Resoluções para 2017

Braulio Tavares

23/01/2017 12:25
Gravar um CD com as benditas músicas que as pessoas gostam. Elucidar o Mistério das Máscaras de Chumbo. Concluir o projeto alquímico-cibernético da abertura de um portal para um mundo menos chato. Inventar um idioma aglutinante desprovido de vogais. Consertar o encanamento da área de serviço. Resolver o problema daquela esquina em Manaíra onde chega a ter três batidas de carro por dia. Ler os 163 livros em PDF gratuito armazenados no computador. Chamar para beber no bar cinco amigos meus que têm tudo a ver uns com os outros e que não se conhecem pessoalmente. Fazer cirurgia naquele calo-de-sangue na sola do pé. Trocar a porta do armário onde deu cupim. Juntar num volumezinho os poemas alheios que já traduzi. Descobrir como passar as fotos do celular velho para o celular novo. Redigir e fazer publicar na grande imprensa uma "Carta Aberta aos Políticos Brasileiros". Recomeçar a jogar Riven (eita como eu sou velho). Editar uma versão de "Grande Sertão: Veredas" com 800 páginas de notas. Deixar a barba crescer e fazer um certo mistério a respeito. Escrever biografias de Pete Best, Manuel Xudu, Raymond Queneau, James Ensor, Saul Steinberg e Edvaldo do Ó. Fotografar um disco voador voando. Fazer seis meses de psicanálise e usar isso como pretexto pra tudo que me der na veneta. Pegar minhas fotos de Instagram e fazer um livrinho (só as fotos e os títulos) do tamanho de um compacto de vinil. Aprender a andar de bicicleta o bastante para alguém me filmar por uns 10 ou 15 segundos, e registrar para a posteridade. Fazer uma lista e sair ligando de pessoa em pessoa, pedindo desculpas por desatenções que vai ver que elas nem se lembram mais. Faxina nas gavetas. Mesmo. Passar um dia rodando por Campina e fotografando lugares especiais, projeto a se chamar "There are Places I Remember". Voltar a caminhar, a tratar dos dentes e a fazer checape. Sair a pé de manhã de Laranjeiras rumo à Zona Norte, sem rumo pré-estabelecido, e pegar um táxi de volta quando me sentir na lona. Consertar meu Prêmio Jabuti que levou uma queda há três anos e quebrou a base. Comprar um HD externo pra copiar o HD do computador velho. Decorar uma dúzia de poemas meus na ponta da língua pra não pagar mais o mico de recitar lendo. Emoldurar as incontáveis gravuras de artistas amigos meus que tenho em forma de canudo, deitadas por cima dos livros. Descobrir a pedra filosofal, a quadratura do círculo e a fonte da juventude. Fazer uma limpeza em regra nas pastas de papéis obsoletos (recibos de contas de luz da casa onde morei 20 anos atrás, etc.). Escrever o último capítulo (o único que falta) daquele livro iniciado em 2001. Comprar um tênis e um sapato novo, tou precisando. Praticar ioga, pilates, musculação, RPG, ginástica aeróbica e capoeira. Traduzir "Le Bateau Ivre" de Rimbaud e abaixar de vez a crista da concorrência. Inventar uma esferográfica que não deixe um borrão assim que encosta no papel. Botar letra naquelas 76 músicas e música naquelas 118 letras. Prestar mais atenção aos sentimentos dos terráqueos, eles não têm culpa de serem assim. Levar um tiro de espingarda-doze na caixa-dos-peitos, acender um cigarro e dizer: "Nem doeu". Braulio Tavares é escritor, cientista e jornalista. Tem o blog www.mundofantasmo.blogspot.com .