Liana Milanez: Boa filha à casa torna

Tudo começou em 1971, quando, aos 22 anos de idade, a gaúcha Liana Milanez, na época estudante de jornalismo, foi para Salvador só para …

Tudo começou em 1971, quando, aos 22 anos de idade, a gaúcha Liana Milanez, na época estudante de jornalismo, foi para Salvador só para participar de um congresso - e não quis voltar mais. Conseguiu um emprego de produtora na TV Aratu e foi ficando. Não chegou a viver um ano lá, mas já foi o suficiente para ganhar na volta o apelido de Baiana, que carrega há mais de 30 anos. "Cheguei aqui com um jeito riponga, cheia de colares, queimada de sol, com fala arrastada", recorda. As três décadas de profissionalismo lhe renderam um extenso currículo, com experiências nas mais diversas áreas do jornalismo e alguns prêmios, aos quais sempre dá o devido mérito do trabalho realizado pela equipe. Com simpatia de baiana e determinação de gaúcha, Liana é movida a desafios e confessa que ficou muito surpresa com o convite para ser presidente da TVE, recebido no dia 30 de dezembro. Com trabalho, estudos e família totalmente estabelecidos em São Paulo, Liana planejava ficar pelo menos mais quatro anos na capital paulista, e levou alguns dias para, tal qual noiva, responder sim à proposta.
Do Rio Grande do Sul para o Brasil
Desde a experiência na Bahia, que ficou marcada para sempre, a televisão e o rádio sempre pontuaram a vida de Liana. De volta a Porto Alegre, retomou o curso de jornalismo na Ufrgs e continuou a trabalhar em televisão - primeiro na Difusora, depois na Gaúcha. Dali, foi para a rádio Guaíba, onde foi produtora durante quase dez anos. Em 1985, tornou-se chefe do setor de jornalismo da sucursal gaúcha da Empresa Brasileira de Notícias (EBN) que, com o fim da ditadura e o estabelecimento da Nova República, assumira a proposta de ser uma grande agência a atuar sob os mandamentos da liberdade de imprensa. Seu extenso currículo registra depois passagens pela sucursal da revista Veja e pela editoria de projetos especiais do jornal Diário do Sul, onde realizou trabalhos que lhe renderam vários prêmios. Com o fechamento do Diário, em 1988, aceitou o convite para estruturar e colocar no ar a rádio FM Cultura em apenas três meses, o que considera seu maior desafio - até agora. Mesmo tendo sido formada na era pré-informática, relembra com prazer que seu debut na tecnologia foi um sucesso. Foi na Agência Estado, em São Paulo, onde coordenou a implantação da letter News Paper, um resumo dos principais jornais do país. Após o lançamento nacional do novo produto, que abocanhou um Prêmio Esso, Liana tornou-se editora-executiva da Agência Estado. Na experiência seguinte, mais uma estréia, desta vez em assessoria de imprensa. Foram três anos fazendo comunicação estratégica para grandes clientes na Impress, CDN e FSB. "Eu relutava em trabalhar nesta área, mas convivendo com grandes empresas como Brahma, Motorola, IBM e Ernst&Young, aprendi muito sobre estrutura empresarial e formas de gerenciamento." Liana gosta mesmo de desafios e de desenvolver projetos, disso ninguém que a conhece tem dúvidas. Relata com entusiasmo "causos" de quando foi chefe de reportagem da Rádio Jovem Pan/SP, coordenando grandes estruturas de coberturas que ficaram na memória, como a chegada do corpo de Ayrton Senna ao Brasil e o acidente com o avião da TAM que deixou 99 mortos. Consegue tirar lições até mesmo das experiências de crise, como a que viveu quando chefiou uma equipe de mais de 60 jornalistas no portal jornalístico super11.net, que sucumbiu à crise. E, mais recentemente, na Gazeta Mercantil de São Paulo, seu último trabalho antes de retornar a Porto Alegre.
De mala e cuia
A proposta da nova presidente da TVE é ambiciosa: "Construir uma televisão pública que fique na história, com o melhor jornalismo, plural e imparcial". Como ela aderiu a uma equipe que já estava instituída, os primeiros meses de gestão estão sendo dedicados à avaliação do modelo atual e elaboração de estratégias de mudança. "Tenho me dedicado a ler muito sobre televisão pública, e fiz uma aproximação muito boa com o Conselho Deliberativo da Fundação TVE, que eu quero que seja o nosso maior parceiro". Liana considera que a cobertura do Fórum Social Mundial foi a grande arrancada desta nova etapa: "Convoquei todos para fazer um grande trabalho jornalístico e o resultado foi um verdadeiro teste para vermos a competência deste quadro". Seu objetivo, agora, é estar com tudo encaminhado em março. Viagem e leitura são seus maiores hobbies. Embora a recente mudança tenha obrigado-a a adiar uma viagem planejada para o começo deste ano, e a falta de tempo impedido de manter um ritmo acelerado de leitura, atualmente está lendo Arqueologia do Saber, de Michel Foucault. Pretende conciliar a casa nova e o trabalho novo com o mestrado que está cursando na USP, em São Paulo, na área de Jornalismo e Linguagem, um sonho antigo. "O mestrado exige um mergulho no mundo acadêmico e proporciona uma abertura fantástica dos horizontes. Eu sentia necessidade de um conhecimento mais formal, mesmo com toda a vivência prática". Liana é casada há 30 anos com Newton Pereira - mineiro de nascimento, engenheiro de formação -, com quem tem dois filhos - Carolina, 27 anos, e Felipe, 24. A família é pequena, mas agitada: enquanto o filho estuda na França, a filha trabalha em São Paulo, e o marido toma as providências para a mudança do casal para a capital gaúcha. "Sei que vou sentir saudades de São Paulo, assim como quando estou lá sinto saudades daqui", prevê. Nascida em Porto Alegre, criada no Bairro São João, numa família com muitos irmãos, com viagens pelo mundo afora - incluindo uma aventura de sete meses pela América Latina e um intercâmbio na Inglaterra -, Liana está sempre a mil. Só não gosta de uma coisa: solidão. "É por isso que sempre construo muitas amizades por onde eu passo". E, do alto dos seus 53 anos - bem vividos, como faz questão de frisar - anuncia seu projeto pessoal: "Quero ter saúde para continuar fazendo tudo isso até a minha velhice".

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