Lateralidade

O novo livro de Philip Kotler e Fernando Trias de Bes, Marketing Lateral, trata de uma idéia sobre a qual falo há anos: a …

O novo livro de Philip Kotler e Fernando Trias de Bes, Marketing Lateral, trata de uma idéia sobre a qual falo há anos: a lateralidade, ou visão mais aberta. O enfoque que darei na coluna não é exatamente o mesmo do livro, mas foi o livro que suscitou minha reflexão. Talvez agora que Philip Kotler aborde o assunto, este seja tratado com mais importância.
É comum em todas as áreas de atuação que o profissional transite e se especialize nela. Isto é necessário e saudável, principalmente nestes novos tempos de transformações e novidades instantâneas e de concorrência acirrada. Sou médico? Vou procurar ser o melhor e saber tudo a respeito da minha especialidade. Sou advogado? Idem. Se sou um pintor, procuro estar atualizado com os novos lançamentos da indústria de tintas, novas técnicas para aplicação de tintas e resinas, etc. Até aí, tudo bem.
O problema começa quando eu só consigo enxergar fatos da minha profissão na frente. Só vou a eventos relacionados a ela, só faço cursos na área, so leio livros sobre o tema. Começa um processo que chamo de emburrecimento inteligente. Claro que não é emburrecimento no sentido exato da palavra, estou forçando este neologismo. O emburrecimento começa a acontecer porque começo a me "desligar" de outros aspectos da vida, do ser humano. O inteligente vem por conta de que, se me aprofundo em minha área, vou ter um crescimento importante em termos de conhecimento e experiência, e isto é muito bom.
Voltando ao emburrecimento, em especial no caso de marketing. Se eu deixo de ver lateralmente, ou seja, de ver as coisas que não estão diretamente ligadas a minha área de atuação, corro o risco de não enxergar também oportunidades e soluções para problemas de minha empresa. No caso dos negócios, a solução para a criação de um novo produto muitas vezes pode surgir não quando meu pessoal de P&D está dando duro dentro do escritório. Mas quando eles vão assistir a uma peça de teatro, um filme, pescar. Nestes momentos, o cérebro está mais livre e, portanto, mais receptivo a idéias "malucas". Mas há várias idéias malucas que deram certo, como se sabe.
Domenico de Masi, no livro "O Ócio Criativo", já destacava a necessidade e a importância de termos momentos de ócio. Que o ócio, ao contrário do que julga o senso comum, não só é fundamental para nossa criatividade quanto, na verdade, não é ócio, no sentido de se ficar sem fazer nada. O cérebro, esta velha massa cinzenta desconhecida, está lá, fazendo a única coisa que gosta: pensando.
A visão lateral era exercitada pelos antigos sábios, de uma certa forma. Eram eles grandes generalistas, como Leonardo da Vinci, que além de pintor foi inventor, entre outras coisas. Será que alguma invenção dele surgiu olhando o sorriso da Mona Lisa? Talvez.
Portanto, é fundamental que paremos de ler somente livros de nossa área, freqüentar somente eventos ligados a ela, ver pessoas que trabalham nela. Eu falei somente, não devemos deixar de fazer isto jamais. O somente se refere a também assistir palestras sobre o aquecimento da camada de ozônio, araras azuis ou sobre a história do açougueiro de Porto Alegre que fazia lingüiça de carne humana. Muitas vezes, é num destes momentos que acende aquela lampadazinha em cima de nossas cabeças e temos uma revelação.
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