Jingle & chuteiras

Por André Martins Alguns jingles e mensagens esportivas se tornam inesquecíveis porque entram para a história afetiva das pessoas e viram peça de museu …

04/07/2006 00:00
Por André Martins

Alguns jingles e mensagens esportivas se tornam inesquecíveis porque entram para a história afetiva das pessoas e viram peça de museu íntimo, enfiados num baú de reminiscências sonoras. Volta e meia a roda do tempo gira, a agulha risca o vinil daquela era perdida e a música ressurge como o hit de sempre, no topo da parada musical pessoal.

Atualmente, já não é bem assim. O jingle perdeu importância no cenário criativo, a segmentação aumentou e a criação também está muito homogênea, seguindo tendências, pra não dizer ruim mesmo. Tanto é que poucos jingles conseguem ser tão marcantes como seus antecessores.

Um exemplo bem redondo, já que o ano foi de futebol: o jingle Pra frente, Brasil. Criação do lendário jinglista Miguel Gustavo, Pra frente, Brasil embalou a então desacreditada seleção da Copa de 70 e quase virou hino, além de fazer o nome da peça virar uma expressão consagrada.

De lá pra cá, outras cantorias tentaram o mesmo feito, mas não chegaram nem perto. Às vesperas da amarelada geral dos canarinhos na Copa da Alemanha, o que se via na maioria dos casos era o deboche aos argentinos e mensagens com o mesmo apelo emocional de uma embalagem de laticínio. Bem diferente da mensagem que los hermanos colocaram no ar. Clique aqui e vá até o comercial da cerveja Quilmes: www.brainstorm9.com.br. A letra está aí embaixo. A peça é impressionante. Parece que los hermanos não estavam indo para uma Copa do Mundo, mas para uma guerra contra o resto do mundo. Tanto que, quando foram desclassificados, se debulharam em lágrimas. 

?Bendito sea el mundial con que soñamos Bendito cada nombre que ha sido designado Bendito los pibes que siempre sacamos El peso de la historia, el respeto ganado Maldito sean los recuerdos dolorosos Maldita la impotencia, la injusticia que vivimos El volvernos a casa cada uno por su lado Las finales sin jugar y quedarme en el camino Bendita la anestesia general a los dolores La tristeza que curamos con abrazos Las gargantas que se rompen por los goles El sentirnos los mejores por un rato Malditos los sorteos y los grupos de la muerte Los controles sin azar que asignaron nuestra suerte Malditos los mezquinos que juegan sin poesía Los que pegan, los que envidian, los que rompen y lastiman Bendito sea el orgullo con el que entramos a la cancha El potrero y la pelota no se machan La tv que repite la gambeta Inflar las redes de los otros, inflar el pecho de los nuestros Merecer la camiseta Los turistas, los cronistas, los sponsors, los amigos, el himno y las mujeres siguiendo los partidos Bendita las cabalas que dan resultado Las risas y el llanto que guardaremos tanto Y bendito ese momento que nos regala el fútbol De poder cambiar nuestro destino Y sentir otra vez y frente al mundo Lo glorioso y lo groso de ser argentino!?

Esse espírito nada tem a ver com a seca vergonha da maioria dos nossos craques globalizados, que não choraram a derrota. Pelo contrário, alguns correram sorridentes para o abraçar o algoz Zidane, como se fosse um comercial da Nike com um final surpreendente. Exceção feita aos que realmente jogaram (Dida, Lúcio, Juan, Gilberto Silva e Emerson, todos defensores, todos menos "valiosos"), os craques meias e atacantes devem ter lamentado a leve desvalorizada em seus passes na bolsa do futebol. Mas isso eles recuperam logo nos clubes e nas campanhas milionárias dos patrocinadores.

Em entrevista coletiva, o professor Parreira mostrou toda a sua astúcia de esgrimista verbal afirmando que não estava preparado para a derrota. Com uma floreteada óbvia e irrelevante, saiu incólume da peripécia, depois de colocar em campo uma seleção apática, que mais parecia um time pebolim. 

Foi-se o tempo dos jingles gloriosos, da pátria de chuteiras.