu anjo da guarda, dá-me força".

E por falar nos Fagundes, diz que, anualmente, todos se reúnem para as festas do Natal ou no feriado da Páscoa. Os encontros, que juntam parentes do Rio Grande do Sul, de Brasília e de São Paulo, são chamados de Fagundaços. O vínculo entre os familiares se reflete, por exemplo, no apelido, que se tornou seu nome. Mocita é uma homenagem à avó Florentina, que assim era chamada. "Descobri que me chamava Cláudia quando entrei para a escola", conta, ao lembrar que nessa mesma época perdeu a mãe. Desde então, nunca permitiu que as pessoas se dirigissem a ela de outra forma.

Prova de respeito

Aos 15 anos, o filho Bruno foi diagnosticado com um problema grave na coluna, o que acarretaria, tempos mais tarde, em uma cirurgia complexa e extremamente cara em São Paulo. Antes, motivada pela sogra Glória Menezes, procurou especialistas na capital paulista, que constataram a necessidade da operação com urgência. Mais do que a cirurgia, o custo alto a pegou totalmente de surpresa: R$ 350 mil. Desolada, correu para o colo do tio Nico, que teve a ideia de fazer um show de Os Fagundes para arrecadação de fundos.

Com lágrimas, recorda, como se fosse hoje, o salão de um restaurante do DC Navegantes lotado de profissionais do mercado e de amigos que manifestaram solidariedade com a causa. "Foi a primeira grande prova de respeito por mim. Quando subi no palco para agradecer a presença das pessoas, brinquei que me sentia em um Salão da Propaganda gaudério", declara, detalhando que juntou R$ 57 mil. O restante foi pago pelos sogros. "Gratidão por tudo que fizeram", resume, visivelmente emocionada.

Sem saber quanto tempo levaria a recuperação do herdeiro, pediu demissão da Drops, produtora na qual trabalhava na época, para acompanhar o procedimento. E, no mesmo dia da apresentação beneficente da família, o amigo e ator Zé Victor Castiel ofereceu um espaço na própria empresa para que pudesse dar início à Mythago, dirigida por Mocita ao lado do marido. "Foi uma cadeia de solidariedade." O negócio viria a ser reconhecido, em 2017, como Produtora do Ano no Salão da Propaganda, evento promovido pela Associação Riograndense de Propaganda (ARP).

Encantamento à primeira vista

Na juventude, a irmã jornalista, Luciane Fagundes, lançou um jornal de bairro e Mocita candidatou-se para ajudar na comercialização dos espaços publicitários. Foi quando um profissional da área a convidou para conhecer a Agência Um. Encantou-se tanto com o universo da Publicidade assim que pôs os pés no local, que lá permaneceu por 13 anos. Mesmo seguindo a carreira na prática, na hora de escolher uma fomação, optou pelo curso de História na PUC, no qual é diplomada

Aos poucos, foi se aproximando da área de direção de Arte, estudando enquadramento e auxiliando em produções caseiras. "Foi nela que tive a chance de trabalhar com meu ídolo Marcelo Pires", registra a admiração pelo diretor de Criação da Competence.

Na sequência, passou pela extinta RBS Vídeos, onde aprofundou seus conhecimentos e técnicas em câmeras. Também atuou nas produtoras Brava e Drops, e a que mais lhe marcou foi a TGD, à qual colaborou por sete anos. Explica, sem rodeios, o diferencial: Beto Turquenitch, que "me deu muitas oportunidades, incentivou e acreditou no meu talento". A partir da relação, conheceu Beto Philomena e Beto Callage, além de participar do Festival de Cannes, na França.

Plano B

Assegura que não lhe falta pique para comandar a Mythago e dar conta dos filhos, do marido e dos treinos. "Otimista incorrigível", como costuma dizer, para ela não tem tempo ruim, embora confesse descer do salto quando tentam lhe entregar um trabalho meia-boca. Nisso, a prática da corrida foi essencial, pois deu à canceriana com ascendente em Áries mais condicionamento e tranquilidade. Das preferências pessoais, os musicais estão no topo da lista e garante que não perder nenhum, como Hair e Fantasma da Ópera. As idas ao cinema também lhe agradam, embora, agora, menos frequentes. Mesmo distante das telas, compartilha que seus filmes preferidos são dirigidos por mulheres: O Piano, de Jane Campion, e Encantadora de Baleias, de Niki Caro.

Mocita não pretende parar quando atingir a terceira idade e garante que está preparada para o sprint - termo usado para a aceleração que os corredores dão quando estão próximos à linha de chegada. O plano B é retornar à universidade na qual se graduou pela primeira vez para cursar Educação Física. Seu desejo é trabalhar com idosas para dar "um up" na autoestima delas. "Não pedi meu reingresso na PUC porque não sei fazer nada pela metade. Vou me apaixonar e vai faltar hora no meu dia."

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