Por que a democracia está sendo questionada?

Durante a greve dos caminhoneiros, observou-se placas nas ruas, postagens nas redes sociais e até mesmo manifestações na frente de quarteis pedindo uma intervenção militar. Os manifestantes esclareciam que o pedido de intervenção militar não estaria associado a um regime ditatorial. Desejavam por uma intervenção que assumisse o governo federal até o próximo pleito.

Pesquisa de opinião realizada pelo IPO - Instituto Pesquisas de Opinião antes da greve dos caminhoneiros indicou que a maioria dos gaúchos prefere a democracia em detrimento da ditadura.

Para uma amostra de 1.500 gaúchos, distribuída de forma representativa nas sete mesorregiões do Estado, realizou-se o seguinte questionamento: "Pensando no debate entre democracia (governo de muitos) e ditadura (governo de um) é melhor para o Brasil... (%)"

- 69,3% se manter na democracia;

- 22,9% ter uma ditadura;

- 7,8% não sabem avaliar.

A preferência por democracia aumenta conforme aumenta o nível de informação e de renda dos entrevistados. Ao contrário, quanto menor a educação formal e a renda familiar, maior é a adesão à ditadura.

A maior parte do percentual de opinião favorável pela ditadura quanto aos pedidos de intervenção militar não estão associados a uma ideologia. Esta opinião surge de percepções, anseios ou até mesmo por mazelas sofridas. Há entrevistados que constroem a sua convicção a partir de um argumento e outros que relacionam mais de um dos argumentos abaixo:

1º) Descrença em relação ao funcionamento do Estado e falta de confiança nas instituições. As pessoas de menor renda são aquelas que necessitam mais de políticas públicas e, em muitos casos, também não conhecem ou usufruem de seus direitos;

2º) Falta de lideranças. A maior parte está insatisfeita, na mesma proporção, com o Presidente da República e com o Congresso (Deputados e Senadores). Está insatisfação fomenta a percepção de que os atuais representantes do povo não estão a serviço do povo.

3º) Aumento da sensação de insegurança. Ao perceber que a ampliação da violência não é acompanhada de uma resposta adequada do Estado a população passa a questionar o atual status quo e, parte do pressuposto, de que um governo militar seria mais eficiente.

4º) Preocupação com a corrupção. Uma parcela de quem defende a ditadura acredita que "não há mais moralidade nos políticos" e que o País precisa de seriedade e transparência com o interesse público a fim de combater o interesse pessoal e a corrupção.

5º) Os que acreditam na ideologia totalitária. É o menor grupo e se destaca pela crença de que deva haver regulação de todos os espaços da vida pública.

Compreender os motivos de quem acredita na ditadura ou na intervenção militar é vital para que haja sensibilidade democrática. É fundamental que aflore uma crítica construtiva em relação à democracia representativa que temos e a democracia representativa que deveríamos ter. Quem defende a ditadura ou a intervenção militar o faz porque acredita na liberdade de expressão.

Dizer para estas pessoas que é ilegal ser a favor da ditadura é um argumento autoritário baseado em um estado de direito que não cumpre o seu papel, ameaça e pune os descontentes com os rigores da lei.

A maior parte destas pessoas não nega a democracia, mas quer um caminho, quer uma luz no fim do túnel. Quer que haja líderes que cumpram o prometido, que tenham políticas públicas eficientes contra a violência e que defendam o bem comum, em especial, os menos favorecidos.

Autor
Elis Radmann é cientista social e política. Fundou o IPO - Instituto Pesquisas de Opinião em 1996 e tem a ciência como vocação e formação. Socióloga (MTB 721), obteve o Bacharel em Ciências Sociais na Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e tem especialização em Ciência Política pela mesma instituição. Mestre em Ciência Política pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), Elis é conselheira da Associação Brasileira de Pesquisadores de Mercado, Opinião e Mídia (ASBPM) e Conselheira de Desburocratização e Empreendedorismo no Governo do Rio Grande do Sul. Coordenou a execução da pesquisa EPICOVID-19 no Estado. Tem coluna publicada semanalmente em vários portais de notícias e jornais do RS. E-mail para contato: [email protected]

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