Três livros, uma visão de planejamento

De Luan Pires, para o Coletiva.net

Tenho pensando muito sobre a importância do entendimento do comportamento - na minha visão, algo mais dinâmico como defende Bandura conceituando-o pela interação entre fatores pessoais (como crenças e expectativas), comportamentais e ambientais. Por que tenho pensado nisso? Primeiro, porque tenho lido livros de diferentes áreas que de algum modo falam sobre isso: como comportamentos não são recortes, mas linhas. Segundo: porque isso me fez pensar ainda mais no papel do planejamento estratégico na publicidade.

O primeiro ponto é óbvio: precisamos ir além dos dados e apresentações bonitas. Estou lendo três livros - um de ficção - que, talvez, ao olhar amplo não tenham muita conexão, mas que ativaram várias sinapses minhas. Lendo O Animal Social, de David Brooks, percebo cada vez mais a certeza de que ignorar essa dimensão humana no planejamento é desperdiçar o potencial real de uma marca. Não é só sobre onde e quando impactar o consumidor; é sobre criar uma conexão que ressoe com as pessoas em um nível mais profundo. Uma campanha que usa o canal certo, mas não entende o contexto cultural e social do público, corre o risco de cair no vazio. O planejamento precisa abraçar essa complexidade e, mais que direcionar mensagens, entender como essas mensagens serão recebidas e interpretadas em diferentes contextos.

Aí vem o segundo ponto, este mais óbvio para quem veio da publicidade, do livro "Start with Why" do Simon Sinek e do seu famoso conceito de que as marcas que se destacam são aquelas que têm um propósito claro - um "porquê" que conecta. No planejamento, não basta saber o que e como ela faz as coisas, é preciso descobrir por que isso importa para o público. Quando uma marca toca algo autêntico, sua mensagem se torna mais do que uma campanha - ela vira uma causa.

E então chegou como onda na minha mente a leitura de Ponciá Vicêncio, de Conceição Evaristo, que traz à tona realidades invisibilizadas pelo mainstream, destacando a importância de dar visibilidade às experiências humanas que muitas vezes ficam à margem das narrativas convencionais. No planejamento estratégico, essa visão decolonial - essa desconstrução de conhecimento e cultura estabelecidos durante o colonialismo e que continuam a influenciar as sociedades contemporâneas (algo que o mestrado em Letra está abrindo meus olhos) pode nos ensinar que, para uma marca realmente ressoar e gerar impacto, ela precisa se conectar com realidades culturais, sociais e emocionais complexas. Assim como Evaristo explora experiências de indivíduos historicamente oprimidos, acho (e tem muitos "acho" nesse texto, afinal, certezas sem dúvidas são burras) um planner estratégico precisa incorporar a diversidade e a complexidade da sociedade em suas análises e campanhas, trazendo cada vez mais narrativas que não sejam apenas comerciais, mas também transformadoras.

No fim das contas, talvez soe óbvio o que vou dizer, mas é que às vezes vejo isso ser esquecido: planejamento estratégico não é só sobre os números, é também sobre explorar caminhos que conectem de verdade e que inspirem. Dados podem guiar, mas é a criatividade estratégica e olhar de dentro pra fora do comportamento humano que define o porquê de uma campanha ter impacto emocional. Uma narrativa que se alinha aos valores do público transforma uma campanha comum em uma experiência marcante.

Porque, e esse é um ponto de constante tensão pra qualquer planejamento, ser objetivo não é o mesmo que ser assertivo. Brooks diz que as decisões humanas são moldadas por camadas de significado e contexto - nem sempre traduzíveis em métricas diretas. Uma estratégia assertiva não é só lógica; ela entende que cada número é apenas a superfície de algo mais profundo. Ser assertivo é captar a essência de uma necessidade e transformá-la em algo que faça sentido na vida das pessoas.

No fim, o papel do planner é esse: equilibrar o rigor dos dados com o toque humano das histórias. É um trabalho que pede tanto uma visão ampla para entender o cenário cultural quanto uma sensibilidade para reconhecer o que realmente importa para o público. Vai além dos slides - ele coloca a marca no centro de conversas culturais e na memória das pessoas.

Luan Pires é jornalista, curador do projeto Multivozes de Coletiva.net e colunista semanal do portal

Comments