A sirene não tocou e mais uma vez o Brasil falhou

Por Elis Radmann

Assistir à tragédia de Brumadinho pela televisão é desolador e deve ser uma experiência devastadora para aqueles que estão trabalhando heroicamente no processo de atendimento e de busca às vítimas.

Quando falamos em vítimas, temos que ter em mente que são mais de 1.000 pessoas que foram vítimas diretas ou indiretas desta tragédia. Mais de 670 pessoas foram localizadas ou resgatadas pelo corpo de bombeiros. E são mais de 360 pessoas desaparecidas ou encontradas sem vida.

É algo inimaginável, pensar na barragem rompendo e na lama trazendo consigo uma grande leva de trabalhadores e gerando o maior acidente de trabalho da história do País.

E esta lama foi avassalando uma comunidade, acabando com ruas, destruindo casas, soterrando plantas e animais, levando carros e, principalmente, tirando vidas humanas e separando famílias.

Os depoimentos dos sobreviventes demonstram o turbilhão de sentimentos que uma pessoa fica exposta depois de vivenciar uma tragédia destas. De um lado, os sobreviventes expressam a gratidão pela vida e de outro lado, demonstram o desalento pelas perdas de parentes e amigos e a frustração em ter sua história soterrada.

E parece que vivemos um déjà vú apenas três anos após a tragédia de Mariana, um acidente na mesma região, com a mesma empresa e com o mesmo tipo de operação. Parece que não aprendemos, nem mesmo para conseguir tocar a sirene. E novamente uma tragédia assola todo um contexto social e ambiental, e a estimativa de especialistas é de que a lama atinja mais 10 municípios de Minas Gerais e pode chegar ao rio São Francisco, se nada for feito.

Para os que assistem à tragédia de forma atônita, ficam as perguntas. O que houve? Foi incompetência, negligência ou ganância?  Por que o Brasil não aprendeu com a tragédia anterior?

Para refletirmos e/ou debatermos sobre os motivadores desse novo desastre, temos que analisar os vários contextos que envolvem este tema e as lições que precisam ser aprendidas.

Na questão legislativa, o Senado Federal arquivou um projeto que endurecia a política de segurança de barragens e perdeu a oportunidade de fazer um importante debate sobre o tema e possibilidade de diminuir o risco desse novo desastre.

Os ambientalistas afirmam que a tragédia é resultado do descaso, motivado de interesses econômicos. Afirmam que existem tecnologias mais avançadas para uma mineração mais segura, porém, é difícil conciliar interesse econômico com responsabilidade social.

Todos os documentos da Barragem estavam em dia em termos de fiscalização e regulação. As informações oficiais dão conta de que são 790 barragens de rejeitos de mineração e com um marco regulatório frágil, que permite que o controle de riscos fique nas mãos das próprias barragens, ou seja, a própria barragem é que deve apresentar laudos que atestem a segurança da população e do meio ambiente.

Do ponto de vista da engenharia, os laudos dão conta de que era uma barragem estável. Diante desta reflexão, o grande questionamento fica por conta da engenharia de barragens: se há falta de tecnologia para fazer o controle mais efetivo das barragens ou se há falta de recursos?

Em um mundo em transformação e disruptivas, talvez o debate tenha que refletir sobre o fim das barragens, com o aproveitamento dos rejeitos da mineração em matéria-prima para construção civil (blocos, tijolos, cimento, etc).

Não é à toa que dizem que "errar é humano e persistir no erro é tolice".

Autor
Elis Radmann é cientista social e política. Fundou o IPO - Instituto Pesquisas de Opinião em 1996 e tem a ciência como vocação e formação. Socióloga (MTB 721), obteve o Bacharel em Ciências Sociais na Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e tem especialização em Ciência Política pela mesma instituição. Mestre em Ciência Política pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), Elis é conselheira da Associação Brasileira de Pesquisadores de Mercado, Opinião e Mídia (ASBPM) e Conselheira de Desburocratização e Empreendedorismo no Governo do Rio Grande do Sul. Coordenou a execução da pesquisa EPICOVID-19 no Estado. Tem coluna publicada semanalmente em vários portais de notícias e jornais do RS. E-mail para contato: [email protected]

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