Sessão nostalgia

Por Flávio Dutra


Mexer com a memória afetiva das pessoas sempre garante resultados positivos para quem tem presença nas redes sociais ou espaços de comentários a serem preenchidos com regularidade. Faço essa constatação cada vez que relaciono alguma situação do passado com um fato do presente, como na coluna da semana retrasada. Isso sempre favorece a interatividade com os leitores.

Relembrando, citei alguns estabelecimentos comerciais e produtos muito anunciados nos anos 1960 e 70, em Porto Alegre, como a Casa Reinaldo, "a maluquinha da Praça do Portão", os bordões do chá Coscarque ("essa usa coscarque", "essa não usa coscarque") e o anúncio do Run Creosotado nos bondes, campanhas publicitárias que nunca ganharam prêmios internacionais, mas ficaram guardadas na memória de quem viveu aquela época. Em comparação, estabelecendo a relação com o presente, registrei o vexame da agência DM9, uma das mais importantes do país, tendo que devolver os leões conquistados em Cannes por falsificações em suas campanhas.

O passado sempre vai levar vantagem sobre o presente nesses cortejos. O distanciamento histórico cria a memória afetiva, mas não a isenção sobre o ocorrido e é responsável por frases do tipo "no meu tempo era muito melhor", tantas vezes pronunciadas, sem necessidade de comprovação. Mesmo os acontecimentos negativos são, muitas vezes, minimizados nas lembranças porque acabam virando folclore.

Na verdade, queria falar das contribuições que recebi pela coluna nostálgica, mas como jornalista que se preza, não resisti a fazer uma tese. Por isso, trato de resgatar agora a lembrança recebida sobre a Casa Catraca e sua chamada: "esses rapazes da Casa Catraca tem cada uma".  A Casa Catraca ainda funciona ali na Azenha, vendendo bicicletas, peças para os equipamentos e garantindo assistência técnica para carrinhos de bebê. Outra contribuição: "Se não encontrar no Armazém Riograndense não precisa procurar".  O Armazém Riograndense só vendia gostosuras de qualidade, muitos produtos importados e no Natal fazia a alegria da criançada com o famoso Papai Noel que batia com a varinha no vidro da vitrine. O estabelecimento na av. Otávio Rocha veio abaixo por inteiro no incêndio das Lojas Renner, da qual era vizinho, em 1976. 

Tinha também a Botinha da Zona, nome sugerido por moradores e frequentadores da Azenha, onde se localizava a loja, que ostentava na entrada um par de botinhas de gaita. Ponto de referência no bairro, fechou as portas em 2019, depois de mais de 100 anos atendendo seu fiel público. Com esse nome, a Botinha da Zona até dispensava slogans marqueteiros. 

Recebi sugestões também sobre as chamadas das emissoras de rádio em tempos passados, normalmente pronunciadas com voz impostada pelos locutores, tipo "Noite e dia, a Metrópole irradia". Mas fica para outra coluna, porque esta já está com cheiro de naftalina.

 

Autor
Flávio Dutra, porto-alegrense desde 1950, é formado em Comunicação Social pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), com especialização em Jornalismo Empresarial e Comunicação Digital. Em mais de 40 anos de carreira, atuou nos principais jornais e veículos eletrônicos do Rio Grande do Sul e em campanhas políticas. Coordenou coberturas jornalísticas nacionais e internacionais, especialmente na área esportiva, da qual participou por mais de 25 anos. Presidiu a Fundação Cultural Piratini (TVE e FM Cultura), foi secretário de Comunicação do Governo do Estado e da Prefeitura de Porto Alegre, superintendente de Comunicação e Cultura da Assembleia Legislativa do RS e assessor no Senado. Autor dos livros 'Crônicas da Mesa ao Lado', 'A Maldição de Eros e outras histórias', 'Quando eu Fiz 69' e 'Agora Já Posso Revelar', integrou a coletânea 'DezMiolados' e 'Todos Por Um' e foi coautor com Indaiá Dillenburg de 'Dueto - a dois é sempre melhor', de 'Confraria 1523 - uma história de parceria e bom humor' e de 'G.E.Tupi - sonhos de guri e outras histórias de Petrópolis'. E-mail para contato: [email protected]

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