O racismo está no meio de nós

Por Elis Radmann

Tenho uma jornada de mais de duas décadas ouvindo as pessoas, coordenando pesquisas quantitativas e qualitativas sobre os mais variados temas, inclusive sobre racismo, homofobia e machismo. 

No início dos anos 2000 o IPO - Instituto Pesquisas de Opinião coordenou no sul do país a PESB - Pesquisa Social Brasileira. Foi um estudo muito impactante, pois estudamos o racismo na sua forma mais intrínseca. 

O estudo contemplava várias técnicas para avaliar o racismo, inclusive utilizou um índice para medir o preconceito. 

É importante frisar que, quando se pergunta objetivamente se a pessoa é racista, a tendência da maioria é seguir o politicamente correto e dizer que não o é. Mesmo assim, sempre há uma média de 10% da população que assume posição frente a temas como racismo, homofobia e machismo. Normalmente, nos casos assumidos de comportamento racista, também há tendência de assumir a homofobia e o machismo. É um comportamento sistêmico! 

Fazer uma pergunta objetiva é apenas a primeira jornada de uma pesquisa de opinião. No caso da PESB, avançamos muito! Utilizamos fotos de homens brancos, pardos e negros e pedimos para o entrevistado avaliar, com base no seu juízo de valor, a sua percepção sobre as oito fotos que eram mostradas (todos de homens com a mesma roupa/camisa social azul e cabelo arrumado com o mesmo padrão), com perguntas que refletiam o cotidiano:

Gostaria que o(a) Sr.(a) dissesse qual deles parece ter mais estudo? 

Qual destes parece ser o que dá mais "jeitinho"?

Na sua opinião, qual dessas pessoas parece ser um advogado?

E qual parece ser um professor de escola de segundo grau?

Qual dessas pessoas parece ser um porteiro? 

E qual parece ser um lixeiro/ varredor de rua? 

Qual dessas pessoas parece ser um carregador? 

E um engraxate? 

Qual dessas pessoas parece ter menos chances, menos oportunidades na vida? 

Qual parece ser a mais preguiçosa? 

Qual deles parece ser um criminoso? 

E qual parece ser o mais pobre? 

E qual parece ser um malandro? 

E qual deles parece ser a pessoa mais honesta?

E qual deles parece ter modos mais educados? 

E qual parece ser o mais inteligente? 

Os resultados da pesquisa indicaram que os negros foram mais associados a atividades mais operacionais como lixeiro, carregador e engraxate ou classificados como pessoas mais malandras, pobres e com menos oportunidades.

O racismo estrutural é isso, é um conjunto de práticas, de julgamentos que temos no dia a dia a partir da nossa percepção. E essa percepção tem sido construída pela história, pelas práticas culturais e até mesmo pelas instituições e seus agentes públicos.

Para enfrentarmos esse tema precisamos percorrer um longo caminho, que começa com a nossa avaliação interna. Imagine você respondendo essas perguntas e olhando fotos de homens brancos, pardos e negros? Qual seria a sua percepção? 

O segundo passo é o debate, é a reflexão crítica sobre o tema para se adentrar ao terceiro grande debate, um processo de educação que descortine realmente o preconceito enraizado na sociedade brasileira. E a educação pode ajudar a enfrentar o grande desafio, que é a diminuição da desigualdade social.

A síntese dessa pesquisa está exposta no livro "A Cabeça do Brasileiro" do cientista político Alberto Carlos Almeida.

 

Autor
Elis Radmann é cientista social e política. Fundou o IPO - Instituto Pesquisas de Opinião em 1996 e tem a ciência como vocação e formação. Socióloga (MTB 721), obteve o Bacharel em Ciências Sociais na Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e tem especialização em Ciência Política pela mesma instituição. Mestre em Ciência Política pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), Elis é conselheira da Associação Brasileira de Pesquisadores de Mercado, Opinião e Mídia (ASBPM) e Conselheira de Desburocratização e Empreendedorismo no Governo do Rio Grande do Sul. Coordenou a execução da pesquisa EPICOVID-19 no Estado. Tem coluna publicada semanalmente em vários portais de notícias e jornais do RS. E-mail para contato: [email protected]

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