Falta de grana. O álibi perfeito pra culpa não ser sua

Por André Foresti, para Coletiva.net

Apesar de gaúcho, fiz minha carreira em São Paulo. Tenho 13 anos de mercado por aqui, e apenas uns seis em Porto Alegre, antes disso.

Por ter um pé em cada lugar, com cenários completamente distintos, acabo tendo acesso aos dois lados dessa história. Do lado de cá, em São Paulo, escuto coisas como "O Rio Grande do Sul é uma droga", "Não dá pra fazer negócios, pois nada anda, nada acontece". Do ponto de vista gaúcho, existe um sentimento de que "São Paulo é foda, tem muito investimento". E é verdade. São Paulo, realmente, é foda.

Mas não só por causa dos investimentos. Juro pra vocês, já vi muita coisa acontecer em empresas médias, pequenas, com verbas muito menores que a maioria das empresas gaúchas. É muito simplista reduzir o sucesso do outro a uma sorte divina e existencial de ter mais ou menos que você. Fica tipo a história do irmão pobre dizendo que o outro só é o que é por ser rico. Esquecendo tudo que aquela pessoa fez pra chegar lá. Tudo que ela é de diferente.

Falta muita coisa além de dinheiro, para que mercados periféricos consigam competir em altíssimo nível. E dá. Startups locais fazem isso, times de futebol fazem isso, veículos fazem isso. Raras marcas regionais, é bem verdade, também fazem isso.

A primeira coisa que falta é entender que o sucesso do outro passa por muito mais coisas que uma simples limitação de orçamento. Êxodo de talentos. Agenda de inovação. Compromisso com execução e prazos. Produtividade. Coragem. Rever práticas de trabalho. Empoderar líderes. Depois, temos que encarar nossa limitação de cultura empreendedora e pensamento de sempre.

Em tempos de inovação e rápidas mudanças, perceber que velocidade importa. Todos nós estamos cansados de consumir as melhores práticas das empresas mais valiosas do mundo, como Google ou Amazon, e não trazer quase nada disso pro nosso dia a dia. Por quê?

Essa é uma coisa que faz toda diferença no mundo corporativo de hoje. Ação. Separa um dinheiro pra "perder", como qualquer política de investidores do mercado financeiro. Como, ironicamente, você deve fazer com seu gerente de banco e sua própria grana. Tenta alguma coisa nova. Depois avalia. Qual o último investimento que a sua empresa fez em coisas além do feijão com arroz?

Estamos tipo zumbis, assistindo a coisa ficar pior. É muito falatório, palestrinha, associação disso, grupo daquilo. Política e mais política, esquecendo praticamente tudo que aprendemos com as tais empresas exponenciais.

Inovação se faz inovando. Mudança, mudando. Se precisa anunciar que vai fazer, já perdeu. Quem é, não precisa dizer que é. As melhores coisas você primeiro faz, depois mostra. Senão, vira release pra dormir com a cabeça tranquila. Pronto, lancei mais um grupo de transformação do mercado, discutimos a noite inteira e estou fazendo minha parte. Sou o novo Elon Musk. Boa Noite.

Façam um exercício: abram um espaço onde as pessoas da empresa possam enviar mensagens anonimamente. Peçam pra elas sugerirem coisas que fariam na empresa se fossem você. Tá, esqueça os xingamentos que alguns vão mandar (sempre tem). Escolha UMA. Execute. E avalie a consequência psicológica e mercadológica dessa ação.

Reduzir tudo a falta de grana me parece a desculpa perfeita pra análise não passar pelo que você está fazendo para que as coisas aconteçam. E tudo bem. Aceitar isso é um bom começo. Daí, como numa sessão de terapia, conseguiremos abandonar a velha e enraizada cultura do empate. Onde, pra não correr riscos de perder, não se vai pro ataque. Se espera. Vamos ver o outro se mexer primeiro. Eu espero você. Você espera ele. Ele resmunga comigo. "Seria incrível ter mais dinheiro pra fazer", pensamos todos. Enquanto lemos mais uma notícia de algum projeto bacana e vem à cabeça: "São Paulo é foda".

André Foresti é estrategista e fundador da Troublemakers.

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