Onde estão as mulheres desta sala?

Por Tatiane Mizetti, para Coletiva.net

As mulheres predominam na profissão de Relações Públicas. Lembro que, quando me formei, éramos 30 mulheres e três homens. O grande desafio quando eu estudava era, como jovem mulher, inserir-me em ambientes estratégicos em que a predominância nos cargos era de homens. Iniciei minha carreira como RP trabalhando comunicação para o setor de Tecnologia da Informação e da Comunicação (TIC), o que, certamente, foi muito desafiador.

Ser da área de Humanas, mulher, jovem e buscar um espaço para ser ouvida foi assustador. Confesso que não tinha dimensão de tudo isso e minha intenção era aprender, crescer e, então, fui até ingênua, entrando em projetos gigantes com doutores, mestres na área de TIC e eu, a estagiária de RP. Meu aprendizado de vida foi agir sempre com honestidade e humildade. Essas pessoas tinham suas vivências, experiências, títulos, mas dentro das suas áreas (Exatas). Aos poucos, fui criando coragem e trazendo tudo que via na universidade.

Claro que não foi fácil! Chorei muito, termos técnicos, pessoas bacanas, outras não tão bacanas, mas eu não me intimidei e fui construindo o meu caminho. O que mais amo na minha profissão é a estratégia de relacionamento. Isso é fundamental em qualquer área e ter uma formação que utiliza a ciência da Comunicação para isso é algo que me orgulho.

Sempre gostei de desafios no trabalho, gosto do envolvimento e realmente preciso acreditar nos projetos para desenvolvê-los. Depois de me formar dei continuidade ao trabalho de Relações Públicas como contratada, o que não era algo comum na época e foi uma conquista ter esse cargo. Após mais um tempo assumi a gerência do setor e mesmo já me sentindo mais firme como profissional ainda encontrava barreiras por ser mulher. Trabalhar comunicação dentro da área de TIC sempre parecia uma gincana. A 'mulher' das Humanas ou, como sempre ouvia, a 'guria'. Sempre recebia várias tarefas e fazia o máximo para, a partir de uma pequena atividade, desenvolver outras ações.

Com o tempo fui sentindo vontade de ter mais autonomia para enfrentar de forma mais firme situações de desconfiança da minha capacidade intelectual. E esse foi uma dos vários motivos que me fizeram empreender. Decidi ter uma agência de Relações Publicas para aplicar estratégias de comunicação integrada, que é o modelo no qual acredito. Mais um grande desafio, mas tomar essa decisão me fez ter a certeza que realmente a rede de relacionamento, quando construída de forma respeitosa e ética, é algo que não conseguimos mensurar o valor.

Independentemente da profissão e do gênero, no momento que empreendi imaginei que teria que trilhar um caminho do zero e, no decorrer da caminhada, percebi que havia conquistado o respeito profissional das pessoas e isso me deixou muito confiante para seguir com o meu projeto. E, acima disso, com maior motivação para unir mais pessoas e mais projetos. Quando senti que a minha empresa já estava trilhando um caminho saudável, achei que era o momento de retomar as relações com as entidades de classe.

Por trabalhar com estratégia e respeito, recebi o convite para ser VP da Abradi-RS. Realmente foi algo inesperado, o  meio digital já tem algumas mulheres, mas ainda poucas e, em cargos de Diretoria, realmente poucas. O convite veio muito por essa questão de relacionamento e estratégia. E entre a estagiária assustada, mas com coragem, e a empreendedora e VP, são mais de 10 anos.

Unir pessoas, projetos, atividades sempre foi meu foco. Meu próprio negócio eu sempre pensei como um organismo para desenvolver pessoas e projetos. Já ouvi que sou sonhadora, mas acredito que sou motivada por isso, sonhos, histórias, sentimentos reais. Lógico que para empreender você deve ter coragem, sendo homem ou mulher.  De qualquer forma, por ser mulher tive que romper barreiras com segurança e respeito. Tive sorte de conviver com executivos que me ensinaram, sempre ouvi bastante e quando algo era desconfortável eu respirava fundo e seguia. Temos raízes muito fortes desta predominância masculina, mas acredito na educação de todos os lados e quando as partes estão dispostas tudo dá certo.

Vejo muita mudança hoje convivendo com o mercado digital, as empresas, na sua maioria, compostas por jovens rapazes. Estamos em transformação e cabe a nós mulheres seguirmos conquistando os espaços. Às vezes, quando estou em reuniões com 20 homens e eu sou a única mulher, como já ocorreu e ocorre, olho para trás e lembro aquela jovem intimidada, mas hoje debocho e pergunto: "Onde estão as mulheres desta sala?". Temos que fazer a nossa parte com respeito e determinação.

Tatiane Mizetti é relações-públicas, com pós-graduação em Gestão de Projetos. Sócia-diretora da Reverso Comunicação Integrada e vice-presidente da Abradi-RS.

Comentários