Rafael Guimaraens: Jornalista-livreiro

Filho de jornalista e neto de poeta, ele seguiu a profissão do pai e hoje se dedica a projetos literários, como o avô.

Aos 50 anos de idade, o jornalista Rafael Guimaraens se dedica hoje a projetos literários. Não apenas os seus, mas os da família toda. Casado com a designer Clô Barcellos, ele administra, junto com ela, a Libretos Design Editorial, pela qual já publicou quatro livros de sua autoria, uma coletânea do avô e outra do pai. "Meu nome completo é Carlos Rafael Guimaraens Filho, portanto, meu pai também se chamava Carlos Rafael Guimaraens, e também era jornalista. Ele é falecido e a gente vai lançar agora uma coletânea de crônicas dele, que trabalhava no Correio do Povo, "Morcego em Paris"", anuncia. Do avô Eduardo Guimaraens, foi editado "Dispersos": "Ele era um grande poeta simbolista do início do século XX, muito reconhecido, contribuía bastante com a imprensa, mas só tinha um livro lançado, "A Divina Quimera". Por isso fizemos este livro aqui, que traz originais dele", conta.


A escolha de Rafael pelo Jornalismo parece ter sido um processo natural, influenciado pelo nome e pelos genes. Entre cinco irmãos, apenas dois seguiram a profissão do pai, o outro foi Eduardo Guimaraens, portanto homônimo do avô. "Tive influência do meu pai, claro. Desde pequenos, nós íamos lá na redação do Correio do Povo para visitá-lo, e convivíamos com os amigos dele. Mas só eu, que sou o segundo filho, e o mais velho - o Dudu, que agora está morando em São Paulo - seguimos a profissão", diz. Do curso Clássico foi direto para a Famecos (Faculdade dos Meios de Comunicação Social da PUC). Era 1975, a ditadura militar estava em seu auge e Rafael não apenas se envolveu com o centro acadêmico - do qual chegou a ser presidente - como começou a trabalhar na Cooperativa dos Jornalistas de Porto Alegre, que editava o Coojornal.


Na prisão com os mestres


No início, não se meteu em encrencas, já que começou na Coojornal como arquivista: "Os repórteres me pediam materiais e recortes, e eu ficava os vendo trabalhar, participava das reuniões", rememora. "Ali que comecei a aprender o que era Jornalismo, com os meus mestres, os meus colegas Osmar Trindade, Elmar Bones da Costa, [José Antônio] Vieira da Cunha, André Pereira, Airton Kanitz, Marcelo Lopes, Caco Schmitt? Embora a faculdade fosse uma das melhores do Brasil, meu aprendizado prático foi na Coojornal", avalia.


No ano seguinte, já atuava como repórter e, em 1980, chegaram à redação documentos secretos do Exército: relatórios sobre o enfrentamento da guerrilha no Vale da Ribeira, em São Paulo , e sobre o cerco e a morte do capitão Carlos Lamarca. A publicação desses documentos gerou um processo militar contra os jornalistas envolvidos na matéria: Rafael, Trindade, Elmar e Rosvita Saueressig. Condenados a seis meses, os profissionais passaram por breves prisões - todos ficaram no Presídio Feminino Madre Peletier -, mas a sentença acabou prescrevendo.


Durante a prisão dos jornalistas, a Cooperativa, que já enfrentava dificuldades financeiras, passou por um desgaste muito grande, que, mais adiante, contribuiu para levar ao seu fim e, conseqüentemente, provocar o desemprego de muitos de seus colaboradores, caso de Rafael. "Embora eu já fosse conhecido, a prisão tornou as coisas mais difíceis. O Trindade teve que sair do país, foi para Moçambique, pois não conseguia trabalho. Eu ainda fazia uns free-lances", relata. Após um tempo, passou a atuar na assessoria de imprensa da Câmara Municipal, até o surgimento do Diário do Sul, em 1986. Tratava-se de um projeto de jornal diário, mas com características de revista, tocado por Hélio Gama e que tinha Paulo Fogaça entre seus editores. "As matérias tinham um cuidado com a contextualização e a pesquisa, o que dava um trabalho danado, mas ali se formou uma geração marcante de jornalistas: Ricardo Stefanelli, Sílvio Ferreira, Sérgio Xavier Filho, Cida Golim, Luciano Peres, Renato Hoffmann, Humberto Trezzi, Iotti e vários outros, junto com nomes experientes como Carlos Urbim, Humberto Andreatta, Vera Spolidoro, Edgar Vasques, Roberto D"Azevedo, Delmo Moreira? Foram apenas dois anos, mas dois anos muito intensos. Um dia, eu saí para fazer uma matéria e quando voltei o jornal tinha fechado", diz, nostálgico.


Oportunidades únicas


Logo surgiu uma oportunidade de trabalho na Rede Globo, no Rio de Janeiro, como chefe de Produção do Jornal Nacional. Rafael chegou a ir até a cidade, mas acabou desistindo do trabalho, pois não queria deixar Porto Alegre, sua cidade natal. Optou por atuar na Prefeitura, para a qual Olívio Dutra fora eleito em 1988. A vaga na emissora foi ocupada pelo jovem jornalista gaúcho Carlos Henrique Schröder, que hoje, por ironia, é o diretor da Central Globo de Jornalismo. "É possível que se eu tivesse aceitado, não chegasse ao cargo onde ele está, mas ele está lá porque eu recusei a vaga, dependia de eu aceitar ou não", divaga, com um sorriso contido de quem sabe a oportunidade que rejeitou. Rafael deixou a administração municipal para trabalhar na sucursal do Estadão. Pediu as contas, tirou uns dias de folga e, quando retornou, a filial havia sido reduzida a dois jornalistas. "Foi uma pena. Era minha última chance de atuar em jornal", acredita.


Retornou à Prefeitura. Nos anos seguintes, atuou na Assembléia Legislativa e no Governo do Estado, com Olívio Dutra e Flávio Koutzii. Ultimamente, atuava na Agência de Notícias da AL, até se decidir pelos projetos prórpios. "É que de uns oito anos para cá, comecei a fazer minhas próprias coisas, que são os livros e, agora, os roteiros para a televisão", explica.


Projetos independentes


Sua primeira obra é o infantil "O livrão e o jornalzinho", uma história que costumava contar para sua filha, a engenheira de materiais Elisa, 23 anos, fruto de seu primeiro casamento, que hoje cursa doutorado na Alemanha. Rafael está em sua terceira união, e foi Clô - que conheceu na faculdade e começou a namorar em 1996 - quem o incentivou a publicar o texto. "Isso me animou muito, porque eu sempre tive vontade de escrever", conta. Também lançou "Porto Alegre - Agôsto 61" , "Trem de Volta - Teatro de Equipe" (em parceria com Mario de Almeida) e o badalado "Tragédia da Rua da Praia", que deu origem a dois episódios da série Histórias Extraordinárias, da RBS TV, roteirizados pelo próprio autor. Também é dele o roteiro sobre Alexandre Baguet, para a série Viajantes, da mesma emissora.


Rafael mata a saudade de Elisa conversando pelo Skype e já planeja uma viagem para visitá-la no meio do ano. Clô tem duas filhas, que vivem com o casal, no bairro Menino Deus: as estudantes Lenora, de Administração, e Paula, que cursa o Ensino Médio. Nos momentos de folga, a família costuma ir ao cinema, caminhar no Parque Marinha do Brasil e jogar tênis. O jornalista conta que está tentando retomar o hábito de ler por prazer, já que suas leituras têm sido mais de pesquisas sobre seus projetos. Ele também gosta de cozinhar, mas só quando tem vontade: "Dá uma boa espairecida, é anti-estresse total".

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