Gabriel Von Doscht: Com grande dose de humor

Entre piadas e situações engraçadas, Gabriel Von Doscht conta que se sente muito confortável no ambiente online

Gabriel Von Doscht | Divulgação
Por Márcia Christofoli
Trabalhar com Propaganda não era bem o que Gabriel Von Doscht queria quando escolheu cursar Desenho Industrial, na Ulbra de Carazinho, cidade onde nasceu. O desejo era ser designer de produto, mas a trajetória profissional, mal sabia ele, o levaria para o mundo da Publicidade rapidamente. Os 33 anos de idade e "a cara de adolescente", como gosta de brincar, podem enganar, mas os 15 anos de mercado carregam um portfólio de peso, com marcas como  Brastemp, Melissa, Unimed, Oi, Sport Club Internacional, Paquetá e Pepsico, entre outros.
Hoje, Gabriel é sócio-diretor da Preza, uma produtora especializada em produção de conteúdo para redes sociais e disseminação de campanhas de marketing online. Considera este o seu melhor momento profissional, já que sua empresa sempre "voou abaixo do radar", uma expressão que usa para explicar que nunca fez questão de se vender ou de ter visibilidade, a atuação foi sempre de bastidores. "Essa entrevista, por exemplo, eu jamais toparia em outros tempos", revela, completando que, agora, o posicionamento é outro.
A Preza, depois de quatro anos, ganhou recentemente um espaço físico, na Padre Chagas, e prospecta clientes de forma direta, não mais apostando apenas em ser fornecedora de agência de Propaganda. "Quero manter o perfil de empresa não tradicional, pois não gosto do modelo engessado de hoje. Criamos uma sede por sentirmos necessidade de estarmos todos juntos, no mesmo ambiente, até para agilizar os processos", detalha.
A aposta em 2016 é grande e ousada e já incluiu uma fusão com a Ouve.me, empresa especializada em pesquisa e relacionamento com consumidores, e outra com a Coisa Filmes, produtora de vídeos. As novidades, para ele, proporcionam atingir novos clientes e oferecer um serviço completo, barateando custos e tornando o preço mais atrativo. "Queremos mostrar ao mercado que, sim, é possível anunciar nas mídias tradicionais, mas também direcionar - e em cifras bem menores - investimento para online, ambiente onde, muitas vezes, se atinge um público mais direcionado", defende.
O caminho
Quase impossível é contar a trajetória profissional de Gabriel de forma cronológica, pois este é um caminho recheado de vai e vem. Por exemplo: trabalhou em Passo Fundo, como webdesigner, em uma agência chamada G10. Em Porto Alegre, passou rapidamente pela Box3, como designer, e pela Babuska, onde tinha a missão de transformar ações offline em campanhas para o ambiente digital. Se somar todas as experiências, o que realmente mais fez foi atuar como freelancer, que era como gostava de trabalhar, especialmente para poder aprender e se especializar no que, de fato, crescia como paixão: o marketing online.
O maior desafio, porém, não ocorreu em solo gaúcho. Como autônomo, passou algumas temporadas em São Paulo, atendendo a projetos específicos, até que, em 2007, veio a proposta de morar na terra da garoa. A agência era a Alfaiataria Digital e a atividade consistia em educar a equipe de design a fazer seus trabalhos para web. "Fui para ganhar três vezes mais do que recebia aqui, então, achei que fosse a oportunidade da vida, mas percebi que, para ficar bem lá, seria necessário umas seis vezes mais, pois o custo de vida também é muito alto", recorda.
E não foi só o lado financeiro que pesou. Como não tinha comprovante de renda para alugar um teto, passou três meses morando na própria agência, cuja sede era originalmente uma residência. Depois de conquistar seu espaço, foram necessários apenas mais 90 dias para perceber que Porto Alegre era seu lugar preferido. "Foi horrível a experiência de não ter a própria casa, mas considero ter sido essencial passar por isso, pois, se não tivesse me aventurado, talvez até hoje estivesse pensando em como seria legal ir para lá", reflete.
O mundo digital
O interesse pela internet surgiu de forma natural, ainda durante a faculdade e, incentivado por um ex-chefe, passou a pesquisar sobre o meio, mesmo quando este ainda não oferecia muitas ferramentas. Era início dos anos 2000 quando criou um blog, algo pouco disseminado - e os que existiam, eram temáticos. Já o canal de Gabriel servia como "um diário virtual besta", pois era ali que criava histórias de um personagem que tinha uma vida muito melhor do que a verdadeira, como ele descreve. A internet evoluiu e ele acompanhou, tanto que foi por conta dessa presença digital que conquistou os primeiros trabalhos de produção de conteúdo online.
Com o tempo, cultivou amigos virtuais, que vieram a se tornar as chamadas webcelebridades. Este é um mundo pelo qual gosta de transitar, "sem precisar ser uma delas", segundo ele, pois facilita até mesmo na hora de contratar algum formador de opinião deste ambiente. E sobre isso, diz ser difícil citar alguma referência, pois acredita que pertence a uma geração que cresceu autodidata. Pensando um pouco, lembra de Saul Duque, do Sistema Dez, a quem atribui o título de "um dos poucos sócios-diretores de agência que entendeu como a internet funciona e tenta efetivamente mudar o cenário".
Durante toda a conversa, transparece o quão crítico Gabriel é ao mercado publicitário, mesmo reconhecendo que trabalha para ele e que as agências, aliás, ainda são suas principais clientes. O que não lhe agrada, em especial, é a forma de remuneração, pois não acredita em comissão de mídia, produção, BV, etc, e prefere cobrar por projeto e produzir tudo o que puder com esse investimento, pois aposta que essa é uma forma mais transparente de lidar com os clientes. Por outro lado, entende que o modelo de negócio da Propaganda cresceu assim e é difícil mudar agora. "Falo mal porque, se ninguém criticar agora, vai continuar crescendo do jeito errado. É apenas o meu jeito de tentar educar o mercado", aposta.
No offline
Gabriel é casado com a também designer Cintia Loureiro há 10 anos - ela, inclusive, o acompanhou em todas as mudanças de cidade. Conheceram-se nos tempos de faculdade e hoje, além de parceiros de vida, estão também lado a lado nos negócios, já que a esposa é sócia na Preza. "Quando fiz uma campanha política, tinha cláusula de sigilo, então, precisava de alguém em quem pudesse confiar profissional e pessoalmente. Foi quando começamos a trabalhar juntos", lembra. O casal não pensa em ter filhos, decisão tomada ainda no início do relacionamento. O sentimento paterno é depositado na gata Petit Gateau, a quem chama de gato - assim mesmo, no masculino. "Gosto de pensar que tenho um rival dentro de casa", conta, aos risos.
Sorrir, aliás, é algo que parece fácil para o homem loiro de olhos azuis claríssimos, que faz piada, analisa fatos com brincadeiras e, às vezes, até pede desculpas pelo bom humor natural. Ele aparenta mesmo ter bem menos idade e a observação é reafirmada quando conta que, recentemente, uma cabeleireira perguntou a faculdade que ele cursava. "Comecei a rir e expliquei que sou formado tem mais de 10 anos. Isso acontece com certa frequência", admite.
O filho da dona de casa Bernadete e do administrador Paulo, falecido há 10 anos por conta de um enfisema pulmonar, é o único da prole há algum tempo, pois perdeu o irmão mais velho, Alessandro, vítima de um acidente de carro. E até para contar esses fatos, ele fala sorrindo e olhando para cima - como quem reflete: "Que história triste essa minha, hein?". Da infância, lembra de jogar futebol, mas abandonou o esporte na adolescência, quando se apaixonou pelo skate - participando, inclusive de campeonatos. "Na verdade, descobri que só integrava o time de futebol porque minha mãe era influente no clube", brinca, mais uma vez.
O esporte do coração foi interrompido quando começou a trabalhar e, hoje, admite que tem dois skates apenas como peças decorativas. "Ano passado cheguei a me arriscar de novo, e tive a brilhante ideia de dar uma manobra como as que eu fazia quando tinha 15 anos. Fiquei uns dois meses sem conseguir caminhar direito", conta, destacando que até hoje acompanha a modalidade pela TV, para saber quem são os atletas do momento.
Comer, e muito
Por ter dedicação máxima à empresa, confessa que os dias de folga são quase inexistentes, mas encontrou algumas formas de pegar mais leve. Uma delas foi abandonar o notebook e comprar um computador de mesa, que faz questão de, ao ser desligado, não se aproximar mais dele, nem nos finais de semana. Como entende a necessidade de ter férias, já que as últimas foram em 2012, afirma que, agora, com a equipe reunida - no total, somam 13 colaboradores -, pensa em fazer alguma viagem mais estendida, talvez de lua de mel atrasada, já que ele e Cintia se casaram oficialmente em cartório em 2015.
Ainda não tem destino, mas garante que gosta mesmo é de turismo gastronômico. Quando o casal foi a Montevidéu, por exemplo, não percorreram nenhum ponto turístico. "No último dia, achei que não havíamos comido o suficiente, então, fomos em quatro restaurantes, fizemos quatro jantas, mas, claro, comemos bem pouco em cada uma delas." Comer, aliás, é o que o casal mais gosta de fazer. Isso inclui restaurantes diferentes ao menos duas vezes por mês, padarias aos sábados pela manhã e sushi com certa frequência. "Não temos planos de ter filhos, nem carro. Ou seja, nosso dinheiro é desviado basicamente para isso", conta. Por mais fácil que pareça, o hobby tem restrições, já que Cintia não come carne vermelha, nem frango, então, optam por locais que ofereçam diversas opções em seus cardápios.
Outro passatempo que vem ganhando a atenção de Gabriel é se envolver em projetos audiovisuais. Recentemente, dirigiu um clipe da banda Bidê ou Balde e, no momento, participa de outro, dos Walverdes. Assistir TV também entra na lista de prazeres, e sobre isso se diz capaz de ver absolutamente qualquer coisa que estiver passando em uma tela. Apesar da facilidade, admite que tem os preferidos, sim, e neles estão os filmes de Cameron Crowe, elencando "Quase Famosos", como o predileto. "A primeira vez que assisti, assim que terminou, vi de novo, e mais umas três vezes na mesma semana", recorda.
Para ler, prefere romances, nada de biografias ou livros técnicos. Por influência da esposa, passou a admirar Moacyr Scliar, especialmente o seu "O exército de um homem só". Mesmo parecendo um paradoxo, o último título foi sobre publicidade: "Acredite, estou mentindo - Confissões de um manipulador das mídias", de Ryan Holiday. Aos ouvidos fazem bem músicas de diferentes estilos, pois, apesar de gostar de rock, é capaz de ouvir as músicas da Anitta, só para ver o que os outros estão gostando. Atualmente, porém, as clássicas têm conquistado atenção, já que Cintia toca violoncelo.
Engraçadinho
Gabriel se diz um cara diferente, alternativo e, às vezes, até estranho. Isso porque tem gostos, conceitos e manias que fogem um pouco do comum. Um deles, nem tão raro assim, é ter medo de médico, pois acredita que "quem procura, acha". "Tenho uma mancha no peito que mostrei superficialmente para um tio que é médico, e ele disse que não era nada. Fiz o mesmo com um amigo e a resposta foi igual. Pronto, já tenho duas opiniões. É suficiente", conta, aos risos.
Diz não ter Transtorno Obsessivo Compulsivo, o famoso TOC, mas admite ser extremamente detalhista. Costuma ser elogiado pelos briefings que escreve, pois coloca todas as informações possíveis. Os amigos, ele conta, zoam das suas tabelas de Excel com cronogramas coloridos. "Sou planilheiro. Quando me aposentar, não quero fazer faculdade de Filosofia, como pensava na adolescência, quero estar em um fórum sobre ferramentas do Excel. Seria muito mais legal, não acha?", indaga. Por ser detalhista, também considera ter pavio curto quando as coisas não saem como quer, e confessa que é algo que trabalha nele o tempo todo.
Um sonho? A casa própria, mas engana-se quem pensa que a quer para acumular patrimônio. O desejo é apenas para poder ter autonomia de decorar o lar do seu jeito. "Compro revistas de decoração e arquitetura com frequência. Talvez seja uma mania", analisa. Ele também se diz capitalista e comunista ao mesmo tempo: não gosta dos clichês de empresários, mas faz questão de sair para comer bem, mesmo que isso signifique gastar mais do que está acostumado. Por outro lado, quer ficar rico, mas só se a sua equipe enriquecer junto. "São os meus antagonismos", pondera.
Gabriel não chega a ter um lema, mas garante que transparência em todas as relações é uma característica que faz questão de ressaltar. Daqui a 10 anos? "Talvez aposentado. Para internet, já sou um idoso", brinca, como na maioria do tempo. E é sobre esse bom humor que ele faz uma ressalva, quase uma explicação: "Sou muito engraçadinho, mas sei que isso me causa alguns problemas. Não consigo ficar sem fazer graça, mas preciso cuidar para não virar o "tiozão piadista". Eu acho que me defino assim: uma pessoa sem medo de soar boba se for para passar uma mensagem".

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