João Roberto Brito: Eterno desassossego

Atual diretor regional do SBT, ele já viajou por várias partes do país em busca das melhores oportunidades de trabalho.

João Roberto Brito, 44 anos, leva uma "vida de mascate, de caixeiro-viajante", como ele mesmo define. Sempre em busca das melhores oportunidades de trabalho, já viajou o país e testou-se em diversos empregos. Seu currículo ainda traz uma excelente formação acadêmica, o empreendedorismo nato e a disposição para mudanças não planejadas. Atual diretor regional do SBT, ele é o responsável pelas atividades da emissora no Rio Grande do Sul, em Santa Catarina e no Paraná, e se esforça para conciliar de forma equilibrada a correria da profissão com o convívio familiar. Pai de primeira viagem, dedica todo o tempo livre para as três mulheres de sua vida: a esposa e as duas filhas.


Natural de Porto Alegre, passou a infância e a adolescência dividido entre a capital e o interior, desfrutando da infra-estrutura de um centro urbano e também do contato com a natureza em pequenos municípios. Nos períodos escolares, permanecia na cidade natal, enquanto nas férias e em alguns finais de semana alternava visitas a Taquara e a Cachoeira do Sul, onde nasceram seu pai, João Milton, e sua mãe, Romilda, respectivamente. "Meu pai possuía um rancho colonial em Taquara, no distrito de Entrepelados, na beira do Rio dos Sinos. A propriedade está na família há gerações e foi lá que eu aprendi a nadar, conduzir carreta de boi e pescar lambari", recorda com carinho.


Em contrapartida, a adolescência ficou marcada pelos bailes na Sociedade Rio Branco, em Cachoeira do Sul, terra onde teve grande convivência com a família materna, bastante numerosa. Os dois irmãos mais novos, Marcos Alexandre (já falecido) e Luciana, foram companheiros nas brincadeiras e nas festas e também reservam um lugar importante nas lembranças de Brito. Dessa época, ele ainda destaca os estudos, realizados integralmente em escolas públicas. "Do jardim de infância à faculdade, sempre estudei na rede pública. Não dei prejuízo aos meus pais", brinca.


Fazendo dinheiro


Paralelamente à vida escolar, o executivo sempre se preocupou em trabalhar e ganhar o seu próprio dinheiro. Por isso, aos 16 anos, assumiu o primeiro emprego com carteira assinada: atendente de crediário nas Lojas Renner do Centro Comercial João Pessoa. Pouco depois, aos 17, junto com o irmão Marcos, empenhou-se na venda de enciclopédias a domicílio. "Fomos a todos os bairros de Porto Alegre batendo de porta em porta", conta. Ao final de seis meses, a empreitada rendeu a compra de um moderno aparelho de som, motivo de orgulho para os manos.


Apesar da prática na área de vendas e do talento já manifestado para lidar com os números, Brito acabou prestando o seu primeiro vestibular para Medicina, em 1978. A tentativa foi frustrada, e a pressa de ingressar na universidade e conquistar a autonomia financeira o empurrou para o curso de Administração de Empresas, no qual foi admitido um ano depois, na Ufrgs. Para ele, a entrada na faculdade representava a possibilidade de novos trabalhos, com melhor remuneração e tarefas de maior exigência. E foi com essa perspectiva que entrou para o programa de trainees da extinta rede de varejo JH Santos, já no primeiro ano da graduação.


"Em dois anos, passei por todos os setores da loja: almoxarifado, recursos humanos, estoque, marketing?", enumera com a certeza de um bom aprendizado. Ao seu lado, como colegas no programa de trainees, estiveram Raul Costa Júnior, atual diretor de Jornalismo da RBS TV, e Paulo Pinheiro, gerente-geral do Shopping Praia de Belas. "O Paulo ainda foi meu colega na faculdade e amigo desde a adolescência", complementa. Em 1981, com o final do treinamento, Brito já chegava à metade da graduação e sua mãe, preocupada com a falta de estabilidade, lhe arranjou um emprego em um banco. Antes disso, também devido à influência materna, disputou vagas em muitos concursos públicos. "Graças a Deus, não passei em nenhum", comemora com ironia.


Rotinas fora


Sua nova atividade profissional envolvia a área de crédito imobiliário do antigo Banco Sulbrasileiro, onde experimentou por seis longos meses "um trabalho burocrático e repetitivo", lamenta. Após demitir-se, contudo, estendeu sua trajetória bancária por mais dois anos, desta vez com uma atuação prazerosa no Banco Maisonnave, onde assumiu tarefas nos departamentos de comércio internacional e orçamentos. "O Maisonnave foi uma escola", garante. Ao final desse período, em 1985, ele já havia concluído a faculdade e buscava novos desafios. Foi quando surgiu a oportunidade de integrar o programa de trainees do grupo RBS que, na época, estava em expansão. "O salário era muito bom e com ele paguei o meu primeiro carro, um Chevette branco 78" , ressalta.


A partir daí, foram três anos de trabalho na empresa. Após o treinamento, passou pelas funções de assistente de diretoria, chefe da área de crédito e gerente de cobranças. Simultaneamente, administrava uma pizzaria junto com o amigo Paulo Pinheiro, um estabelecimento voltado para um público de artistas e boêmios. "Não ganhamos dinheiro, mas nos divertimos muito", assegura. O negócio fechou em 1986, devido ao Plano Cruzado, mas deixou ótimas recordações para os dois amigos.


Um dos freqüentadores mais assíduos do restaurante era um dinamarquês que atuava na RBS na condição de intercambista. "Tínhamos a mesma idade, trabalhávamos juntos e nos identificamos muito", conta. Quando seu colega retornou ao país de origem, eles mantiveram o contato e esta amizade foi definitiva quando Brito decidiu trilhar novos caminhos. Desanimado com as atividades profissionais que vinha desempenhando, optou por viajar, em 1988. O destino escolhido, claro, foi à Dinamarca. "Planejávamos abrir uma pizzaria em Copenhague, mas isso nunca aconteceu", confessa. No total, foram 100 dias na Europa e o roteiro realizado ultrapassou as fronteiras da Dinamarca.


De volta ao Brasil, foi chamado pela RBS para trabalhar em Florianópolis, onde permaneceu um ano. "Me senti sozinho e voltei em 1989" , admite. Sempre perseguindo as melhores oportunidades, nunca teve problemas em fazer as malas e mudar de endereço. Assim, saindo de Florianópolis, voltou a Porto Alegre e empregou-se em um ramo diferente: o departamento financeiro de uma empresa de implementos rodoviários. "Fiquei lá apenas um ano, era muito diferente do trabalho com mídia e não me adaptei", comenta. Nesse momento, foi convidado a assumir a gerência financeira da RBS TV, proposta que aceitou com satisfação.


Rumo à gestão de negócios


Pouco tempo depois, tornou-se gerente executivo da emissora, mas sonhava mais alto. "Eu estava limitado ao setor financeiro, queria atuar como gestor de negócios", justifica. A grande chance surgiu em 1993. Renato Sirotsky estava retornando de São Paulo e alguém deveria substituí-lo na administração do RBS Vídeo, empreendimento que a empresa mantinha na capital paulista. Com a indicação de seu nome, ele tratou de mudar de cidade e casar-se com Ana Paula, hoje com 37 anos, com quem já namorava há dois anos. Além do matrimônio, Brito também assinala a compra do primeiro carro zero nesta época, uma camioneta Ipanema, resultado do bom salário conquistado.


A adaptação ao novo estado foi fácil. O casal logo fez amigos e passou a usufruir da enorme infra-estrutura disponível. Brito aproveitou as alternativas de estudo e aprimorou seus conhecimentos: realizou uma especialização em Marketing Direto na Fundação Getúlio Vargas e um MBA na USP. Além disso, formou-se em um curso de gestão nos Estados Unidos, construindo um currículo de dar inveja. Após dois anos, devido a um acordo do Grupo RBS com outras empresas, voltou às origens e tornou-se diretor financeiro da NET São Paulo. Exerceu a função por dois anos, quando se transferiu para o Paraná no cargo de diretor da NET local por mais dois anos.


Com o término de suas atividades no Paraná, em 1998, voltou a São Paulo e engajou-se em um projeto completamente diferente de tudo o que já havia feito. Instalou-se na cidade de Vinhedo, no interior do Estado, e tomou à frente da operação do parque temático Hopi Hari, criado nos moldes da mundialmente conhecida Disney World. Era o começo de um negócio que se consolidou e continua na ativa atualmente. "Eu era o responsável pelo funcionamento do parque e pelos seus 1.750 funcionários. Chegava lá às 8h e ia embora quando o último visitante deixasse o estacionamento, por volta das 22h, de domingo a domingo", relata. Apesar da boa experiência adquirida, abandonou o negócio dois anos depois, completamente exausto.


Embora pensasse que a partir daquele momento teria uma vida mais tranqüila, acabou assumindo um outro emprego que lhe exigia dedicação total. Em 2000, foi chamado por um head hunter para trabalhar em Brasília, na função de diretor corporativo de uma empresa de celulares. O empreendimento possuía abrangência em 12 estados do país, demandando para sua administração viagens freqüentes. "Eu era visita na minha casa", brinca. O empenho excessivo resultou em um grande cansaço físico e na diminuição significativa de seu convívio com a esposa. "Foi quando me demiti, para surpresa dos meus superiores", resume.


Optou por ficar desempregado e decretou férias para si mesmo. Voltou para o seu apartamento em São Paulo e, durante três meses, freqüentou salas de cinema em dias de semana, fez sessões de terapia e aproveitou para passear pela capital paulista e ficar junto de Ana Paula. "Nesse período, ela continuou trabalhando", destaca. Sua volta ao mercado se deu aos poucos. Começou trabalhando meio-turno, a pedido de amigos, em uma empresa de tecnologia, a PCA, onde atuavam engenheiros e analistas de sistemas. Logo, a jornada evoluiu para oito horas diárias e, ao final de três anos, havia se tornado sócio da empresa.


De volta para casa


Contudo, a estabilidade parece não ser o destino de Britto. Apesar dos bons negócios na PCA, uma novidade provocou sua volta para Porto Alegre: a gravidez da esposa. "E não era uma gravidez qualquer, ela estava esperando gêmeos!", assinala orgulhoso. Como as famílias de ambos estavam no Rio Grande do Sul, considerou mais adequado voltar para a terra natal. "Começamos a fazer contatos, ligar para os amigos, procurar casa, trabalho, um sufoco", relembra. Em meio a este corre-corre, Brito fez uma visita ao SBT para a venda de um produto de sua empresa e acabou fazendo amizades.


Um tempo depois, recebeu um telefonema de funcionários do SBT que pediam a indicação de um profissional para ocupar o cargo de diretor regional da emissora no Sul do país. "Pela primeira vez, eu mesmo me indiquei para uma vaga", diverte-se. Em poucos dias, a negociação estava feita e ele viajou para Porto Alegre, desta vez para ficar. Abandonou a sociedade na PCA após explicar seus motivos pessoais e garante manter uma forte amizade com os ex-sócios. Assim, em julho de 2004, há exatos dois anos, passou a integrar a equipe do SBT.


Seu maior desafio na atualidade é o crescimento da emissora. "Este é um mercado muito concorrido e o nosso concorrente é quase hegemônico", fundamenta. Responsável também pelos estados de Santa Catarina e Paraná, ele conta que uma das estratégias adotadas no momento é a interiorização das equipes de jornalismo, no que aposta com entusiasmo. Quanto à sua carreira profissional, diz estar satisfeito, mas admite que não gosta de se acomodar e prefere não fazer planos para o futuro. Revela que, dentro de alguns anos, uma nova proposta de emprego em outro estado pode fazê-lo balançar. "Aí pego a estrada carregando a família, sem arrependimento", defende. "Mas, agora, estou muito feliz em Porto Alegre ", conclui.


Atenção em dose dupla


Casado há 13 anos, dedica todo o tempo livre para as filhas Ana Vitória e Maria Paula, de um ano e nove meses. "Os finais de semana são delas", enfatiza. Instalado no bairro Ipanema, na zona sul da capital, ele preza pela convivência familiar, apesar das exigências profissionais. Nos dias de semana, sai de casa às 7h e retorna apenas às 20h e, em muitos finais de semana, está fora de casa devido às viagens. "Como a matriz do SBT fica em São Paulo e eu coordeno a região Sul, preciso viajar o tempo todo", explica. Suas férias ficam restritas a 15 dias por ano, "mas são sempre muito bem aproveitadas", garante.


Hoje em dia, encontra dificuldades para se divertir. Acostumado às inúmeras opções de lazer em São Paulo , tem um alto-padrão de exigência e acha Porto Alegre mais restrita nesse sentido. "São Paulo não deixa a desejar em relação a qualquer outro lugar do mundo", ousa afirmar. Presença confirmada em restaurantes paulistas dos mais variados tipos, por aqui ele prefere cozinhar em casa e conta ser essa uma forma de relaxar e estar próximo das filhas. Além disso, não dispensa um jantar à luz de velas com Ana Paula, hábito que os dois mantêm desde os tempos de namoro.


Também aproveita os raros instantes de descanso para ler. Entre as preferências, estão jornais e revistas, através dos quais se mantém atualizado. Para a velhice, imagina uma vida tranqüila e diverte-se ao dizer que ainda percorrerá o caminho de Santiago de Compostela e fixará residência na Patagônia, onde desfrutará da natureza exuberante e das águas límpidas, fumando charutos e tomando ótimos vinhos. "Gosto de pensar nisso no final do dia, após dez horas de trabalho, quando o meu indicador de ceticismo está muito alto", confidencia.

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