Hemingway e os outros

Por José Antônio Moraes de Oliveira

"As pessoas mais cruéis são 

sempre as mais sentimentais."

Ernest Hemingway.

Ele valorizava a coragem acima de tudo o mais. Pescando marlim azul na costa de Cuba, caçando leões no Quênia ou buscando fazer algo que ninguém fizera antes na literatura, Ernest Hemingway fazia jus ao alto padrão que impôs a si mesmo. Flertando com o perigo e com  a morte,  ele viveu entre nós por quase 62 anos, antes que o impulso suicida o vencesse, como havia vencido seu pai. Antes de morrer, criou uma artilharia pesada de obras incluindo alguns dos grandes romances do século XX. Também exibia a arrogância dos corajosos e gostava de desconstruir pessoas a quem invejava. Não poupou colegas escritores nem figuras notáveis. De Joe Louis dizia que "nunca aprendeu a lutar boxe", embora tivesse um "bom gancho".

***

Sobre o poeta T.S. Eliot, escreveu:

"É um realista, um anglo-católico e um conservador. Nunca jogou uma bola para fora do campo e não teria existido se não fosse o velho Ezra Pound. (...) Mas é um poeta danado de bom e um crítico honesto."


***

Sobre o amigo Erza Pound:

"Um poeta adorável e um estúpido traidor. No entanto, mereceria ter ganho o Nobel no lugar de Eliot."

***


Sobre o colega dos Anos Dourados, Francis Scott Fitzgerald:

"Eu acredito que basicamente se deve escrever para duas pessoas. Para si mesmo e para quem ama. Acho que Scott foi um escritor indisciplinado, um talento desperdiçado. Em sua estranha monogamia católica irlandesa ele escrevia para Zelda. Mas quando ele perdeu a esperança nela e a confiança em si mesmo, estava acabado."


***

Ainda sobre Scott Fitzgerald, em carta que mais tarde reproduziu em "Uma Festa Móvel":

"Não se preocupe. Você sempre escreveu antes e vai escrever agora. Tudo que você precisa fazer é escrever uma frase verdadeira. Escreva a frase mais verdadeira que você conseguir."


***

Em "Uma Festa Móvel", sobre Pauline Pfeiffer, sua segunda esposa:

"Ela era o diabo em Dior e um terrier determinado, que usava a arte da sedução para assassinar meu casamento com Hadley."


***

O novelista William Faulkner não tinha grande apreço para com Ernest Hemingway. Escreveu: "Ele não tem coragem. Nunca ousou usar uma palavra que fizesse o leitor procurar um dicionário".                                          

A resposta:                                         

"- Pobre Faulkner. Ele realmente acredita que grandes emoções vem das grandes palavras?"

***

Do rompimento com John Dos Passos:

O assassinato do republicano José Robles durante a Guerra Civil na Espanha fez Hemingway romper com John dos Passos, que fora seu colega no front da Itália. Ao procurar esclarecer as causas da misteriosa morte do amigo, Dos Passos é acusado de fascista por Hemingway, o que o faz abandonar a Espanha. O episódio ajudou Hemingway a criar um de seus melhores romances, Por quem os sinos dobram, onde faz uma reflexão sobre amizade e rompimento:

"- Algumas amizades são baseadas numa profunda rivalidade".

***

Sobre o ofício de escritor, em entrevista à The New Yorker, em 1950:

"Eu não perdi nenhum nascer do sol em minha vida, e isso soma uma meia centena ou mais. Eu acordo com a luz do dia com minha mente construindo frases e é preciso me livrar delas, escrevendo-as com urgência."

***

Sobre o ofício de escritor, em carta a Ezra Pound em 1958:

"Para um verdadeiro escritor, cada livro é um novo começo, onde ele procura alcançar algo que está fora de seu alcance. Mas ele precisa continuar tentando o que nunca foi feito ou que outros tentaram e falharam. Então, às vezes, com muito suor e um pouco de sorte, ele   terá sucesso."

***

Quando Hemingway mostra a F. Scott Fitzgerald o rascunho de um novo romance, este sugere usar ao final um texto que ambos gostavam:  

"O mundo quebra a todos, mas muitos ficam mais fortes nos lugares quebrados. Mas aqueles que não quebram, mata. Mata imparcialmente o muito bom, o muito gentil e o muito corajoso. Se você não é nenhum desses, você pode ter certeza de que isso vai matá-lo também, mas não agora." 

A reação de Hemingway - rabiscar na carta do amigo tres palavras: "Kiss my ***"

Mesmo assim, ele usou o texto no final de "Adeus às Armas". 

 

***

Em carta ao editor e escritor Malcolm Cowley:

"Você sabe que é muito difícil a gente falar sobre o que escreve, porque se é bom, você sabe - mas falar disso faz a gente se sentir um bosta".

***

Quando tinha 19 anos, em carta à família:

"Bem melhor seria morrer enquanto feliz na juventude não desiludida,  em uma chama de luz, do que ter seu corpo desgastado e velho e suas ilusões despedaçadas."

Desde cedo, Ernest Hemingway considerava a vida como uma batalha perdida. Dizia que "embora a vida nos vença, rasgue nossa carne e quebre nossos dentes, sempre será possível salvar nossa dignidade, vivendo perigosamente, mas com bravura". 

***

Autor
José Antônio Moraes de Oliveira é formado em Jornalismo e Filosofia e tem passagens pelo Jornal A Hora, Jornal do Comércio e Correio do Povo. Trocou o Jornalismo pela Publicidade para produzir anúncios na MPM Propaganda para Ipiranga de Petróleo, Lojas Renner, Embratur e American Airlines. Foi também diretor de Comunicação do Grupo Iochpe e cofundador do CENP, que estabeleceu normas-padrão para as agências de Publicidade. Escreveu o livro 'Entre Dois Verões', com crônicas sobre sua infância e adolescência na fazenda dos avós e na Porto Alegre dos velhos tempos. E-mail para contato: [email protected]

Comentários