Criatividade: 'Quem não faz poeira come poeira'

Por Gil Kurtz, para Coletiva.net

Se você tem menos de 30 anos, não deve se lembrar do título desse livro, mas se o leu e lembra dele, melhor ainda.

Cito essa obra depois que o convite para escrever um artigo para o Coletiva.net me levou a revisitar alguns livros que fazem parte da minha formação empreendedora e do meu respeito ao valor da criatividade e das abordagens disruptivas. Vários contribuíram para fortalecer esses conceitos, mas essa, de 1991, e outra foram vitais para isto. Ou melhor, foram complementares.

A segunda, de 1993, tem como título "Processo Criativo", de Darlene Dalto, com fotos do talentoso Bob Wolfenson, e traz depoimentos sobre o processo criativo de mais de 20 figuras ligadas ao mundo da literatura, música, dança, artes plásticas, literatura, teatro, cinema, televisão, moda, design, vídeo, quadrinhos, fotografia e propaganda. Da publicidade, há nomes históricos e inspiradores como Alex Periscinoto, Cristina Carvalho Pinto, Enio Mainardi, Nizan Guanaes e Roberto Duailibi.

Você pode estar se perguntando: e aí, o que elas têm em comum? Antes de responder, preciso sublinhar que não atuo na área de criação, mas isso não quer dizer que as pessoas de outras áreas não precisam de um perfil criativo (aliás, isso fica muito claro nessas duas obras). Minha praia é planejamento de comunicação e estratégia.

Voltando à contribuição dos referidos livros na minha formação empreendedora e criativa, registro que André Ranschburg - autor da obra que uso como título desse artigo - foi muito relevante e inspirador. A história dele é muito peculiar: um húngaro naturalizado brasileiro, que revolucionou o mercado do jeans no Brasil no final dos anos 80.

Tomei conhecimento deste case de sucesso pela mídia e, em 1991, quando o livro foi lançado, tinha assumido a presidência da AJE-POA (Associação de Jovens Empresários de Porto Alegre), que tem como mantra o estímulo ao empreendedorismo. Naquele mesmo ano, planejamos um evento para ser a grande âncora dessa temática e, em reunião de diretoria, chegamos a duas conclusões: precisávamos de um nome nacional e um case de sucesso emblemático. Bingo: era o André.

Saí da reunião ciente do desafio de chegar até ele e ajustar a agenda. Depois, em conversa com outros amigos da Federação de Jovens Empresários do Rio Grande do Sul, surgiu a ideia de fazer um convite para várias palestras em Porto Alegre e mais três cidades do Interior do Estado. Mas se o cara é um "pop star" e trazê-lo à capital já seria difícil, imagina levá-lo a outras cidades, distantes umas das outras.

E havia ainda o problema de como entrar em contato, pois não conhecíamos ninguém que pudesse fazer a apresentação e abrir portas para uma conversa. Mas, inspirado pelos conceitos do próprio Ranschburg, telefonei diretamente para a fábrica e falei com a secretária dele. Expliquei a ideia e ela pediu que eu enviasse um fax (isso mesmo, lembram ele?), formalizando o convite para as quatro palestras, em Porto Alegre, Farroupilha, Santa Maria e Santa Rosa. Em menos de uma semana, com agenda proposta por ele, acertamos as datas em todas as cidades.

Se você continua lendo, provavelmente está se perguntando novamente: tudo bem, e daí? É que durante dois dias de viagens de carro pelo Estado, algumas conversas foram inspiradoras. Numa delas, perguntei porque ele, que era atendido pela DPZ, resolveu mudar para a DM9, do Nizan. Pelo relato feito no livro, ele havia "culpado" o atendimento. Foi isso mesmo?

E o Ranschburg respondeu, rindo: "Nada disto, queria apenas um novo perfil criativo". Bons tempos aqueles, quando o cliente mudava de agência por esse motivo. Hoje, a maioria muda pelo menor preço e pela menor inteligência. E as agências? Grande parte (só as grandes recebem) acredita que o BV garantirá sua existência.

Criatividade, inteligência competitiva e senioridade deixaram, infelizmente, de ser critérios para muitos anunciantes. Sorte nossa, ou Vossa, caso não tenha sido atingido por essa poeira.

Gil Kurtz é diretor da Vossa Estratégia e Comunicação.

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