Darci Filho: Um cara feliz

Com 37 anos de atuação em rádio e TV, o comunicador tem muitas histórias para contar

Não foi por não ter conseguido ser jogador de futebol que Darci Rodrigues de Mello Filho abraçou a carreira de radialista e jornalista. Ele assegura que desde a infância em Santa Maria, onde nasceu em 23 de dezembro de 1948, praticava a profissão que ia seguir depois: enquanto os amigos jogavam futebol, ele narrava as partidas através de um exótico equipamento, em que uma latinha de ervilhas fazia as vezes de microfone.


A ação de verdade começou aos 18 anos, quando trabalhava na Livraria do Globo e chamou a atenção do gerente da Rádio Santamariense que, sempre que ia buscar exemplares de jornais e revistas para a emissora, percebia a capacidade de organização do jovem Darci. Um dia perguntou se ele entendia de música e se gostaria de trabalhar na rádio como discotecário. Darci, que confessaria mais tarde entender de música tanto quanto de medicina nuclear, respondeu afirmativamente. Foi assim, como um analfabeto musical, que começou seu primeiro emprego no rádio - um discotecário que não entendia nada de música. De inusitado, ficou para a história o registro da data: acredita que seja um dos poucos brasileiros com a carteira assinada no dia 1º de janeiro. O ano era 1970.


Logo, Darci começou a "brigar" para estar à frente da rádio: "Como todo cara que gosta de rádio, eu queria falar no rádio, não me contentava em ser discotecário". Nas primeiras quatro tentativas, a direção avaliou que ele não tinha voz: "Até acho que não tinha mesmo, como acho que hoje ainda não tenho. Mas é como eu digo para todos, depois que o João Saldanha falou no rádio, qualquer um fala", brinca, lembrando o técnico de futebol e jornalista que, mesmo com um timbre de voz inadequado, tornou-se um destacado - e polêmico? - comentarista e colunista de rádio e televisão.


Valeu a insistência, e algum tempo depois as prateleiras dos velhos long-plays ficaram livres do discotecário de araque, que passou para o setor de reportagem. Uma atividade primordial, como Darci faz questão de salientar: "Sempre trabalhei como repórter. E o dia em que deixar de ser repórter não serei narrador nem comentarista".


Na Rádio e TV Nacional


Foram dois anos na Santamariense até o momento em que Darci decidiu "dar um pulo", como descreve. Pensou em Brasília, pois tinha parentes por lá. Deu certo, e em 1972 começou na Rádio e TV Nacional. Foi pela Nacional que o repórter invadiu o campo para entrevistar nada menos que Pelé, logo após o Rei ter feito um gol pelo Santos. A invasão foi comentada em todo o Brasil - e ali Darci começou a mostrar que gostava mesmo era de fazer o diferente.


Nessa época entrou para a faculdade de Jornalismo. Mas sua auto-suficiência e pretensão, como define, o fizeram chegar à conclusão de que não precisava do curso: "Larguei a faculdade e fui só trabalhar. Sou um jornalista porque a lei me concede este direito. Não me arrependo. Fui à luta. Não fez falta porque os tempos eram outros. Hoje sei que é preciso", defende.


Idas e vindas


Através de Antônio Brito, na época, coordenador da Central de Interior da Companhia Jornalística Caldas Júnior, Darci voltou ao Estado e fez um teste para atuar na Rádio Guaíba. Ele relembra, sem mágoa, que, depois de estar tudo acertado para começar, Armindo Antônio Ranzolin contratou outra pessoa para seu lugar. Como já havia deixado o emprego em Brasília, decidiu-se por ficar em Porto Alegre e foi trabalhar na Rádio Difusora, onde ficou por três meses, até Cláudio Brito levá-lo para a Gaúcha, em 1975. Foi lá que, dois anos depois, Darci passou a fazer a cobertura da seleção brasileira de futebol. Cobriu a Copa de 1978 na Argentina, "que foi considerada a melhor cobertura do país", orgulha-se. E cobriu a de 1982, para não perder a prática. E também cobriu, agora pela Gaúcha, o título mundial do Grêmio em Tóquio, em 1983. Segundo ele, somente outros dois profissionais de rádio cobriram as três conquistas brasileiras no Japão: ele, o comentarista Ruy Carlos Ostermann e o narrador Haroldo (de Souza, que acompanharam as vitórias do Mundial do Grêmio (1983), do Mundial da Seleção Brasileira (Pentacampeonato, em 2002) e do Mundial do Internacional (2006).


Em 1984 comandou, ao lado de Osmar Santos, o comício pelas "Diretas Já" na Capital gaúcha, ocasião que considera um dos pontos altos de sua carreira: "No outro dia, Paulo Sant"Ana escreveu na sua coluna da Zero Hora que eu apresentei o comício melhor que o Osmar Santos. Foi motivo de muito orgulho para mim", comemora.  A partir daí, os sindicatos lhe pediam para apresentar seus encontros. O envolvimento com a política chegou ao ponto de levá-lo a concorrer a deputado estadual pelo PMDB, em 1986. Não se elegeu, pelo baixo número de votos, e não tentou mais. "Ao ridículo, me exponho uma vez só", enfatiza.


Durante e depois desse período de dedicação à política, ele passou por diversos veículos. Sua saída da Gaúcha foi no dia 31 de dezembro de 1985. No início de janeiro, começou a trabalhar na TV Guaíba: "Onde o Vieirinha foi meu chefe", lembra, falando do jornalista José Antônio Vieira da Cunha. Da Guaíba foi para a Bandeirantes. Da Band para a TV Educativa. Voltou novamente para a Band, saiu e foi para o Sport TV.


Âncora de esportes


Na década de 90, Darci voltou à rádio Band e, em 1999, entrou para o novo projeto da Rádio Pampa, de 24 horas dedicadas ao esporte, onde foi âncora da jornada esportiva: "É uma coisa que aqui no Rio Grande do Sul não tem, o cara que seja âncora do princípio ao fim. E na Pampa, eu pude fazer isso no ano passado e este ano", explica. O jornalista foi um dos que permaneceram na emissora após as demissões no início do ano. Em abril de 2007, ele voltou à Band: "Eu estava apresentando um programa na rádio e um na televisão na Pampa. Mas como eu sou um cara irrequieto, era pouca atividade para minha vitalidade pelo trabalho", esclarece, após aceitar o convite de Pedro Paulo Záchia, para atuar na Band: "Foi muito difícil, eu chorei dois dias e não me despedi de nenhum colega da Pampa, me despeço deles à medida que os encontro", confessa.


Na Band ele apresenta o "Manhã Bandeirantes", das 9h30min às 11h. Também participa do "Apito Final", das 12h30min às 14h, e é âncora das "jornadas esportivas" pelo programa "Jogo Aberto", que vai ao ar uma hora antes da bola rolar. Segundo ele, um trabalho diferenciado: "Faço a abertura do programa a partir da movimentação do jogo, colho depoimentos de personalidades de todas as áreas que gostam de futebol e, ao final do jogo, ligo novamente para estas pessoas para que elas comentem os resultados", explica, apontado o episódio do jogo Grêmio x Caxias em que entrevistou o cantor Osvaldir que canta a música do Teixerinha "Querência Amada": "Ele cantou do carro, a caminho do estádio", diverte-se. "A gente está procurando inovar, mas dando continuidade ao que já estava sendo feito", define.


Inusitado e sem "off"


Darci fala que sempre fez a diferença no jornalismo esportivo porque gosta muito de trabalhar: "Nunca vou chegar atrasado no trabalho. Se precisar, serei o último a sair e, se não precisar, também". Ele afirma que seu trabalho mais importante será sempre o próximo: "Porque eu me envolvo loucamente". Ao apresentar um programa, por exemplo, busca saber, antes, tudo sobre o que vai acontecer. Se vai trabalhar em um estádio de futebol, procura visitar o local um dia antes para conhecer todos os pontos estratégicos. Conta que no jogo do Grêmio X Cosmos, em 1981, nos EUA, visitou o Giants Stadium antes. Conheceu o vestiário e percebeu que ali havia nove telefones públicos, mas nenhum outro meio de contato externo ou equipamento para ligar os microfones fora das cabines. Na época, não existia telefone celular. O que fez então foi passar o número de um dos telefones públicos para a equipe em Porto Alegre. "Fui o único que fez a reportagem de dentro do vestiário", diverte-se. Também assegura ter sido o único repórter a fazer uma transmissão de dentro de um avião, no retorno do Grêmio do Mundial de 1983, no percurso entre Rio de Janeiro a Porto Alegre. Em outra ocasião, quando a seleção brasileira voltava da Copa do Mundo no Japão de 2002, ele conseguiu autorização do comandante do vôo para transmitir, via celular, entrevistas com toda a equipe.


Darci defende suas características de trabalho: "Em tudo o que eu fiz em rádio, eu sempre quis ser o primeiro, sempre ser ponta", declara. Ele também abre o jogo quando o negócio é manter o off: "Comigo não tem esse negócio de off!. Se me contar, eu noticio. Todos sabem que eu uso mesmo", confessa. Outra forte característica sua que destaca é de não especular a notícia: "Só bato o martelo quando tenho certeza", enfatiza.


Avô emocionado


Casado há 33 anos com Dione, Darci se define como "um cara que leva uma vida simples". Os filhos Anelisa e Diego complementam a família do jornalista. Ela, com 31 anos de idade, cursa Serviço Social na Faculdade do Ipa e trabalha na Secretaria da Indústria e Comércio na Prefeitura. Diego tem 26 anos e é casado, cursa Educação Física, também pelo Ipa, e faz estágio nos Juniores do Grêmio. "Conseguiu por seus próprios méritos", esclarece Darci.  Ao falar do neto Gabriel, de quatro anos e meio, emociona-se: "É que eu sou um chorão e ele faz do avô o que quer".


Darci gosta tanto de rádio que ouve até na hora de dormir. Nos momentos de folga, costuma fazer caminhadas com a esposa, na Praça da Encol, em Porto Alegre. Também gosta muito de cozinhar: "Faço comida para minha mulher, que fica braba por querer estar sempre em dia com a dieta dela", explica. Ele se considera "um sujeito que não pode se arrepender de nada do que fez na vida": "Eu sou um cara feliz", define.

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