As possibilidades de afetos que o inverno proporciona

Por Márcia Martins

Será que, finalmente, nestes últimos dias de maio, a temperatura aqui em Porto Alegre exigirá agasalhos de Inverno, roupas mais quentes, blusas da lã, luvas aquecendo as mãos, toucas ou chapéus protegendo as cabeças e meias para não encarangar as pernas? Será que até que enfim, neste fechamento de maio, as noites se apresentarão propícias à degustação de canjas e consommés, pratos fumegantes, deliciosas taças de vinho tinto cabernet sauvignon e maratonas de filmes com toda a família amontoada no sofá debaixo de cobertores e edredons? Será que já podemos fazer um planejamento para abastecer as prateleiras da despensa a fim de ter mantimentos suficientes para aqueles dias e noites de muito frio e chuva, quando ninguém quer botar o pé na rua?

É porque sou totalmente apaixonada pelo Inverno, pelo aconchego que ele sugere, pelo acarinhamento que ele insinua, pelas suas promessas de encontros, pelas suas ideias de relaxamento, pelo clima mais convidativo aos amores e pela eterna preguiça que ele inaugura. Sei que a temperatura baixa ainda não é definitiva, que teremos alguns dias com os termômetros nas alturas e que estes dois últimos dias de pequena sinalização de frio não significam lá muita coisa. Afinal, o Inverno, no Hemisfério Sul, onde nos encontramos, começa oficialmente só em 21 de junho, exatamente às 12h54, com seu término apontado no calendário para 23 de setembro. Mas estes indícios de frio já me animaram e fiquei lépida e faceira.

Quando falo que gosto do Inverno e de suas possibilidades, sempre tem alguém que me olha com espanto, surpreso, como se eu estivesse proferindo uma barbaridade. É que no Inverno as pessoas ficam mais bonitas, mais elegantes e mais receptivas. Claro que não vale aqueles trajes horríveis de pijama de ursinho de pelúcia, três blusas básicas por baixo, meia de lã e aquelas pantufas de bichinhos. Esta indumentária, por favor, é só e apenas para consumo Interno. Nem naqueles roupões todos surrados, já com centenas de fios puxados, que só devem mesmo ser usados para sair do banho, quando se tem a certeza de não ter mais ninguém em casa. Nem mesmo os seus animais de estimação.

A beleza e a elegância das pessoas no Inverno de Porto Alegre estão estampadas nas faces sem suores escorrendo. Nas echarpes e pashiminas que se enroscam nos pescoços e enfeitam e dão colorido especial sobre os blusões de lãs, moletons e casacos. Nas luvas que encobrem as mãos trêmulas de frio. Nas toucas que escondem os longos cabelos antes soltos ao vento. Nos chapéus que embelezam as cabeças dos homens e mulheres. Nas amigas que conseguem se encontrar para colocar os assuntos em dia nos cafés dos shoppings da capital gaúcha. Nas sessões de cinema lotadas nos finais de semana. Nos jantares regados a fondues e vinhos.

Posso estar enganada. Não sou dona da verdade. E nem tenho esta pretensão. Mas carrego a percepção de que o frio aproxima as pessoas, fermenta as amizades, estimula as reuniões, motiva os encontros, acelera as paixões, incentiva as leituras, encoraja a audiência prolongada de músicas, desperta os jogos de cartas, aviva a vontade de chás, cafés e bolos deliciosos. Eu, pelo menos, fico (acho) mais simpática no inverno. Claro que os sinais prematuros de frio, invariavelmente, produzem as primeiras gripes. E haja chá de limão com mel, banho quente, repouso, vitamina C e cama. Confesso que já fui atingida pelos espirros, mal-estar e dor de cabeça. Gripe ou resfriado? Não sei. Logo passa. Tem um Inverno me esperando.

Autor
Márcia Fernanda Peçanha Martins é jornalista, formada pela Escola de Comunicação, Artes e Design (Famecos) da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), militante de movimentos sociais e feminista. Trabalhou no Jornal do Comércio, onde iniciou sua carreira profissional, e teve passagens por Zero Hora, Correio do Povo, na reportagem das editorias de Economia e Geral, e em assessorias de Comunicação Social empresariais e governamentais. Escritora, com poesias publicadas em diversas antologias, ex-diretora do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio Grande do Sul (Sindjors) e presidenta do Conselho Municipal dos Direitos da Mulher de Porto Alegre (COMDIM/POA) na gestão 2019/2021. E-mail para contato: [email protected]

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