Droga, droga, droga

Por Fraga

Porto Alegre parece sitiada por doenças.

Fecham livrarias, abrem farmácias; fecharam cinemas e pipocaram farmácias; fecha um bar e no mesmo ponto surge outra farmácia; fecham boates e puteiros e lá vem farmácias e farmácias.

Quer dizer, em lugar de cultura e diversão, alegria e sexo, farmácias, farmácias, farmácias. Agora já tem farmácia ao lado de farmácia, farmácia em frente de farmácia, até farmácia em cima de farmácia. Não duvido que haja farmácia dentro de farmácia.

Porto Alegre tem que examinar essa tendência, acho que rola uma hipocondria empreendedora, em meio a uma estranha síndrome urbana. Para suprir tamanha rede de redes, um dia a capital ainda vai ter que importar doentes (pensando bem, já faz isso).

A gente circula pela cidade e não consegue desviar os olhos das farmácias. Da noite pro dia brotam novas farmácias em bairros já saturados de farmácias. Todas com letreiros acusatórios - a nos cobrar menos saúde, embora os slogans digam o contrário.

Inverno ou verão, com ou sem frio, com ou sem resfriado, estamos encurralados por farmácias. Não importa a estação: todas as farmácias abanam seus cartões, a exigir fidelidade do corpo de cada habitante. Vem a Primavera e em vez de canteiros e jardins, florescem luminosos de farmácias.

Entre tantas, são panvéis, raias, farmais e são-joões que não acabam mais. Entretanto, são estabelecimentos que não estabelecem empatia alguma com a diversidade comercial que a cidade merece.
Onde caberiam mais galerias e teatros, danceterias e bailantas, estúdios de arte e locais de música ao vivo, tome farmácia.

Por trás do avanço dessas fachadas deve haver algo doentio. Um óbvio tipo de fixação comercial a explorar os males da sociedade, sempre tão rentáveis. Talvez seja apenas efeito colateral da ganância empresarial.  Só quem não vê contraindicação nisso é quem arrecada impostos. A receita pública a partir das receitas do cidadão.

Ou sou só eu que acha esquisito esse negócio?

 

Autor
Fraga. Jornalista e humorista, editor de antologias e curador de exposições de humor. Colunista do jornal Extra Classe.

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