E se fizermos um acordo de afeto?

Por Grazielle Araujo

Falar de algo que precisamos evoluir é sempre válido, seja qual for o tema. Quando contamos com a mídia a favor, na disseminação da correta informação dos fatos, melhor ainda. Em tempos de redes sociais, o recado é ainda mais ampliado. 

Eu - e muitos que estão lendo este texto - acompanhamos o movimento contra atos racistas que repercutiram recentemente pelo mundo inteiro. Digo isso pelo fato do engajamento que causou em muita gente branca, principalmente, ao estampar uma tela preta em seus perfis. Outros por compartilharem relatos ou por exemplificarem "pequenos atos" que são tão corriqueiros e que muitos não se dão conta que alimenta o preconceito. Procurei não ficar fora disso, por razões pessoais obviamente, e compartilhei cards que tinham conteúdo didático, explicativo e que julguei interessante. Li muita coisa legal  e vi também mais do mesmo. Falar sobre racismo, refletir, ouvir, escrever e aprender sobre isso é uma constante na minha vida há muitos anos. Eu sempre gosto de ouvir os negros sobre isso, é um ponto de vista que eu nunca conseguirei alcançar com propriedade de quem vive na pele isso tudo. 

Motivada pelo movimento do dia, parei para refletir um pouco sobre o que eu estou fazendo para contribuir para minimizar isso tudo, tanta dor, tanta desigualdade, tanto preconceito. A palavra desejada era "acabar", mas sei que essas coisas levam anos, décadas, séculos. Se é que um dia acabará. 

Passou da hora de precisarmos mesmo fazer disso uma constante. Não é mimimi, não é bobagem, não é modismo. Mata, traumatiza, rotula, ofende. 

Entre tantas notícias de violência, uma delas era sobre um jovem negro que tinha sido baleado na cabeça porque um policial "se assustou". Daí veio na mesma hora o pensamento: e se fosse o meu filho!? Quantas famílias já sofreram com enganos? Quantas vidas abreviadas por achismos? Quantas mágoas nossos amigos negros devem ter guardado consigo que nem imaginamos? Que muitos não contam para não serem rotulados? Você se sentiria bem em expor que foi confundido com um ladrão, com um traficante? Que foi chamado de isso ou aquilo simplesmente por causa da cor da sua pele? Só de pensar incomoda, vai dizer? Imagina então sentir! 

Movimentos mundiais encorajam as pessoas, seja para colocar a boca no mundo, para defender quem amamos, para resgatar importantes lutas. É o velho assunto de cada um fazer a sua parte, como pode, como dá, do jeito que for. Ó a empatia de novo mostrando a grandeza do seu significado no nosso dia a dia. 

Dentre os cards compartilhados por mim (repostados por amigos cujo perfil original eu nem conhecia), um me chamou a atenção em especial. Ele dizia assim: "COMO FAZER MAIS DO QUE SÓ POSTAR #BLACKLIVESMATTER"? Como jornalista, decidi que vou tentar escrever e ler mais sobre isso. Tá aqui neste texto a vontade exposta. Mas meu maior incentivo foi o de ser mãe de um rico de um guri marrom com cachinhos desenhados e covinhas apaixonantes. Que tem orgulho da sua cor, do seu cabelo e nem imagina o quanto isso já causa dor em tantos de nós. Tá neles a nossa inspiração, nossa fé que teremos pessoas melhores logo ali na frente. As crianças não nascem racistas. Elas são criadas e educadas por nós, pais. 

Hoje eu faço um apelo a quem escolheu deixar herdeiros nesse mundão: pais, principalmente de crianças brancas, sem preconceito, por favor. Escrevo isso pois os negros sabem falar sobre isso com seus filhos com tanta propriedade e vivem desde a sua própria infância. Não tiveram escolha. Eu escolhi ter um filho negro, tô vivendo esse mundo há bem menos tempo de vida do que o pai dele já viveu e ainda viverá. Se eu puder deixar como legado alguma coisa que faça ele e as gerações que vierem sofrerem menos pela cor da pele, eu seria realizada como mãe e ser humano. Nossos filhos aprendem o preconceito, na maioria das vezes, em casa. Eles refletem nossas atitudes, sabemos disso. Imagina fazer um pacto com esse montão de pais que também não julgam alguém pela cor da pele a colocarem este tema tão importante nas conversas em família? Como abordar, muitos se perguntariam. Também não sei bem, mas em tempos de compartilhamento, não seria uma tarefa tão difícil assim. Seria uma grande corrente pelos que vêm por aí. Um grande acordo de afeto, sabe? O não falar também deixa mensagens, na maioria das vezes mal entendidas. Não podemos deixar esse assunto na responsabilidade somente das escolas ou dos livros de história. A dor do meu filho pode ser evitada se os seus amigos não o discriminarem em pequenas atitudes, mesmo "sem querer". Talvez os nossos netos um dia nem saberão que fizemos parte dessa importante luta pelo fim da discriminação racial, mas só de pensar que não serão confundidos com algo que jamais seriam, já seja uma grande evolução.

Autor
Grazielle Corrêa de Araujo é formada em Jornalismo, pela Unisinos, tem MBA em Comunicação Eleitoral e Marketing Político, na Estácio de Sá, pós-graduação em Marketing de Serviços, pela ESPM, e MBA em Propaganda, Marketing e Comunicação Integrada, pela Cândido Mendes. Atualmente orienta a comunicação da bancada municipal do Novo na Câmara dos Vereadores, assessorando os vereadores Felipe Camozzato e Mari Pimentel, além de atuar na redação da Casa. Também responde pela Comunicação Social da Sociedade de Cardiologia do RS (Socergs) e da Associação Gaúcha para Desenvolvimento do Varejo (AGV). Nos últimos dois anos, esteve à frente da Comunicação Social na Casa Civil do Rio Grande do Sul. Tem o site www.graziaraujo.com

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