Conversando com Sophia

Por Carlos Totti, para Coletiva.net

Nas últimas semanas, participei de, pelo menos, três eventos que tinham como tema central a 'inovação'. Renovação disseminada em todos as esferas do mercado e da vida cotidiana resultando nas grandes transformações pós-revolução industrial: revolução tecnológica, revolução social e revolução da informação. Movimentos esses que afetam radicalmente os modelos de negócios das empresas, o que provavelmente fez com que entidades importantes como GAV/RS e ARP/RS trazerem um tema como esse para pauta. Afinal, o mercado da comunicação está sentindo fortemente os efeitos dessas mudanças de comportamento no mundo e querem encontrar o seu papel dentro desse cenário.

Segundo o dicionário, inovação significa novidade ou renovação. A palavra é derivada do termo latino innovatio, e se refere a uma ideia, método ou objeto que é criado e que pouco se parece com padrões anteriores. O conceito é bastante variado, dependendo, principalmente, da sua aplicação. De acordo com Peter Drucker, "a inovação mais produtiva é um produto ou serviço diferente, criando um novo tipo de satisfação, ao invés de uma simples melhoria". Dessa forma, está associada à geração de valor econômico e não fica restrita somente a uma invenção, que tem um significado tipicamente tecnológico, assim como, também não está ligada somente a aspectos tecnológicos e econômicos. Existem as inovações sociais e as inovações na forma de gerenciar uma empresa que são extremamente relevantes.

As diferentes formas de inovação podem ser aplicadas em produtos, serviços, processos ou modelos de negócios. Particularmente, acredito que uma definição mencionada por Juan Pablo Boeira, em sua palestra intitulada 'A nova era da Inovação', é a mais assertiva e com aderência ao mercado que conhecemos: "inovação significa a geração de dinheiro novo".

Entendendo melhor sobre os conceitos, formatos e aplicações, podemos, então, tentar trazer essa realidade para dentro do mercado dos veículos de comunicação e agências. Como estamos posicionados dentro desse cenário? Como os profissionais do mercado da comunicação se prepararam para atender às demandas dos seus clientes e fazer com que suas marcas continuem sendo relevantes para o consumidor? Como estamos projetando a comunicação para que ela continue impactando, informando e atraindo as pessoas?

São muitas perguntas e poucas respostas, porque a maioria dos profissionais, talvez, nem tenha se dado conta de que essa revolução não acontecerá no futuro. O futuro é agora, é aqui, é hoje. Já temos enceradeiras que limpam o chão das nossas casas sozinhas, já conseguimos conversar com qualquer pessoa em qualquer lugar do mundo através de vídeo em tempo real, temos aplicativos que resolvem praticamente todas nossas tarefas, o dinheiro é movimentado sem precisarmos tocar em uma única cédula de papel, abrimos portas com impressão digital, enfim, esses são alguns exemplos em milhares de possibilidades que pareciam ser coisas retratadas em desenhos animados futuristas.  

Sempre que pensávamos em futuro a robótica entrava em cena. A imagem de robôs meio desengonçados e com vozes computadorizadas era lugar comum, apesar de vislumbrarmos isso como uma realidade de livros e filmes de ficção científica. Hoje, temos diante de nossos olhos a Sophia, um robô humanoide desenvolvido pela empresa Hanson Robotics, de Hong Kong, capaz de reproduzir 62 expressões faciais. Projetado para aprender, adaptar-se ao comportamento humano e trabalhar com seres humanos. Inclusive, assisti a vídeos dela conversando e interagindo com pessoas e, até mesmo, concedendo entrevistas em programas de TV, e confesso que despertou uma sensação dúbia entre o fascínio e o receio. É quase assustador.

Além dos smartphones, Ipads, televisores e infinitos aparelhos ultramodernos, temos algo ainda mais fascinante, a inteligência artificial. Ou seja, quando avançamos mais uma etapa na revolução digital e todos esses produtos ganham 'vida'. Eles literalmente pensam por nós! A Inteligência Artificial (IA), que parecia apenas assunto de filmes de Hollywood, é um ramo da ciência da computação que se propõe a elaborar dispositivos que simulem a capacidade humana de raciocinar, perceber, tomar decisões e resolver problemas, enfim, a capacidade de ser inteligente. E é com ela que a Sophia consegue pensar e dialogar. E em breve, com toda capacidade de um computador no lugar de um cérebro humano limitado, estará tomando decisões melhores e mais rápidas do que todos nós.

A soma dessas coisas todas está mudando o comportamento das pessoas no mundo e a forma que elas consomem. Inclusive, como consomem propaganda e mídia. O que me faz pensar que, se você deseja ou se prepara para entrar no mercado profissional de comunicação, deve estar ciente de que irá encarar desafios que estão além do status quo. Agora não é uma disputa contra alguém, mas uma busca de superação pessoal constante.

A produção de conteúdo relevante e que faça sentido para o público é o primeiro passo. Talvez, o item mais básico na escala de vários que precisaremos para trilhar esse novo caminho. Com a crise, todas as empresas de comunicação sofreram um grande impacto. Os principais veículos de comunicação do Brasil enxugaram suas sucursais e estão sendo forçados a focar em notícias de caráter nacional, deixando de lado a cobertura local.

Segundo o engenheiro eletrônico catarinense, Marcos Voltolini, cofundador da plataforma de Inteligência Hoodline, sediada em São Francisco (USA), "as matérias locais sobre negócios, atrações culturais e os problemas que afetam a comunidade são a chave para que as pessoas possam entender a realidade e buscar soluções para o que precisa ser mudado". As notícias locais estão cada vez mais raras e são cada vez mais essenciais. A empresa de tecnologia Hoodline trabalha com plataformas de distribuição de conteúdo e criou um conceito de produzir notícias, chamado 'notícias sob medida'. Usando um poderoso algoritmo podem selecionar conteúdo ou buscar informações específicas com apurações detalhadas e criteriosas.

Atualmente, as mídias sociais e outros meios de notícias digitais são os veículos pelos quais boa parte das pessoas buscam informações e esses conteúdos vêm de fontes variadas. Por isso, os veículos de comunicação tradicionais acabam se tornando os curadores da informação de credibilidade e devem entender que isso ainda é muito valioso. Por terem o envolvimento de profissionais capazes, fontes confiáveis na produção da notícia e conteúdos relevantes, são essenciais como uma geradora confiável de informação. A questão é que, definitivamente, precisam mudar a forma de distribuição de notícias para manter os consumidores.

Se os veículos de comunicação estão em busca de um reposicionamento ou de crescerem sua fatia no mercado, é preciso que sejam reinventados. É o momento de se ajustar às necessidades e à realidade dos consumidores e dos mercados e a tecnologia é um dos principais caminhos para atingir esses objetivos.

A palavra 'personalização' nunca fez tanto sentido, pois tem sido um termo muito popular nos últimos anos, e certamente por um bom motivo. Muitas empresas têm ganhado espaço e repercussão por executarem corretamente essa estratégia. Ou seja, é pensar além de 'para quem estão falando', mas para algo mais profundo: que assuntos interessam para cada uma das pessoas que estão se reportando? Como realizar efetivamente uma hiper-segmentação de mensagens, baseada em dados ricos e completos (como interesses, gostos, ações realizadas no passado, previsões, etc.)?

A Inteligência Artificial pode inicialmente ter soado como uma ideia fantástica de ficção científica, mas evoluiu constantemente para uma abordagem com aplicações práticas para os profissionais de comunicação. Estudos apontam que tal estratégia está prevista para ter um crescimento exponencial impulsionado pela crença de que a inteligência artificial ajudará os profissionais da área de comunicação a realizarem tarefas de forma mais efetiva e numa escala maior. Já os indivíduos que trabalham com marketing podem ter a inteligência artificial como uma aliada para ajudar num melhor mapeamento dos públicos, uma personalização de conteúdo mais assertiva, entrega dinâmica de anúncios e divulgações, aumento da produtividade das suas ferramentas, assim como, e análise enriquecida dos dados e, consequentemente, gerando mais resultados e rentabilidade. Afinal, as mensagens precisam chegar por meio de formatos corretos e nos momentos certos.

O mundo em que vivemos está mudando aceleradamente e, consequentemente, o comportamento humano. As pessoas querem se sentir representadas, espelhadas, vistas e ouvidas. Diante disso, está se tornando cada vez mais necessário para os veículos de comunicação e agências um posicionamento claro sobre que bandeiras são importantes a eles, uma identidade política e ideológica. Ou seja, "nós estamos do lado de quem? De quais causas? Qual é a nossa identidade nesse mar de diferenças?". Por outro lado, as agências de publicidade também enfrentam dificuldade de posicionamento, não necessariamente o político, mas, neste caso, o mercadológico. Ao verem as grandes consultorias de negócios avançarem sobre as verbas de publicidade, estão tentando mostrar valor aos clientes.

As mudanças no mercado, quebra de paradigmas e, portanto, a inovação, apontam que mais importante que as estruturas das empresas é aprender como trabalhar em rede. Temos o desafio de 'plugar', de estabelecer conexões e dispor de competências relevantes no momento certo. É justamente neste sentido que as agências e os veículos de comunicação vão ter que avaliar, conceber e desenvolver seus projetos, ações e soluções para os clientes. As entregas não poderão mais estar ancoradas a partir da perspectiva da marca, mas precisam identificar o que de fato é relevante para o usuário.

Os profissionais de atendimento de veículo de comunicação, por exemplo, que, atualmente, têm papel fundamental como ponto de ligação entre clientes, agências e os veículos, precisam entender essas mudanças e definir como irão se reinventar e se reposicionar dentro dessa revolução no mercado. Acredito que serão personagens vitais neste cenário se conseguirem aperfeiçoar e enriquecer seu mindset. É o momento de ter a aptidão para transformar a dificuldade em uma oportunidade de aprender e evoluir. Precisam contribuir com os veículos de comunicação de forma cada vez mais assertiva, sendo realmente tradutores das necessidades dos clientes e, por fim, criando junto com as áreas afins tanto soluções de conteúdo, quanto de formato, para disseminar a informação como um tiro certeiro. O atendimento de veículo precisa também ser um curador e se posicionar como tal, tendo nas mãos o domínio total das inúmeras possibilidades de se fazer mídia e a melhor forma de entregá-las.

Fazendo uma metáfora com Sophia, a robô humanoide, e o livro 'A Escolha de Sofia', do autor norte-americano William Styron, digamos que nossos modelos de negócios estão vivendo o mesmo paradigma do romance. Qual filho escolheremos para morrer em prol da sobrevivência do outro? A história de Sofia, assombrada pela terrível escolha que precisou fazer um dia e que se tornou uma expressão idiomática: fazer uma 'escolha de Sofia', significa se ver forçado a optar entre duas alternativas igualmente difíceis. Neste caso, renascemos ou morremos.

Inovação é revolução. É novidade. É renovação. É reforma. É restauração. É aperfeiçoamento. É transformação.

Carlos Totti é publicitário, pós-graduado em Marketing e atua como executivo de Mercado na Band RS.

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