Encalhada fica a sua avó

Finalmente alguém de renome no mundo dos relacionamentos, o psiquiatra Flávio Gikovate endossa a teoria que insisto em defender há alguns anos. "Não precisa …

Finalmente alguém de renome no mundo dos relacionamentos, o psiquiatra Flávio Gikovate endossa a teoria que insisto em defender há alguns anos. "Não precisa casar. Sozinho é melhor", afirmou, em extensa entrevista a uma publicação nacional. E reforçou ao dizer que o amor romântico morreu e o caminho viável para a felicidade é a vida de solteiro. Sempre que enumero as inúmeras vantagens de se estar sozinha (e não ser sozinha, o que dá uma enorme diferença), normalmente numa mesa de bar rodeada por mulheres sem uma companhia masculina fixa, ouço algumas queixas, gritos, lamentos e opiniões contrárias.


Perfeitamente acatadas porque a minha democracia funciona também quando nem todos concordam comigo (ué, mas não deveria ser assim a tal da democracia ou me ensinaram errado?). No final das reuniões etílicas e que sempre reformam o mundo, na teoria, cada uma segue para a sua casa, vai ao encontro do seu ficante (que não pode ser considerado estável, fixo ou sei lá, porque daí desocupa o posto de ficante, deu prá entender?) ou faz o que bem lhe interessa. A maioria, como ensina o psiquiatra, está sozinha porque na hora de escolher entre o amor e a individualidade, optou pelo segundo item.


E não é que comprovei "in loco" o conselho do psiquiatra na noite de segunda-feira, depois de sair de um sarau da comunidade do Orkut "Poemas à Flor da Pele", em que cinco belas mulheres homenagearam Fernando Pessoa (Yes, me inclui na lista) pelo dia 10 de junho, data de Portugal, de Camões e das comunidades portuguesas. Pois, pois. Após o evento cultural, invadimos um bar sempre cheio ali no Bom Fim (não digo o nome para não fazer propaganda de graça). Quando entramos no bar, os clientes que ali estavam, na maioria homens sozinhos, pareciam que estavam vendo seres de outro planeta.


Pelo menos umas quatro vezes, diferentes representantes do sexo masculino disfarçadamente (sabem como eles têm o dom de disfarçar) vieram rodear a nossa mesa. Imaginem a cena. Vou ajudá-los. Cerveja preta, vinho tinto, refris diets, água mineral, sanduíche aberto, polentinha com queijo e 11 mulheres interessantes e misteriosas ali, sozinhas, aquela hora da noite (sim, o horário já era adiantado), a falar alto, todas juntas e a rir e gargalhar. Mas por que um grupo de mulheres cheirosas, na boca a cor do batom variava do rosinha ternurinha ao vermelho fatal e com muito assunto, despertou tanto assim a atenção dos homens?


Conclusões óbvias e nada maschistas, ok? A primeira: tem muito homem sobrando. Então as mulheres estão sozinhas porque realmente optaram por um estilo de vida individual. A segunda: tem muito homem que deixa a mulher em casa e vai para a rua fazer farra com os amigos. Ai, que maldade! Terceira: eles foram até a nossa mesa para descobrir se falávamos de sexo e futebol. Não, o nosso universo é mais amplo. Os assuntos mesclavam-se entre próximos saraus, sexo, política, filhos, futebol, preços dos alimentos e blá, blá, blá. Quarta: "aimopai" que "meda", os homens vão me encher de emails. Porque homem não pode ver uma mulher sozinha, imagina um grupo!


É claro que toda regra tem exceção. Não tomem tudo ao pé da letra. Mas, o lance da individualidade é fundamental. Principalmente para quem já foi casado. Você chega em casa a hora que quer, tem uma cama imensa de casal para se espalhar, escuta as músicas que gosta, não precisa fingir que gosta dos amigos chatos dele, nem agüentar intromissão de sogra e nem mentir que tá com dor de cabeça. Vez em quando, conforme sua demanda sexual, você pega a lista dos ficantes e combina algo. Ah, um inconveniente. Não tem presente no Dia dos Namorados. Tou nem aí, ganhei presentes no dia 9, meu aniversário.

Autor
Márcia Fernanda Peçanha Martins é jornalista, formada pela Escola de Comunicação, Artes e Design (Famecos) da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), militante de movimentos sociais e feminista. Trabalhou no Jornal do Comércio, onde iniciou sua carreira profissional, e teve passagens por Zero Hora, Correio do Povo, na reportagem das editorias de Economia e Geral, e em assessorias de Comunicação Social empresariais e governamentais. Escritora, com poesias publicadas em diversas antologias, ex-diretora do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio Grande do Sul (Sindjors) e presidenta do Conselho Municipal dos Direitos da Mulher de Porto Alegre (COMDIM/POA) na gestão 2019/2021. E-mail para contato: [email protected]

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