JornalistA esportivA: nós só queremos RESPEITO!

Por Nathália Ely, para o Coletiva.net

"A mulher não pode, oi?" " A gente pode tudo o que a gente quiser!". As frases são de Eduarda Streb, uma das mulheres pioneiras no Jornalismo Esportivo gaúcho. Foram ditas para mim em uma entrevista que fiz com ela em janeiro desse ano. Desde que escolhi o Jornalismo Esportivo, aos 12 anos de idade, tinha ela como minha referência. Afinal, no final dos anos 1990 e início dos anos 2000, mulher atuando no Jornalismo Esportivo era raro. Poucas mulheres ousavam trabalhar em um ambiente machista do esporte. Mais ainda, do futebol. Já que quando falamos em Jornalismo Esportivo no Brasil temos o futebol como pauta principal, em detrimento das demais modalidades.

Hoje, atuando como assessora de Comunicação e proferindo palestras, Eduarda Streb contou que sofreu sim muito preconceito durante seus mais de 20 anos de atuação à frente das câmeras. Não só de torcedores, mas também de colegas. Quando, por exemplo, o microfone demorava para chegar nela em uma coletiva. Afinal, a pergunta com certeza não seria interessante.

Ainda bem que ela nunca deixou que isso interrompesse a sua profissão. Pelo contrário, ela utilizou como força. Tinha um objetivo. E fazia o que fosse preciso para chegar lá. E chegou.

Nesses 20 anos, o número de mulheres nas redações, na televisão, e mesmo na rádio foi crescendo. Elas foram para reportagens, apresentações de programas. Na rádio, elas estão aparecendo cada vez mais. Verdade que pouco na reportagem de campo e mais na reportagem da galera. Mas estão lá.

No dia nove de dezembro de 2018, duas jornalistas, Renata de Medeiros e Amanda Munhoz, foram responsáveis por um fato inédito. Foram elas que levaram as informações sobre a final do Campeonato Gaúcho de Futebol Feminino para os ouvintes da Rádio Gaúcha.

Em 2018, a Fox Sports também inovou. A jornalista Isabelly Morais entrou para a história ao ser a primeira mulher a narrar um jogo de Copa do Mundo de futebol na TV brasileira.

Antes disso, o Travinha Esportes também já tinha inovado. Em 2005, foi o primeiro veículo a transmitir um evento esportivo com uma locução feminina. A live streaming do Campeonato Gaúcho de Patinação Artística foi comandada por mim.  E não utilizo esse espaço para me vangloriar. Mas para mostrar que eu também estou nessa guerra.

Porque sim. Apesar dessa luta toda, desse crescimento, ainda precisamos gritar: "Deixa Ela Trabalhar!".

Casos de assédio continuando ocorrendo. As mulheres continuando chegando com medo aos estádios para desempenhar suas funções.

O último caso noticiado foi da jornalista da Rádio Guaíba, Laura Gross. Enquanto desempenhava sua função de entrevistar os torcedores durante o jogo Internacional x River Plate, em 3 de abril de 2019, Laura foi assediada. Além de ouvir elogios em relação a sua fisionomia física, um torcedor tentou beija-la à força. O que serviu como motivo de riso pelo amigo do assediador. Afinal, na cabeça machista deles isso é demonstração de "macheza". Mulher é mesmo objeto.

Ainda bem que esse pensamento já vem mudando. O presidente do Internacional reconheceu o torcedor e o afastou do estádio. Mas isso só foi possível porque Laura não se calou. Laura se manifestou. Laura gritou. Ela teve coragem.

Muitas, no entanto, se calam. Por vergonha. Por medo. E o medo se torna pavor, pânico.

É inacreditável que em pleno 2019 nós, mulheres, estejamos ainda tendo que PROVAR que somos PROFISSIONAIS. Que só queremos trabalhar. Chega a me dar um embrulho no estômago toda vez que fico sabendo que uma colega sofreu assédio. Por palavras ou ações.

Não, não queremos escutar elogios ao nosso corpo ou a nossa carinha bonita. Não estamos em um concurso de beleza. Não foi ela quem nos deu esse emprego. Foi nosso talento, nosso esforço, nosso estudo, nossa batalha diária. Nosso profissionalismo. Como deve ser para qualquer ser humano.

Não, não queremos beijos. Queremos compreensão, apoio, incentivo. Admiração seria demais. Mas, acima de tudo, RESPEITO!

Não queremos ter crises de pânico toda vez que pensarmos no trabalho. Porque pânico é medo. E não queremos chegar no estádio e ficar com medo se vamos ser assediadas.  Esse medo nos paralisa e nos traz uma preocupação a mais. Queremos nos preocupar com a pauta, com as fontes, com o trabalho.  Não ter de nos distrair com essas preocupações. Desnecessárias. E, sim, nós ainda precisamos pensar nisso.

E não só nos estádios, mas dentro das redações. Não queremos ter que provar mais que os homens que podemos estar ali.  Que podemos ter nosso espaço. Ele tem de ser conquistado por nossos méritos profissionais. Nós já estamos mostrando que sabemos falar sobre futebol, rugby, beisebol, patinação.

Nós podemos falar, nós podemos entrevistar. Nós podemos filmar, tirar fotos, narrar, comentar... Nós podemos fazer o que quisermos. Desde que tenhamos responsabilidade, ética e empenho. Como o homem. Como qualquer um que tem a missão de ser jornalista.

"A mulher não pode, oi?" " A gente pode tudo o que a gente quiser!". Então parem com esse assédio, com esse preconceito. Vai ter jornalistA esportivA sim. E cada vez mais. Aceite. Respeite.

 

Nathália Ely, ou Nathi Travinha, é jornalista especializada em jornalismo esportivo pela UFRGS.  Fundadora e produtora de conteúdo no Casal Travinha - plataforma de conteúdo esportivo.

Comentários