A Revolução dos Caranguejos

Por Mario de Almeida O jornalista gaúcho, advogado especialista em direitos autorais e escritor Plínio Cabral, recebeu o prêmio da 10º Jornada Nacional de …

Por Mario de Almeida
O jornalista gaúcho, advogado especialista em direitos autorais e escritor Plínio Cabral, recebeu o prêmio da 10º Jornada Nacional de Literatura (R$100.000), da Universidade de Passo Fundo, pelo seu livro "O Riso da Agonia".
Por coincidência, nossos dois últimos artigos aqui, em Coletiva.net, trataram de um processo que a Secretaria de Segurança do Rio Grande do Sul, na pessoa de seu titular, general Amaro da Silveira, abriu contra a Última Hora gaúcha e outro contra a minha pessoa, responsável por um "furo" sobre a liberação feita, em 1963, pelo então governador Ildo Meneghetti, dos arquivos do DOPS, aos serviços de inteligência dos EUA.
Este terceiro artigo já estava programado e conta a história de como Plínio Cabral, então chefe da Casa Civil do segundo governo Meneghetti, ofereceu-me, de bandeja, o prato quente da vingança que, quase sempre, só se degusta frio.
Antes, uma pequena colocação. A Última Hora, da qual eu era chefe de Reportagem e principal colunista local, apoiava Jango no plano federal e era oposição no estadual. Naquele espírito que, hoje, os marqueteiros eleitorais chamam de escolher alvos, eu selecionei dois: Plínio Cabral, por centralizar as ações políticas do Governo, e a Polícia, pela soma de suas arbitrariedades e corrupção. Nada pessoal em relação a Plínio Cabral que inclusive, tempos depois, foi meu colega de Standard Propaganda, ele em Porto Alegre, eu no Rio. Tudo em nome de um trabalho centrado em objetivos.
Menos de três meses depois de ser indiciado naquele processo, acordo na manhã de um domingo e, por obrigação de ofício, leio todos os principais jornais. Concluo a leitura bombardeado por um fato estarrecedor: Plínio Cabral dera uma entrevista - exclusiva - para o Correio do Povo, denunciando um pretenso movimento golpista, no Rio Grande, para derrubar o governo Meneghetti. A entrevista não tinha nada de factual, não provava nenhuma afirmação e indicava como líder do movimento alguém de codinome Osvaldo (ou Oswaldo, não me lembro). Aquela entrevista ficou emprenhada nos meus pensamentos e, como sempre, às 2 da tarde, eu iniciava meu trabalho no jornal. Lá pelas 4 horas, chega o diretor, Ary Carvalho e vai direto: - Leu? Assenti e ele prosseguiu: - E então? Pedi tempo.
Não eram 6 horas quando eu entro no "aquário", meio trêmulo de emoção, e digo: - Acho que resolvi. Agradecendo, mentalmente, ao antigo professor de Lógica, expus: o assunto dessa entrevista foge ao âmbito da Casa Civil e, no mínimo, teria que ser dada em conjunto com a Secretaria de Segurança e Secretaria do Interior e Justiça. Se foi imprudência do Plínio Cabral, ele tem que ser afastado. Face à importância do assunto, é difícil acreditar que tenha sido imprudência. Nesse caso, foi o próprio Governador quem encomendou a missa. E, então, o objetivo é claro - Meneghetti quer o afastamento do general Amaro da Silveira e do Gay da Fonseca, titulares daquelas Secretarias. Ary, que era comedido, deixou escapar um "genial". Com a chegada do editor, Nestor Fedrizzi, a estratégia foi definida: eu escreveria os editoriais e na minha coluna, "Sem Censura", entre outras colocações ferinas, censuraria o fato de uma entrevista daquele âmbito haver sido dada em caráter exclusivo.
A partir daí a agitação não parou mais. Colunistas de outros jornais, enciumados com a "exclusiva", endossaram a minha tese, jornalistas políticos começaram a cutucar os deputados dos partidos da aliança governista e, em 3 de janeiro, a manchete da UH era: "Crise no Governo. Denúncia de Plínio revolta os Secretários".
Poucos dias depois, chego na redação e sou chamado pelo Ary. No "aquário", ninguém menos que Fernando Gay da Fonseca comunicou-me que estava chegando do Palácio Piratini, onde entregara sua carta de demissão da Secretaria do Interior e Justiça e que passara no jornal para me agradecer, pessoalmente, o sentido de alerta que eu lhe dera através de minha coluna. E concluiu dizendo que trazia um obrigado de sua esposa, por não permitir que ele fizesse papel de bobo.
Gay da Fonseca era do PDC, Paulo Brossard do PL, e ambos participavam de uma grande Frente do Governo. Em seguida, pelos mesmos motivos, o general Amaro da Silveira entregava sua demissão. A Frente já era. E minha vingança, mesmo em prato quente, foi muito doce.
O PTB identificou a oportunidade, juntou os editoriais e as colunas que eu escrevi, mais discursos de deputados e notas de outros jornais e editou um saboroso livrinho do qual estou à cata: "A Revolução dos Caranguejos".
* Mario de Almeida é jornalista e publicitário
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