Cerveja, muita bunda e pouco cérebro

É criativa e oportuna a propaganda que entrou no ar da cerveja Polar. Dois jovens atores do Rio Grande do Sul insistem que, apesar …

24/06/2003 00:00
É criativa e oportuna a propaganda que entrou no ar da cerveja Polar. Dois jovens atores do Rio Grande do Sul insistem que, apesar do nome da cerveja(Polar Export), ela não deve ser exportada. Tanto assim que eles escrevem, onde está "Export", um "No" na frente, deixando-a "Polar No Export". Pelo menos é uma novidade em termos de propaganda de cerveja. Nada contra belas mulheres e suas bundas, mas do ponto de vista de comunicação e aumento de consumo, não estava funcionando. Dados do Sindicerv(Sindicato Nacional da Indústria da Cerveja) indicam uma queda de consumo per capita no Brasil de 2,2% no ano passado. Queda de consumo sempre é resultado de um conjunto de fatores, não somente de um. Mas certamente a propaganda pouco criativa das cervejas está colaborando para não aumentar o consumo, pelo menos. Outra questão importante é a visão machista dos comerciais de cerveja, que sempre colocam a mulher como um exemplar a ser contemplado e, de preferência, comido. Os fabricantes estão certos em um aspecto, que é o de que grande parte de seus consumidores de fato são homens. Porém, "está na hora de rever seus conceitos", como diria a Fiat. As mulheres estão cada vez mais invadindo espaços anteriormente exclusivos dos homens e não será surpreendente se, daqui a alguns anos, tomarem a frente no consumo de cerveja também. Assim, insistir no mesmo discurso pode representar um risco futuro. No que se refere a isto, inclusive, já há protestos de mulheres que não estão mais tolerando serem vistas como iscas de homens nos comerciais de cerveja(sobre este tema, ver uma série de artigos do Meio & Mensagem On Line em www.mmonline.com.br/mmonline/jsp/Navega.jsp?pIdConteudo=39928) Mas voltando ao tema inicial desta coluna, achei extremamente inteligente e criativa a propaganda da Polar. Muda o discurso, é bem humorada. Chega a ser bairrista, com o "No Export", onde os atores dizem que não querem exportar a cerveja, só a querem para eles. E ela tem sotaque regional forte. Em tempos de tanta globalização, um pouco de bairrismo pega bem. Sem xenofobia. Fator igualmente importante na propaganda é ter escolhido duas revelações de atores gaúchos para fazer o comercial. A cerveja Polar é um ícone gaúcho, essencialmente. É uma cerveja que tem forte vinculação com o Rio Grande do Sul, não sendo tão consumida em outros estados. Além disso, as empresas vêm optando por uma comunicação global, em que o mesmo comercial é veiculado em Porto Alegre, Tóquio e Paris, sem alterações. Sempre combati este fato, tendo em vista que desvincula a empresa da cidade em que ela atua. Já se foi o tempo em que ser uma companhia global era um grande diferencial competitivo. Hoje, este fato está comoditizado. Assim, insistir nesta forma de comunicação não representa nenhum ganho, a não ser o de economia de escala na produção dos comerciais. Na realidade, as empresas vêm optando por concentrar não apenas sua comunicação, mas suas operações. Isto, em que pese toda a grande economia que fazem, é um erro. Quer coisa mais desagradável do que ligar para um 0800 e ser atendido em outro estado? Criar vínculo com a comunidade na qual a empresa está inserida é o caminho mais curto para aumentar market share. Projetos socialmente e ambientalmente responsáveis comprovam o que digo. As empresas começaram a investir neste tipo de projeto para mostrar seu comprometimento com as comunidades nas quais estavam inseridas e, por conseqüência, aumentar o consumo de seus produtos. Assim, menos bundas e mais cérebros caem bem. ( fla.paiva@portoweb.com.br)