Cozinha de Jornal

Por Mario de Almeida As voltas que o mundo dá Em 1963, Ildo Meneghetti, do então PSD – em coligação com UDN e PL …

Por Mario de Almeida
As voltas que o mundo dá
Em 1963, Ildo Meneghetti, do então PSD - em coligação com UDN e PL -, assumia pela segunda vez o governo do Rio Grande. O chefe da Casa Civil era o jornalista Plínio Cabral, ex-militante da esquerda que mudara de posição ideológica. Era, portanto, um excelente alvo para a Última Hora gaúcha que apoiava Jango na esfera federal, era oposição no Estado e tinha a maior parte de seus leitores nas faixas populista e progressista.
Sempre que se expunha, o chefe da Casa Civil ganhava notas críticas e agressivas na minha coluna, Sem Censura. Tornou-se, logo, o chamado "freguês de caderno". Eu era, além de colunista, chefe de Reportagem, e, numa determinada tarde, cada repórter que voltava da cobertura do seu setor, ao dar com os olhos em mim, começava a comentar: "Plínio Cabral? ", e eu interrompia: "?comprou hoje um Simca 0km?".
Aconteceu que eu recebera, logo que chegara na redação, um telefonema informando-me sobre a compra daquele carro, à vista, e acrescentando inclusive preço e mais alguns detalhes. Ao pedir, como de praxe, identificação e telefone do interlocutor, respondeu-me que não podia dar e, então, agradeci, mas avisei que não poderia publicar. Face ao impasse, pediu sigilo absoluto da fonte (que vou quebrar em parte, agora, 40 anos depois), deu-me nome e telefone da revendedora e a explicação:
- Mario, fui eu que vendi o carro para ele.
Como o mundo dá mais voltas do que supõe nossa vã geografia, em 1969 Plínio Cabral era um dos principais executivos da filial da Standard Propaganda, em Porto Alegre, e eu, na matriz, no Rio, chefe do grupo de atendimento da sexta maior conta de propaganda do país: a da Shell. Eu estava à frente de uma série de espetáculos promocionais da banda que o Sérgio Mendes criara em Los Angeles, em excursão por capitais brasileiras, inclusive Porto Alegre. Claro que minhas funções - e educação - obrigavam-me a uma visita ao escritório gaúcho chefiado por meu amigo Flavio Correa.
Não foi difícil perceber o frisson de alguns colegas ao imaginar o encontro Plínio-Mario. Para surpresa de alguns e como não poderia deixar de ser, foi um encontro muito amistoso e mesmo fraternal. Estávamos, ambos, naquela ocasião, do mesmo lado, "vestindo a mesma camisa" e, ao respeitar nossa empresa e nossas funções, demos testemunho de nossa condição de civilizados.
* Jornalista

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