Por mim, pela minha filha, por todos e todas

Por Márcia Martins

Na sexta-feira passada, no início da tarde, ao retornar de um procedimento hospitalar rotineiro, teve início uma batalha familiar em que o Coronavírus era o protagonista e eu, uma mera coadjuvante. Eu na resistência. E o tal corona na persistência. Tudo porque a minha filha Gabriela, que é um ser muito inteligente, com acesso constante às informações, passou a me falar, num misto de preocupação e pânico, dos riscos que eu corria ao me expor em eventos, reuniões, transporte público, ruas e parques. Com mil compromissos na agenda marcados, 7ª Conferência Municipal de Políticas para as Mulheres para pensar, passeios com o cusco e outras tarefas a serem feitas, não queria ter que me isolar dentro de casa para fugir dos males do vírus.

Eu, logo ali, quase assoprando 60 velinhas no bolo de aniversário, e portadora de uma doença autoimune, enquadro-me sem dúvida, no grupo de risco, em que uma vez que o vírus se manifeste, apresenta uma chance superior de gravidade da doença e uma letalidade maior. Apesar de ter conhecimento da situação acima e de ler as notícias sobre o avanço do Coronavírus no Brasil e no mundo, ainda marquei presença em um evento de poetas no sábado à tardinha. E, no resto do final de semana, mais por falta de opções do que por consciência, fiquei enfurnada no apartamento. Acompanhando as informações sobre o Covid19, recebendo mensagens de whats da filha e ouvindo Elis Regina, Maria Rita e Chico Buarque.

Até que o medo do Coronavírus, da rapidez do contágio, dos primeiros casos registrados em Porto Alegre e de uma orientação médica no meio da tarde de segunda-feira exigiram uma mudança radical na minha postura e no meu comportamento em relação à pandemia. O doutor que me acompanha desde 2016 no tratamento da doença crônica foi taxativo, na consulta que já estava marcada há 30 dias, e aconselhou um certo isolamento imediato. Segundo ele, eu deveria já ter me afastado, desde o início da outra semana, de reuniões, aglomerações, locais com multidão, ônibus e demais transportes. Aliás, no local onde ele atende, no Instituto do Aparelho Digestivo (IAD), os cuidados com a prevenção estavam visíveis e muito bem controlados.

Então, desde a tarde de segunda-feira, atendendo conselhos da minha filha, orientação do médico gastroenterologista e a recomendação da Organização Mundial da Saúde, pratico o distanciamento e/ou isolamento social. Só sair de casa em caso de extrema necessidade e urgência. Como sou aposentada, não preciso sair para trabalhar. Tenho alguns textos para corrigir, mas isto é feito home office. Reuniões no Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado suspensas, do qual integro a diretoria, suspensas, pelo menos até o início de abril. Assuntos do Conselho Municipal dos Direitos da Mulher (COMDIM/POA) podem ser resolvidos virtualmente e o cusco Quincas Fernando teve a guarda compartilhada transferida para a filha Gabriela. 

Já fui ao supermercado para comprar os itens necessários para um período de uns 15 dias. Nada de supérfluo. Nada de estocar comida e deixar os outros sem chances de abastecer os seus armários. Separei alguns livros que precisam ser lidos. Fiz a lista dos DVDs que devem ter prioridade na minha audição. E os remédios para os dias iniciais da reclusão também já foram encomendados. Pelo menos, até o final da próxima semana, estarei enclausurada. Fechada dentro do apartamento. Sem colocar a pontinha do nariz para fora das janelas. Prometo que vou seguir as orientações para a minha saúde. Não vou descuidar da higiene elementar.

Espero realmente que não tenha adotado a prevenção tardiamente. Por mim, pela minha filha, por todos e todas. Desejo que tenham consciência e não lotem os carrinhos do supermercado como se o mundo fosse acabar amanhã. Que só saiam para o estritamente inadiável. Que não corram para os hospitais se não houver necessidade. E faço votos que a pandemia tenha uma duração mais curta do que as notícias anunciam. 

 

Autor
Márcia Fernanda Peçanha Martins é jornalista, formada pela Escola de Comunicação, Artes e Design (Famecos) da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), militante de movimentos sociais e feminista. Trabalhou no Jornal do Comércio, onde iniciou sua carreira profissional, e teve passagens por Zero Hora, Correio do Povo, na reportagem das editorias de Economia e Geral, e em assessorias de Comunicação Social empresariais e governamentais. Escritora, com poesias publicadas em diversas antologias, ex-diretora do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio Grande do Sul (Sindjors) e presidenta do Conselho Municipal dos Direitos da Mulher de Porto Alegre (COMDIM/POA) na gestão 2019/2021. E-mail para contato: [email protected]

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