Os avatares de Borges

Por José Antônio Moraes de Oliveira

"Saxões, árabes, godos, foram eles que, sem saber,

me engendraram...sou estas coisas e muitas outras.

Ou são chaves secretas e árduas álgebras 

das quais nunca saberemos?"

Jorge Luis Borges.


O jornalista portenho Jorge Monteleone se diz um estudioso da vida e obra de Jorge Luis Borges. Escreve para revistas e suplementos literários sobre os encontros que manteve com o escritor, no endereço da Calle Maipú, 994. Afirma que, de tudo o que viu e ouviu, o que mais o deixou fascinado foram os talismãs - ou avatares - do universo borgiano. Reais ou imaginários, são verdadeiros enigmas a desafiar interpretação.

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Os críticos que estudaram a obra de Jorge Luis Borges são enfáticos ao dizer que ele foi um homem totalmente metafórico em pleno século XIX, se dedicando a fazer poesia em vez de tentar interpretar a realidade. Em 1969, ele escreve em Elogio da Sombra que sua obra abordaria apenas cinco temas:

Espelhos, Labirintos, Espadas, Velhice, Ética.

Ao longo da vida, Borges permaneceu fiel ao compromisso, não se deixando seduzir por Hegel, Marx e Sigmund Freud. Dizia que a única literatura que o emocionava havia sido escrita 100 anos antes. E enquanto a visão permitiu, lia Virgilio, Dante Alighieri, Miguel de Cervantes, Schiller e Carlyle. 

O jornalista anotou escrupulosamente as menções e referências aos talismãs e signos adotados por Borges e que inspiraram poemas e contos. No entanto, por mais que tentasse, Jorge Monteleone nunca explicou se eram avatares reais ou frutos de uma obsessão pela presença da memória. Em uma ocasião, Borges quase revelou a natureza de seus míticos objetos, com uma vaga pista de onde poderiam estar: 

" - Certamente são meus talismãs, mas que de nada servem 

para os outros, nem deveria mencioná-los."

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Recentemente, Jorge Monteleone, em entrevista para El País, declarou  ser tarefa impossível descrever os talismãs borgeanos. Mesmo assim, publicou sua lista:

A espada desembainhada por Saladino na conquista de Jerusalém.

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Uma cuia de mate com um suporte de 3 serpentes de prata, sada pelo bisavô de Borges.

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O daguerrotipo do dia em que Buenos Aires foi fundada.

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A bengala com castão de cavalo de prata, que andou nas montanhas da Patagônia e pelos pampas da Argentina.

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Cópia da sentença da Santa Inquisição de 22 de junho de 1633 que sentenciou Galileo Galilei.

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O texto original do libelo anti-Machiavelli escrito por Diego de Saavedra Fajardo em 1640.

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As três páginas manuscritas que Ray Bradbury escreveu como prólogo das Crônicas Marcianas. 

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As chaves de Granada entregues por Boadill, aos Reis Católicos Fernando e Isabel em 2 de janeiro de 1492

          
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A memória de uma manhã de 1921, quando os Borges desembarcaram no porto de Buenos Aires, vindo da Espanha.

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Um velho caderno de notas esquecido no Café Tortoni, com versos de Rainer Maria Rilke.

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Autor
José Antônio Moraes de Oliveira é formado em Jornalismo e Filosofia e tem passagens pelo Jornal A Hora, Jornal do Comércio e Correio do Povo. Trocou o Jornalismo pela Publicidade para produzir anúncios na MPM Propaganda para Ipiranga de Petróleo, Lojas Renner, Embratur e American Airlines. Foi também diretor de Comunicação do Grupo Iochpe e cofundador do CENP, que estabeleceu normas-padrão para as agências de Publicidade. Escreveu o livro 'Entre Dois Verões', com crônicas sobre sua infância e adolescência na fazenda dos avós e na Porto Alegre dos velhos tempos. E-mail para contato: [email protected]

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