Quantidade no lugar da qualidade

Por Gilberto Jasper, para Coletiva.net

Quando se está à beira dos 60 anos com mais de 40 de Jornalismo, muitas coisas na profissão se tornam rotineiras, fáceis. Outras imprimem extrema dificuldade de manifestação porque soam como ranço ou saudosismo doentio.

Pretendo desfiar, aqui, algumas ideias, consciente do risco de ser taxado de velho ranzinza. A qualidade geral do noticiário é lastimável. Não importa o veículo ou a plataforma. É comum a publicação de correções diárias em veículos impressos, desmentidos em meio à exibição do Jornal Nacional e retificações entre os comerciais nas emissoras de rádio.

As redes sociais dispensam comentários, tamanha a mediocridade da maioria dos veículos que se utilizam desta tecnologia. Durante os 11 anos como repórter de geral e subeditor de Interior na redação de Zero Hora, tive o privilégio de conviver com profissionais dotados de ótimos textos como Nilson Mariano, o melhor que conheço até hoje.  Outros ensinaram os rigores da matéria mais simples, aquelas de buraco de rua. Neste quesito, dois nomes são inesquecíveis: Núbia Silveira e Marcelo Rech.

Núbia foi minha primeira editora. Vindo da colônia, onde nasci, sofri horrores na mão da "carrasca" (apelido em off). Pensei várias vezes em desistir, mas alguns colegas, que se tornaram amigos, convenceram-me do contrário. "Anota o nome da fonte, o horário e sempre, mas sempre meeeeesmo, checa as informações mais importantes com, ao menos, duas fontes", repetia, entre uma crise e outra de choro.

Já Marcelo Rech tinha um mantra: "Duvidem dos números. Confiram se os milhões são realmente milhões e chequem com algum especialista no assunto pra gente não publicar um erro enorme", ensinava. Como repórter raiz, Rech sabia do que estava falando.

Correndo todos os riscos da corneta - afinal, criticar os outros é nosso esporte preferido - lamento profundamente que estes ensinamentos sejam raridade na maioria das redações. Compreendo que o "tempo urge", que a concorrência entre sites, Twiter e outros instrumentos é renhida, mas é indispensável um mínimo de rigor de apuração.

Mesmo dispondo de inesgotáveis alternativas de pesquisa, é revoltante constatar a falta de conteúdo de muitos colegas. Personagens e episódios emblemáticos, que marcaram época, são de total desconhecimento de profissionais que escrevem todos os dias e até de colunistas que cometem gafes inacreditáveis.

Ouço com frequência em programas de rádio expressões do tipo "parece que o fulano se elegeu no ano tal, criou o programa aquele, acho que foi assim...". São informações sem a mínima precisão, desprovidas de fidelidade, mas basta sacar o celular do bolso para acessar o "Tio Google" e brindar os ouvintes com uma notícia com início, meio e fim. Nem exijo uma análise conjuntural porque seria uma demasia.

Ao lado do descuido que virou rotina temos um elenco de luxo de jornalistas e radialistas talentosos, experientes e carismáticos "matando cachorro a grito". Vivem de frilas ou trabalhos humilhantes. Não tenho conhecimento suficiente para dizer que a aposentadoria precoce destes profissionais tem a ver com a mediocridade do Jornalismo atual, que também sofre com a agravante do fanatismo ideológico e político.

Quem perde, sempre, são os leitores, ouvintes, telespectadores e internautas. Até quando?

Gilberto Jasper é jornalista.

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