A simbiose entre imprensa e celebridades

Anelise Zanoni

12/03/2021 16:29
A simbiose entre imprensa e celebridades

Depois de tanta notícia ruim sobre a pandemia, os noticiários deram espaço esta semana para a polêmica entrevista do príncipe Harry e sua esposa, Meghan Markle, que falaram sobre os bastidores da vida na realeza britânica. Muito cuidadosa e direta, Oprah Winfrey conduziu a conversa no canal americano CBS como se estivesse conversando com uma amiga. E estava.  

A proximidade de Oprah e Meghan talvez tenha sido um dos principais fatores para a entrevistada abrir o coração e deixar claro que estava exausta de viver as regras da família real. Além de declarações chocantes como a preocupação com o tom de pele do bebê, o casal confirmou que a família real é, na verdade, uma empresa, que precisa manter a reputação em alta, mesmo que isso custe caro.  

O fato de uma família atuar como uma empresa (the firm, como eles falam) exige que os "funcionários" trabalhem e atuem conforme as regras. Neste trajeto, não há espaço para erros e fraquezas. Não dá para ficar triste e pedir ajuda.  

Outro fator que chama a atenção é a relação simbiótica entre empresa e imprensa. Os tabloides britânicos, que há anos acompanham a vida da família real, se alimentam do dia a dia da "firma". Precisam saber seus passos, suas fraquezas e vitórias. Por outro lado, a família comandada pela rainha Elizabeth II precisa dos tabloides para manter a aparência e para oferecer entretenimento ao público.  

Quando ouvi o desabafo do casal durante a entrevista foi inevitável: lembrei da tristeza nos olhos de Lady Di em diversos momentos registrados pela imprensa. E, quando sabemos qual foi o desfecho, é assustador e compreensível que o casal tenha medo de um final infeliz.  

Nesta relação doentia entre tabloides ingleses e família real, não há espaço para a essência do próprio ser humano, que tem suas dores e particularidades. A imprensa parece trabalhar com informações mentirosas, especulações e criação de histórias diversas.  

E o pior: o casal Harry e Meg confirmou que os mesmos jornalistas dos tais tabloides participam de festas em espaços da família real e solicitam regalias. Há uma política de boa vizinhança no meio do caos e da falsidade.  

Como reação à veiculação da entrevista, muitos veículos de imprensa reprovaram o conteúdo das declarações. Alguns jornalistas foram demitidos e outros atacaram o casal. 

Na verdade, não dá para dar credibilidade a este tipo de jornalismo fofoqueiro, mentiroso, oportunista e sensacionalista. Bom, podemos trazer pra nossa realidade algumas situações semelhantes: tem muita celebridade no Brasil que vive de aparências, convida jornalistas para festas, passa notícias em primeira mão. E muito jornalista que depende dessas "amizades" para sobreviver e para trabalhar. Fazer relacionamento com a imprensa é diferente de participar de um jogo de interesses. O ciclo vicioso entre imprensa e fonte existe em todos os lugares - e de todas as formas. Precisamos estar atentos!