Morte aos suicidas

Por Washington Olivetto A Revista Archive de novembro traz um publicitário brasileiro na sua entrevista de capa: eu. Minha primeira sensação é de alegria. …

Por Washington Olivetto
A Revista Archive de novembro traz um publicitário brasileiro na sua entrevista de capa: eu. Minha primeira sensação é de alegria. Archive, publicada em inglês e alemão, é o resultado do excellence in advertising no mundo. Minha segunda sensação é de apreensão. Do jeito que as coisas andam, não acredito que um garoto de 19 anos que comece em publicidade hoje no Brasil, como eu comecei há 21 anos, venha a ser capa da Archive no ano 2013 por mais talento que tenha. A razão é simples: quando eu comecei, no início dos anos 70, o Brasil era um país de 3º mundo que lutava para ter uma publicidade de 1º mundo. Logo, um cara como eu, com algum talento, alguma sorte e muita vontade de trabalhar, podia perfeitamente transformar-se num personagem da publicidade mundial sem precisar sair daqui. Hoje enquanto países como a Espanha, apenas para citar um que está na moda, lutam para chegar onde nós estamos, a publicidade brasileira briga obssessivamente para voltar ao 3º mundo. A desculpa da crise faz com que agências se ofereçam para trabalhar praticamente de graça. Concorrências especulativas são realizadas a 3 por 4. E alguns ainda tentam justificar tudo isso em nome de uma onda de modernidade, sem dúvida nenhuma uma modernidade bem parecida com a do PC Farias ou do Fernando Collor. A verdade é que crise e falta de dinheiro não são desculpas para subserviência, falta de vergonha ou falta de caráter. Se a vida fosse assim, vocês podem imaginar qual seria a profissão de todas as moças que nasceram em famílias humildes com dificuldades de sobrevivência. Além disso, livre negociação não significa trabalhar de graça de um lado, procurando se ressarcir através de maneiras pouco lícitas do outro. (Jabás de produtoras, gráficas, etc e tal). Não estou aqui defendendo a lei 4.680, até porque é uma lei que enquadra todas as agências na mesma remuneração, como se todas fossem um Opala - o que privilegia os Fuscas, mas prejudica as Ferraris (minha agência é uma Ferrari). Mas a experiência mundial prova que a remuneração fixa por comissão predeterminada para todas as agências tem sido a forma menos ruim de clientes e agências se relacionarem nesse negócio. Evidentemente existem outras formas de remuneração que envolvem desde cobrança por hora de reuniões até mínimos de faturamento garantidos para a agência, aconteça o que acontecer com o mercado e a economia do país. (Já imaginaram isso aqui?). Mas no Brasil, onde a economia é um caos, a indisciplina e a idéia de levar vantagem em tudo imperam, ou se regulamenta a coisa, ou a propaganda acaba como acabou na Argentina. O mais absurdo é que existem até publicitários que propõem uma remuneração das agências baseada nos resultados dos clientes. Como se alguma agência no planeta pudesse controlar a distribuição, a política de preços, de incentivos, enfim, todas as peculiaridades internas dos seus clientes. Se fosse anunciante, fugiria de um publicitário com um discurso desse tipo. Quem pensa assim (na verdade não pensa, é só um truquinho barato para tentar pegar contas) é no mínimo um péssimo homem de negócios e eu não gostaria de ver um péssimo homem de negócios cuidando da minha propaganda. A respeito das concorrências por campanha, a coisa também é grave. Para começar, a mioria dos profissionais de marketing sérios deste país (existem muitíssimos) sabe que 90% dessas concorrências são feitas somente para avalizar decisões já tomadas. Além de qualquer agência cabeça-de-bagre poder contratar brilhantes profissionais de free lancer só pra ganhar uma concorrência e depois, o anunciante que se contente com aquela agência de mentirinha inventada só para aquele momento. O mais maluco disso é que agências de publicidade são escolhidas normalmente por presidentes de empresa, diretores de marketing e diretores comerciais. E é evidente que alguém, para chegar a um cargo desses, tem a obrigação de conhecer muito bem o mercado publicitário. Saber quem é quem e ter a capacidade de escolher aquelas agências que pretende visitar, avaliar estrutura, retrospecto, case-histories, empatia e desse modo fazer uma escolha profissional. É assim que se trabalha e um anunciante que não age assim na hora de escolher a sua agência, provavelmente será um péssimo cliente no dia-a-dia. Esses são apenas alguns lados da catástofre, mas o resumo é que os publicitários permitiram que muita gente perdesse o respeito por eles. O resultado disso é que, entre alguns anunciantes, acabou virando status dizer que paga menos ou que promoveu uma verdadeira Noite dos Desesperados entre agências para finalmente escolher uma delas. Duvido que esses mesmos empresários fizessem uma concorrência para descobrir quem faz uma ponte de safena bem baratinha. Nesse momento, minha única esperança é a de que o pessoal acorde: o Brasil tem magníficos profissionais de marketing e sua publicidade é reconhecida e invejada mundialmente. Jogar fora esse patrimônio que custou tanto construir é no mínimo burro e pode representar prejuízos irreparáveis para agências, veículos e principalmente anunciantes. Tomara que os mal-intencionados, incautos e desavisados percebam isso antes que seja tarde. E a nossa publicidade vá parar no Archive morto da publicidade mundial.
* Publicitário

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