Comédia virtual

Por Alexandre Hohagen Sou grande entusiasta e apaixonado pelo meu país. Não suporto escutar as típicas críticas de pessoas hipócritas na beira da esteira …

Por Alexandre Hohagen
Sou grande entusiasta e apaixonado pelo meu país. Não suporto escutar as típicas críticas de pessoas hipócritas na beira da esteira de bagagem, ao chegar do exterior, espinafrando a fila, a esteira, o celular, o Brasil. Não dou corda. Porém, neste ano ouvi algumas críticas ácidas em relação ao papel da internet no processo eleitoral brasileiro e concordo que algumas fazem sentido.
Durante a eleição de Obama, em 2008, a internet teve papel essencial ao mostrar ao mundo que é possível mobilizar grande massa de eleitores, estimular o debate aberto, democratizar a participação de candidatos com recursos escassos, transformar o processo de doação em mecanismo transparente e permitir que milhares de pessoas acessem e se comuniquem com os candidatos que os representarão.
Tal experiência colocou a internet no mesmo patamar de importância que teve a televisão na vitória de John Kennedy, na década de 60. No Brasil, até o ano passado, quando foi aprovada a nova legislação eleitoral, praticamente se desconsiderava a internet. Embora a lei tenha sido revista todos os anos, a redação da lei anterior fora feita em 1997, quando o país tinha pouco mais de 1,5 milhão de internautas.
Hoje, são mais de 70 milhões. Observe, caro internauta-eleitor, que até 2010 - mais de 15 anos após a entrada da internet no país - campanha eleitoral on-line era praticamente proibida. Candidatos só podiam se comunicar através de páginas oficiais, em geral chatas, limitadas e nada atraentes. Num país em que a web tem tamanha relevância, no qual o processo de votação é quase todo informatizado, em que praticamente 100% dos contribuintes entregam o IR via internet, restringir o processo eleitoral on-line é uma comédia (que, por sinal, quase foi proibida nas eleições deste ano).
Ora, se um dos principais problemas da política no Brasil é o descrédito em relação às instituições políticas e a consequente falta de interesse pelo tema, a internet oferece uma oportunidade única para chacoalhar essa situação. A web permite que as pessoas expressem livremente suas opiniões e convicções políticas; que debatam temas relevantes com seus próprios candidatos; que questionem, façam humor e apresentem cobranças das tradicionais promessas de campanha.
É isso o que acontece quando os cidadãos fazem perguntas para os candidatos diretamente pelo YouTube, quando criticam em tempo real o conteúdo pasteurizado do horário eleitoral no Twitter ou quando criam uma comunidade no Orkut para satirizar a política. Apesar de alguns avanços e grande esforço nas discussões no TSE e nas medidas do STF para promover a liberdade de expressão, ainda não chegamos ao pleno potencial que a internet pode ter no processo eleitoral e democrático no país.
Para se ter uma ideia, aqui no Google (dono do Orkut, YouTube e Blogger) recebemos por mês dezenas de pedidos judiciais de remoção de conteúdo de caráter político. É certo que, em alguns casos, pode haver abusos que devem ser coibidos.
Contudo, a imensa maioria dos pedidos se destina a remover conteúdos nos quais os internautas estão apenas fazendo o que se espera de todo cidadão: participando da vida política, debatendo ideias, cobrando os seus candidatos e fiscalizando suas ações. É o caso de vários pedidos de remoção contra um blog que apenas listava as condenações que vários candidatos haviam recebido, citando a fonte dos dados e incluindo um link para o site do órgão oficial com detalhes da condenação.
Quando vejo pessoas manifestando certa decepção com o papel da internet no processo eleitoral, lamentando que não estejamos experimentando o "efeito Obama", não consigo deixar de pensar na relação entre a legislação restritiva e essa cultura política que teme a livre expressão, o debate franco, na restrição do potencial que a internet poderia exercer nas eleições deste ano.
Fica aí a expectativa de um otimista para que nossos futuros governantes decidam eliminar essas e outras amarras que ainda tentam apartar a política nacional de suas polêmicas mais temidas.

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