Um Dia das Mães diferente pela vida de todos e todas

Por Márcia Martins

No domingo, 10 de maio, é comemorado o Dia das Mães no Brasil. Se eu não estiver errada - isto é uma informação que eu trago do meu tempo de repórter de economia - é a segunda data comemorativa mais importante do ano para o comércio, perdendo apenas para o Natal em volume de vendas. Desculpe aí seu lojista. Perdão seu grande ou pequeno empresário. Não leve a mal seu comerciante. Mas em 2020, pelo menos, esta fama do Dia das Mães de movimento de negócios poderá ser arranhada. Embora eu adore ser presenteada (quem não?), já deixei claro para a minha filha Gabriela: "sem preocupação com presente, não saia, fique em casa".

A minha filha, tenho quase certeza, me conhece muito bem. Porque eu sempre fui transparente em relação aos meus sentimentos com ela. Arrisco que Gabriela, assim como eu com ela, sabe exatamente se aconteceu algo ou se estou incomodada apenas pelo meu tom de voz. Mesmo que seja pelo telefone, sem analisar a fisionomia. Da mesma forma, isto é, pela minha opção de ser sempre muito sincera com ela, a minha filha tem a consciência do quanto eu prezo e dou importância para determinadas datas. Principalmente o Dia das Mães, pelo imenso orgulho que tenho de ver a filha que gerei e pela felicidade que me domina desde 6 de dezembro de 1994, quando ela nasceu.

Entretanto, na noite de terça-feira, na nossa conversa rotineira pelo telefone, ela falou que iria me dar um presente depois, quando tudo isto acabasse, ou não tivesse tanto perigo de contaminação ou quando a transmissão do Covid19 não estivesse elevada. E é claro que adoro presente. Gostaria sim de ganhar um mimo no domingo. Adoraria ver um pacotinho embrulhado nas minhas mãos. E teria muitas opções de presentes que necessito nos mais variados valores, acessíveis para todos os bolsos. E o que disse para a Gabriela foi que ela não se preocupasse com o presente, que eu não queria, que eu dispensava. O que eu desejaria mesmo é vê-la nem que fosse pela janela.

Explico. Desde o dia 16 de março, quando tive a consulta com o médico que trata a minha doença crônica, optei (no início a decisão não foi tão fácil, não posso mentir) em manter-me no isolamento. Sai umas 2 ou 3 vezes, para compromissos que eu não podia repassar a outros. E fui para a rua toda cuidada. Mascarada. Afastando-me de qualquer pessoa que não estivesse de máscara. No retorno para casa, uma verdadeira operação limpeza. Desde então, vi a Gabriela umas 4 ou 5 vezes. De longe. Sem tocar. Quando ela veio buscar o nosso cachorro Quincas (que está na casa dela), ou esteve aqui para deixar as compras do supermercado ou entregar meus remédios da farmácia.

A vontade que eu tive, nestas ocasiões, foi dar um abraço apertado, me enrolar no seu pescoço, encher o rosto mais lindo deste mundo de beijos e até, conforme o tempo que ele tivesse, mexer carinhosamente nos seus cabelos. Não foi possível. Apesar de estar tomando os cuidados necessários recomendados pelo OMS, Gabriela se expõe mais, uma vez que não se enquadra no grupo de risco. E qualquer contato comigo pode sim representar um perigo. Então, evitamos o toque, o abraço, o beijo, o afago, o carinho efetivo. Ela se limita a pegar meu cartão bancário pela grade da porta do apartamento e deposita as sacolas de compras no mesmo lugar. Sem aproximação maior.

Assim, neste domingo, o que eu mais quero é poder ver a minha filha uns cinco minutos. Pode ser pela janela do apartamento. Se o tempo cooperar. Até podemos conversar um pouco como vizinhas de rua. Já estou naquele ponto em que o papo pelo telefone está ficando insuficiente. Mas preciso resistir. E se chover (vou rezar para todos os santos que isto não ocorra) teremos que nos satisfazer com a chamada de vídeo pelo whats. E eu vou aguentar. Serei forte por mais alguns dias. Permanecerei no confinamento por mais alguns dias. Obedecerei aos cuidados necessários por mais alguns dias. Talvez até final de maio. Talvez até final de junho. Não se sabe.

Porque eu quero abraçar muito a minha filha quando isto passar. Porque eu quero sim beijar a minha menina (ok, ela cresceu) quando isto passar. Porque eu desejo muito levar o meu cão para passear no cachorródromo quando isto passar. Porque eu quero viver muito ainda quando isto passar. E, por isto, é preciso cooperar e agir como uma cidadã consciente. Pela minha vida, pela vida da minha vida, pela vida de todos e todas.

Autor
Márcia Fernanda Peçanha Martins é jornalista, formada pela Escola de Comunicação, Artes e Design (Famecos) da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), militante de movimentos sociais e feminista. Trabalhou no Jornal do Comércio, onde iniciou sua carreira profissional, e teve passagens por Zero Hora, Correio do Povo, na reportagem das editorias de Economia e Geral, e em assessorias de Comunicação Social empresariais e governamentais. Escritora, com poesias publicadas em diversas antologias, ex-diretora do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio Grande do Sul (Sindjors) e presidenta do Conselho Municipal dos Direitos da Mulher de Porto Alegre (COMDIM/POA) na gestão 2019/2021. E-mail para contato: [email protected]

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