Negociação e Conflito na Era Conectada
Por Beto Carvalho


O cenário corporativo e social se redesenhou. As antigas pirâmides hierárquicas, que por muito tempo ditaram o ritmo das organizações, cedem espaço a ecossistemas fluidos, ágeis e interconectados. A velocidade das inovações é vertiginosa, e a hiperconectividade promove novas relações, onde o controle direto é cada vez mais uma ilusão. Nesse contexto, a materialização de qualquer ideia ou projeto não depende mais de ordens verticais, mas de uma orquestração delicada entre pessoas e entidades sobre as quais, muitas vezes, não temos ascendência direta.
É aqui que a negociação assume seu papel central. Mais que uma habilidade, tornou-se uma necessidade intrínseca para navegar e prosperar. O poder, antes concentrado no topo, pulveriza-se em redes de interdependência, transformando cada interação em potencial ponto de acordo. Uma revolução silenciosa, mas potente, ecoando os princípios imortalizados no clássico "Como Chegar ao Sim", de Roger Fischer, William Ury e Bruce Patton. Obra que, mesmo após décadas do lançamento e revisões, continua sendo referência para quem busca aprimorar a arte de influenciar e construir acordos. Seus autores já cravavam na primeira edição do livro: quer gostemos ou não, somos todos negociadores.
O verbo "negociar" deixou de ser exclusividade de corredores diplomáticos, salas de venda ou escritórios de advocacia. Hoje, temos a clareza de que cada dia é um emaranhado de negociações, formais ou informais, com quem quer que interajamos. Longe vão os dias em que a negociação era sinônimo de embate, onde a pergunta crucial era "quem vai ganhar e quem vai perder". Essa mentalidade arcaica, que exigia a rendição de uma das partes para que houvesse um fim, está sendo superada. Compreendemos agora que existem inúmeras formas cooperativas de resolver divergências, buscando um desfecho "ganha-ganha" ou, no mínimo, um acordo sensato que beneficie todas as partes, superando a rigidez das concessões unilaterais.
Nessa "Revolução da Negociação" - termo cunhado pelos autores - em plena efervescência global, surge um elemento paradoxal, mas igualmente vital: o conflito. Sim, ele não diminuiu; pelo contrário, parece ter se expandido. A hierarquia vertical do passado tendia a conter os atritos, mantendo-os, não raras vezes, sob o tapete. Contudo, com a ascensão das estruturas hierárquicas horizontais e a democratização das relações, os conflitos são libertados. Eles vêm à tona, revelando-se não como falhas, mas como parte inerente e, ousadamente, útil da vida.
O objetivo, portanto, não é eliminar o conflito. É ingênuo e ineficaz tentar fazê-lo. O conflito é um catalisador para mudanças construtivas, um motor para aprimoramentos e descobertas. Poucas injustiças históricas foram corrigidas sem um intenso contraditório de ideias e vontades. As melhores decisões em sistemas democráticos, por exemplo, não nascem de um consenso superficial, mas da exploração profunda de diferentes pontos de vista, da fricção necessária que lapida as soluções e as torna verdadeiramente criativas. Pode soar contraintuitivo, mas um mundo que busca prosperidade precisa de mais conflito, e não menos. O desafio reside em transformá-lo, mudando radicalmente a forma como lidamos com as divergências: de uma luta destrutiva e antagônica para uma resolução prática, harmônica e, acima de tudo, construtiva das diferenças.
Assim, a arte da negociação e a gestão inteligente do conflito não são apenas habilidades valiosas; são pilares para a construção de um futuro mais colaborativo e inovador. Aceitar essa realidade é o primeiro passo para dominar a dinâmica das relações humanas nessa nova era.