Comentaristas x Redes Sociais

Por Maurício Saraiva, para Coletiva.net

Se o Brasil está polarizado às vésperas da eleição presidencial e o mundo também tem lá seus extremos espalhados pelos continentes, não seria o futebol que ficaria fora deste cenário. Como apresentador do Botequim do Maurício, autorizo-me uma pequena amostra de filosofia de boteco neste artigo.

O futebol é microcosmo do que acontece na sociedade. Não por acaso, o futebol do Rio de Janeiro vive dias de agonia porque em agonia vive o povo carioca, tão maltratado por quem é eleito governante e tão infeliz nas escolhas que anda fazendo. Então, inevitável que o momento deixasse mais evidente do que nunca a distância entre quem vive de ser sensato - ou de, no mínimo, tentar ser - e quem não tem compromisso com sensatez e lança disparates livres nas redes sociais. Sob o manto longo de sua paixão, usuários das redes disparam ódio e ressentimento em quantidades industriais. E não pega nada para ninguém.

Este jornalista não tem nada contra redes sociais. Pelo contrário, faço uso delas para divulgar meu trabalho e até para largar pílulas da minha intimidade da vida diária. Pode ser foto de uma corrida em Ipanema ou de uma roda de samba em que toco surdo como se tivesse nascido sambista. A rede social é uma ideia genial porque converge a comunicação instantaneamente. O uso que alguns humanos fazem dela é que torna o processo melindroso. Basta uma passada nas redes sociais logo após uma jornada esportiva para encontrar ofensas pessoais contra o comentarista que nela trabalhava.

À esta altura, considero que enfrentar o ressentimento vindo das teclas do computador é item de contracheque, faz parte do ofício. Minha relação com os internautas obedece a um critério claro: ofensa pessoal não é permitida, o bloqueio vem a galope. Quem parte do princípio de que minha opinião nasce colorida, isto é, que estou dizendo xis porque torço para este ou aquele time, também não tolero. Quem entra nesta levada põe em dúvida minha honestidade profissional, não aceito. Nada é maior para mim do que o patrimônio da minha credibilidade.

Sonhava ser jornalista esportivo com cinco anos de idade. Sei o que estudei e trabalhei para chegar a um reconhecimento de carreira que já me levou a cinco Copas. Então, não seria estúpido de comprometer algo tão grande em nome da paixão por uma camiseta que ficou lá na infância. Sim, eu não torcia para o juiz. Nasci em Porto Alegre, torci para Grêmio ou Inter até que o coração descoloriu em nome do amor maior, este que tenho pelo que faço.

Ainda sobre minha relação com as redes sociais, respondo sempre que posso a elogios ou críticas que estejam argumentadas. Já quem me cobra por coisas que eu não disse ou escrevi, não respondo, mas também não bloqueio. Era muito mais confortável para o comentarista o tempo em que o retorno não era imediato, porque não havia tecnologia para isso. Ao mesmo tempo, é deliciosamente desafiador navegar neste mar crespo em que a comunicação se dá em tempo real e sujeita a todo tipo de ruído. Desgastante, claro, branqueia os cabelos. Ainda assim, provocador e excitante.

Quando falo a alunos de Comunicação Social em palestras por aí, sempre cito a necessidade de leitura para quem pretende se comunicar claramente. Vocabulário ajuda muito, paciência, também. O sonho de qualquer jornalista e, em última análise, de todo ser humano é receber aprovação irrestrita. Como se trata de uma atávica impossibilidade, o que vale é saber lidar com seu ofício e seu público, o que significa estar permanentemente em estado de atenção e aprendizado. A quem sonha em trabalhar se comunicando, insisto que o esforço vale a pena. Viver do próprio sonho é para poucos. Quem consegue, sabe. E valoriza.

Maurício Saraiva é jornalista e comentarista no Grupo RBS.

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