Cláudio Thomas : Pé na estrada pelo Jornalismo

Editor-chefe do Diário Gaúcho fala de seu gosto por desafios e assume que vai onde o jornalismo o levar

"Fui convidado, e aceitei, a voltar para Porto Alegre para assumir o Diário Gaúcho. Quero que tu vás comigo." Essa foi a frase dita por Cláudio Thomas, atual editor-chefe do Diário Gaúcho, para a esposa, a também jornalista Rossani Thomas, uma semana antes de deixar Florianópolis, onde residiu por 11 anos, rumo à Capital gaúcha. "Cada vez que surge um convite assim eu decido na hora", explica.

Essa não foi a primeira vez que a esposa, e parceira, como faz questão de ressaltar, foi surpreendida pela decisão de Thomas de assumir novos desafios. Em 1993, o casal trocou Porto Alegre por Caxias. O jornalista havia sido convidado pela RBS para assumir como editor-chefe do jornal Pioneiro, quando de sua incorporação pelo Grupo. "Projeto novo sempre foi uma coisa que me encantou muito." Aos comentários de colegas que diziam que seria difícil se adaptar no interior, ele respondia: "Não importa onde tu trabalhas, importa o tipo de trabalho que tu desenvolves". Thomas esteve à frente do Pioneiro por quatro anos e meio.

Mudanças maiores na vida da família Thomas ainda estavam por vir. No final de 1997, o jornalista, que a essa altura já havia consolidado a imagem do jornal Pioneiro, líder em circulação na região de Caxias do Sul, e ministrava aulas no curso de Jornalismo da Universidade de Caxias do Sul (UCS), recebeu uma "intimação". Deveria assumir a chefia de redação do Diário Catarinense. Mais uma vez chegou em casa, comunicou a família da decisão, e partiu 'de mala e cuia' para Florianópolis.

Na capital catarinense, sua missão era suceder Carlos Fehlberg, à época editor-chefe do Diário Catarinense, que estava se aposentando. "Foi uma honra sucedê-lo, pois ele é um profissional que tem uma história no jornalismo muito bonita." Concluiu o Curso Máster de Jornalismo para Editores e assumiu o cargo de editor-chefe da publicação, função que exerceria por 11 anos. Há três meses, tem o desafio de manter e ampliar o sucesso editorial do Diário Gaúcho, jornal de gênero popular do Grupo RBS em Porto Alegre.
Até comentarista de esportes

Cláudio Thomas nasceu em 15 de fevereiro de 1958, em Santa Cruz do Sul. Sua escolha pelo jornalismo tem a ver com a falta de jeito para o futebol. Na juventude, até ensaiou alguns dribles, mas, não obtendo sucesso, decidiu assumir a divulgação do time nos jornais da cidade. Em 1976, foi convidado para assinar uma coluna quinzenal de automobilismo, na Gazeta do Sul, de Santa Cruz. Assim, suas primeiras participações no meio jornalístico foram voluntárias. Nessa época, conciliava as atividades administrativas em uma empresa de confecção com a escrita.

Decidido a cursar jornalismo, mudou-se para Porto Alegre em 1977, após formar-se no curso de Técnico em Contabilidade que, segundo ele, foi só para garantir seu sustento nos primeiros anos de faculdade. Na Capital, ingressou na Famecos (PUCRS) e conseguiu um emprego de auxiliar administrativo para bancar os estudos. Mas foi demitido por se recusar a trabalhar no fim de semana. "No jornalismo, trabalho sábado, domingo e feriado. Essa é a grande diferença de realizar uma atividade com prazer", avalia. 
Sonho realizado

No emprego seguinte, ainda como auxiliar de escritório, desta vez no Conselho Regional de Técnicos de Administração de Empresas, decidiu resgatar sua veia de assessor de imprensa, despertada nos tempos das partidas de futebol com os amigos santa-cruzenses. Assim, criou uma pequena assessoria de comunicação, onde divulgava as notícias do Conselho para a mídia. Também passou a produzir o jornal da entidade.

Como era apaixonado por rádio, nas horas vagas costumava frenquentar a extinta Continental com a desculpa de visitar o amigo e colega de faculdade Juarez Malta, que lá trabalhava. Em função disso, soube de uma vaga na rádio e candidatou-se, ingressando na emissora como redator, ali permaneceu por apenas seis meses, pois a programação de notícias da rádio foi encerrada. "Foi a minha única demissão em 30 anos de jornalismo", conta.

Depois de um tempo desempregado, passou num processo seletivo da rádio Gaúcha, mas, como ainda não tinha registro profissional, não pôde assumir o cargo. Nesse meio-tempo surgiu uma vaga na rádio Difusora, a atual Band. Lá, trabalhou com Sérgio Zambiasi, que na época era apresentador e gerente de jornalismo da emissora. Permaneceu no veículo por dois anos e meio.

Mas seu sonho era trabalhar na Gaúcha. Disposto a não abrir mão da vontade de ingressar no veículo, passava de tempos em tempos na redação da rádio e avisava: "Já estou formado". Em 1982, conseguiu a tão esperada chance e migrou da rádio Difusora para a Gaúcha. "Sonhava com o dia em que iria trabalhar com o Antônio Ranzolin, o Paulo Sant?Ana, o Ruy Carlos Ostermann. Vozes que eu acompanhava desde a adolescência."

Mais tarde Thomas conciliaria o cargo de repórter e também chefe de reportagem do Jornal do Comércio, com as funções de editor da Gaúcha. Trabalhava das 6h até as 13h na rádio, e das 14h às 21h no Jornal do Comércio. "Como já tinha nascido minha primeira filha, precisei aumentar a jornada." Ao se tornar chefe de reportagem do jornal, precisou sair da rádio. Em seguida mudaria outra vez, ingressando no Correio do Povo como pauteiro, onde permaneceu de 1986 a 1993.
Nos centros acadêmicos

Em 1987, foi convidado para dar aula de rádio na Famecos. Querido pelos estudantes, chegou a ser paraninfo por quatro vezes. "Hoje, em qualquer redação que eu entre acabo encontrando um ex-aluno. Me sinto muito feliz por ter participado um pouquinho da formação destes profissionais."

Em 1995, acabou deixando a PUC para dedicar-se integralmente ao trabalho de editor-chefe do jornal Pioneiro, cargo que assumira dois anos antes. Sob o seu comando, o jornal foi todo reformulado, passou a ter edições coloridas e novos conceitos editoriais. "Conseguimos tornar o Pioneiro uma referência no interior do Rio Grande do Sul." Mesmo com a rotina puxada de editor-chefe, não se afastou do meio acadêmico. Na Serra, f oi convidado para dar aula no curso de Jornalismo que estava iniciando na Universidade de Caxias do Sul (UCS).

Durante o período em que esteve na capital catarinense também não deixou de dar aulas. Coordenou a Cátedra RBS de Jornalismo na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), coordenada também pelo professor Hélio Schuch. A ideia era levar apresentadores de TV, editores e repórteres do grupo para conversar com os alunos sobre suas experiências. "A disciplina criou uma relação muito legal do curso com a empresa. Consegui levar nomes como Marcelo Rech, Pedro Parente e Nelson Sirotsky para palestrar." Thomas também ampliou a relação da empresa com os demais cursos de Jornalismo do Estado, disponibilizando as palestras com os profissionais sempre que solicitado. Muitos destes alunos viriam a ingressar no Diário Catarinense mais tarde.

Após 11 anos de atuação em outro estado, Thomas faz um balanço: "Foi um período muito interessante, porque Santa Catarina tem uma realidade econômica e social diferente do Rio Grande do Sul." Segundo ele, a cobertura lá é diferenciada porque a maior cidade não é a capital, e sim Joinvile. A função do Diário Catarinense era fazer a integração das diversas regiões de Santa Catarina. "Na redação costumávamos dizer que o Estado tem seis capitais: Chapecó, Criciúma, Lages, Blumenau, Joinvile e Florianópolis."

Quando Thomas chegou, o Diário Catarinense estava com uma tiragem de 35 mil exemplares, hoje são 44 mil. Neste período, além de consolidar a imagem e a circulação do jornal, ajudou a fundar, em 2006, o jornal Hora, veículo de gênero popular semelhante ao Diário Gaúcho, que estreou já na condição de segundo no ranking do Estado em circulação. "Ganhamos um mar de leitores, que passaram a consumir a informação. Para nós jornalistas, o lado mais satisfatório é enxergar as pessoas lendo na rua", comenta.
Com um friozinho na barriga

Em seu primeiro dia de trabalho no Diário Gaúcho, foi logo avisando: "Estou aqui para aprender. A pior coisa na vida de um jornalista é a zona de conforto. Precisamos ter aquela empolgação e vontade de querer fazer acontecer. Esses três primeiros meses foram maravilhosos, a equipe é ótima", diz o jornalista. Segundo ele, sua preocupação maior era se teria criatividade suficiente para tocar um jornal que depende da venda avulsa e, por isso, exige capas impactantes. "O Diário Gaúcho é um desafio para mim porque ele já é um sucesso editorial", comenta, ao confessar que ainda sente "um friozinho na barriga".

Na concepção de Thomas, o veículo vai além de um jornal, tem a missão social de ajudar a população a resolver seus problemas. O jornalista conta que sentiu o impacto do DG junto aos leitores já na segunda semana de trabalho. Uma reportagem de Aline Custódio sobre moradores de rua que tinham atividades remuneradas, mas mesmo assim não conseguiam pagar um lugar para morar, chamou a atenção do editor. Entre os entrevistados, estava um casal que vivia há vários anos na rua. Ela trabalhava como doméstica e ele como ajudante na Ceasa. No dia seguinte, uma leitora ligou para o jornal oferecendo uma casa para a família morar por um ano. No DG, ficou registrada a satisfação do casal em poder tomar um banho no chuveiro quente e esquentar-se no fogão à lenha. "Presenciar isto é muito gratificante."
Saudades do repórter

De tão apaixonado pelo jornalismo, Thomas não consegue se imaginar em outra profissão. O técnico em contabilidade, cursado durante o ensino médio, foi em função da busca pela independência financeira. "Trabalhar em escritório não é possível para mim. Mais velho de três irmãos, lamenta o fato de o pai não ter conseguido acompanhar sua estreia em Caxias, pois faleceu pouco tempo antes. "Ele sempre ficava preocupado quando eu avisava que estava trocando de emprego de novo." Grandes incentivadores, os pais sempre acompanharam a trajetória do filho. "Quando fazia coletiva na rádio e saía lá o meu nome, eles ficavam se exibindo para os vizinhos."

Ao refletir sobre suas escolhas profissionais, conclui que aconteceram no momento certo. Costumava dizer para os alunos que as coisas acontecem na vida das pessoas como numa escada, degrau por degrau. "Tu vai subindo de acordo com tua experiência, maturidade e foco no trabalho, não tem outro jeito". Obstinado, Thomas se define como um portador de Transtorno Obsessivo Compulsivo (TOC), por estar em constante busca pela perfeição naquilo que faz.

Dos ensinamentos que leva consigo, guarda com carinho o conselho de Luís Fernando Zanini, hoje diretor regional da RBS de Caxias: "Thomas, jornalista tu já és, agora precisa aprender a ser gerente e lidar com pessoas." A frase tornou-se um mantra. Outra expressão que segue com o jornalista e já foi passada há muitos de seus alunos é um trecho da Bíblia: "Se tu podes crer, tudo é possível ao que crê." Essa ele ouviu de Luiz Carlos Prates, ex-narrador esportivo, e atual colunista do Diário Catarinense. Entre as frustrações, só mesmo a vontade de ter sido repórter por mais tempo.
Jornalismo em família

Cláudio Thomas não é só apaixonado pelo jornalismo, mas também por uma jornalista. Foi durante os anos de estudante na Famecos que conheceu Rossani. O convite para tomar um chope foi o início do namoro: "Fomos morar juntos e, quando percebi, já estávamos casados". Rossani Thomas é subeditora da Editoria de Geral da Zero Hora. Em Florianópolis, foi chefe de reportagem da RBS TV. Antes de acompanhar o marido à Santa Catarina, atuou como chefe de reportagem da rádio Gaúcha.

O casal tem duas filhas: Cristiane, 27, que está cursando Jornalismo na Ulbra de Canoas, e Patrícia, 24, pedagoga, que mora em Florianópolis. Sobre a escolha da primogênita pelo jornalismo, confidencia que, no início, temia um pouco que ela optasse pela profissão, por ser filha de dois jornalistas. "Mas ela decidiu, se matriculou no vestibular e só me comunicou." A caçula tinha o sonho de ser professora, desde pequena dava aula para as bonecas. Antes da mudança dos pais para Porto Alegre, avisou que partissem tranqüilos porque ficaria bem por lá. "Agora eu tenho um bom motivo para passar férias em Florianópolis", brinca.

Durante os anos em que morou na Capital catarinense, Cláudio gostava de sair, sempre acompanhado da esposa, para conhecer as regiões do Estado. "Minha vida não seria o que é sem a Rossani, ela é uma grande parceira", confidencia, acrescentando que muito do que conquistou é porque tem "uma pessoa fantástica" do seu lado. O casal, que há cerca de 10 anos acaba fazendo os programas a sós, porque as filhas cresceram e não os acompanham mais, está junto há 29 anos.

Nas horas de lazer, uma das afinidades dos jornalistas é o gosto por viajar, no Brasil ou no exterior. Também gostam de reunir os amigos para jantar. Thomas, em geral, é o mestre cuca dos encontros. "Quando cheguei em Porto Alegre, a única coisa que sabia fazer era um carreteiro grudendo. Ao longo dos anos fui aprendendo novos pratos.". Sua especialidade é massa com presunto de parma e champignon. Quando vai a um restaurante e gosta muito de um prato, lê os ingredientes e tenta reproduzir em casa. Confessa que na primeira vez não costuma dar muito certo, mas garante que lá pela terceira acerta o ponto. Cozinhar tornou-se sua terapia para relaxar da rotina intensa de trabalho.

Em Porto Alegre, gosta de caminhar na Redenção, está reaprendendo a viver na capital e resgatando as velhas amizades deixadas há 16 anos. "Essa possibilidade de curtir os parques que a cidade oferece é muito gostosa". Dos desafios que ainda estão pela frente, avisa: ainda não está preparado para ser avô. Sobre o Diário Gaúcho, reconhece que tem uma grande e importante missão de manter o jornal no patamar que alcançou e consolidou. Sente-se realizado em 30 anos de profissão porque trabalhou em jornais de diferentes gêneros. "Estou recompensado profissionalmente porque tenho participado de muitos projetos importantes. Vou onde o jornalismo me leva." 
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