A cultura como fundamento e destino da publicidade

Por João Firme de Oliveira Entre sociedade, cultura e publicidade há um elo íntimo e forte. Nos tempos modernos, isto ainda é mais verdadeiro …

Por João Firme de Oliveira
Entre sociedade, cultura e publicidade há um elo íntimo e forte. Nos tempos modernos, isto ainda é mais verdadeiro e é inegável o papel de difusão e sedimentação social da publicidade e sua responsabilidade cultural.
A publicidade surgiu como braço informativo do sistema econômico em que se inseria. Antes do final do século XIX, a mídia impressa veiculava anúncios que, na maioria dos casos, consistiam em texto puro, mas datam já dessa época as primeiras ilustrações - trabalho original de artistas plásticos, dando origem ao primeiro contato produtivo entre arte e publicidade. Essa relação se aprofunda um pouco mais quando textos de autores conhecidos, incluindo poesias curtas de rimas fáceis, vão se incorporando à linguagem publicitária.
Em 1908, é realizado um concurso de cartazes publicitários, com a utilização de poesias. Participa dele, entre outros poetas conhecidos, Olavo Bilac. O anúncio nasceu, assim, da incorporação de diferentes manifestações culturais: da literatura e do jornalismo, absorveu o texto; do desenho e da pintura, trouxe as ilustrações - dando origem a algo diverso e novo nas artes plásticas e em muitas outras áreas da expressão humana. A chegada do rádio nas décadas de 20 e 30 traz grande impacto ao desenvolvimento da publicidade, dando-lhe, gradualmente, formato próprio, pela inclusão do som e da música. O "reclame" é substituído pelas peças fotográficas e, em breve, digitalizadas.
Se, com a chegada do rádio, foi dada voz às mensagens publicitárias, com o nascimento da TV a elas foi dada imagem em movimento. Essas são dimensões da publicidade em suas vinculações com a arte. Mas a publicidade é, ela mesma, manifestação da cultura - em outras palavras, a cultura perpassa e anima o panorama publicitário. Assim como interessa à empresa mostrar sua identidade para receber aprovação de consumidores, investidores, mídia e governo, também a ela interessa, ou deveria interessar, a preservação e o desenvolvimento do contexto cultural no qual está imersa, já que a cultura é fonte permanente de criatividade e de progresso.
Para que isto possa ocorrer, é preciso considerar e visualizar uma concepção de desenvolvimento, que inclua não só o acesso a bens e serviços, mas também a possibilidade de escolha de modos de coexistência satisfatórios e plenos. Nessa perspectiva, a cultura é importante como promotora do desenvolvimento, mas seu papel não é meramente subsidiário e não se esgota no servir a certas finalidades: ela é o fundamento das próprias finalidades. Da mesma forma que desenvolvimento e economia, a publicidade é um aspecto da cultura de um povo e para ela suas ações e produtos devem estar voltados.
O Brasil já demonstrou que pode produzir publicidade com características culturais próprias, capaz de ser confrontada com produtos de outras nações, inclusive para o Ocidente industrializado. Por isso, é freqüentemente apresentado como um país que lutou contra a intrusão cultural e ganhou a batalha. De fato, há evidências de que este parece ser o caso. Sustentação para tal é fornecida pelas premiações obtidas no exterior. Outro dado importante é a existência de uma alta probabilidade de interesse por matérias publicitárias com características nacionais em detrimento dos produtos culturais importados. A questão crucial é a de adotar-se uma postura que ultrapasse o propósito de vender produtos, contribuindo para aumentar os níveis de percepção cultural da população.
Trata-se, portanto, de buscar e adotar, com maior intensidade, uma prática centrada na discussão aprofundada sobre o papel da publicidade em nossa sociedade: para além de vender um determinado produto, ela deve estar a serviço de elementos culturalmente relevantes, em que ética e estética sejam exercidas com igual competência e criatividade, no sentido de ser sensível à identidade, com toda sua diversidade e, ao mesmo tempo, sensibilizar a sociedade para a manutenção e revitalização dos componentes do patrimônio cultural. É imprescindível a necessidade de, nessa época de globalização, reiterarmos valores culturais como um todo.
Com objetivo dimensionar a publicidade como manifestação cultural e promover a preservação e revitalização do patrimônio cultural, através da realização de eventos no âmbito da publicidade, tendo a cultura como fonte permanente de crescimento social e econômico, será promovido pela Associação Latino-Americana de Agências de Publicidade (ALAP), e a Faculdade dos Meios de Comunicação Social da PUCRS, o seminário A Cultura como Fundamento da Publicidade, nos dias 21 e 22 de novembro de 2002.
O projeto "A Construção de um Paradigma Cultural, a Cultura como Fundamento e Destino da Publicidade" foi aprovado, em setembro, pela Comissão Nacional de Incentivo à Cultura, através da Secretaria do Audiovisual do Ministério da Cultura, possibilitando a utilização dos incentivos da Lei Rouanet na 14ª edição do Festival Mundial de Publicidade de Gramado, programado de 11 a 13 de junho de 2003 sob o tema "Criatividade Vale Ouro", promovido pela ALAP. Esta é a primeira vez que um evento de publicidade no Brasil é beneficiado pela Lei Rouanet, por considerá-lo cultural, o que reconhece a propaganda como balizador da cultura.
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