Não vivemos numa bolha

Por Rafael Codonho para Coletiva.net

Mais do que qualquer outro setor da economia, a comunicação é marcada pela efemeridade. Mudanças surgem a todo momento e, com seu impacto, parecem derrubar certezas até então inquestionáveis. Da mesma forma, a vida útil das companhias do segmento tende a seguir esse princípio. Estudo recente do Sebrae sobre a sobrevivência das empresas no Brasil escancara a realidade: apenas metade das agências de publicidade - parte representativa do ramo - consegue superar o cruel teste dos dois anos. Como via de comparação dentro do ambiente de serviços, 80% das escolas de idiomas e 76% dos escritórios de contabilidade ultrapassam a marca. O que está por trás desse fenômeno?

Chegue a uma empresa de comunicação - da menor e recém-criada, com batida de startup, à mais estruturada e conceituada - e peça para ver as planilhas de demonstração do resultado do exercício (DRE) e de fluxo de caixa. Ou, para não entrar tanto nas vísceras do negócio, questione quanto foi o Ebitda do mês anterior ou qual a proporção das despesas operacionais diante do faturamento. Ou, ainda, qual a regra de provisionamento adotada para dar fôlego em um momento de turbulência - ao invés de, no aperto, correr ao banco para sacar um empréstimo? Por fim, como está a situação das certidões, que muitas vezes são decisivas na concorrência por uma grande conta? A resposta, salvo raras exceções, fica entre o desconhecimento e a negativa.

Saindo do terreno financeiro, raros são os exemplos do nosso meio que adotam rotinas e estabelecem padrões. Optando por uma falsa liberdade, deixam tudo fluir. Preferem não implementar ferramentas para controle dos fluxos internos. Na prática, isso significa atrasos nas entregas e retrabalho - que nada mais é do que desperdício de recursos. E, mais adiante, percepção negativa por parte do cliente, ocasionando a perda do contrato. É como uma bola de neve. De nada adianta encantar na prospecção se a operação não atinge a expectativa gerada. Comunicação não é espuma; precisa gerar resultado concreto. Ou vira um artigo de luxo - atraente, mas perfeitamente dispensável.

A dura realidade é que, ao contrário de boa parte do mundo corporativo, as empresas de comunicação desprezam a gestão. Com certa empáfia, diretores acreditam que sua genialidade e sua criatividade fora do comum serão suficientes para o sucesso consistente. Vivem como dentro de uma bolha, alheios às lições básicas que estão no seu entorno. Tomam decisões com carga total na intuição e na experimentação.

É como se, por sua própria escolha, o fotógrafo registrasse uma bela paisagem com os olhos vendados. Ou como se o cozinheiro de um restaurante estrelado decidisse abandonar o livro de receitas para, de sua própria cabeça e com os clientes esperando à mesa, improvisar um prato melhor. Claro, algo de surpreendente pode sair dali; porém, o mais provável é que a falta de método origine somente o caos, perdendo-se a oportunidade de fazer algo realmente bom. De forma continuada, essa atitude gera o resultado mostrado na pesquisa do Sebrae. A conta vem, e mais cedo do que pensamos.

Questionado por Otto Lara Resende sobre qual conselho daria aos jovens, Nelson Rodrigues foi taxativo: "Envelheçam!". Cobrou maturidade e seriedade. Deixou claro que colocar a juventude no pedestal é uma grande bobagem. Da mesma forma, nós, da comunicação, precisamos perder a pretensão de que o nosso business é diferente dos demais. Como se estivesse isento das regras de mercado. Não é uma opção: a concorrência e a crise - que ceifou tantas empresas - exigem o fim do amadorismo na gestão.

Rafael Codonho é jornalista e empresário, sócio da Critério - Resultado em Opinião Pública.

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