Deni Zolin: Bondade na essência

Jornalista nascido no interior do Estado consolidou carreira em TV e impresso na cidade 'Coração do Rio Grande'

Jornalista Deni Zolin

'No meio do caminho tinha uma pedra', escreveu Carlos Drummond de Andrade, em 1928. Porém, para a surpresa do poeta, tinha também alguém disposto a retirá-la. É fato que o caminho não era exatamente o mesmo, e o século também não, mas em uma estrada na noite do interior dos Pampas, um homem retirava a pedra que poderia causar uma tragédia daquelas que Drummond nunca se esqueceria na vida de suas 'retinas tão fatigadas'. E o gesto do gaúcho não tinha inspiração nenhuma nas linhas do ícone do Modernismo brasileiro, e sim nos ensinamentos altruístas de Maria Helena e Leonir Zolin. E a passagem da pedra na estrada é apenas uma das que fizeram o jornalista Deni Zolin ser considerado pelos amigos "um cara de bem e do bem".

Aos 43 anos, ele relembra com carinho da infância e da adolescência no campo, que foram vividas em Jaguari, onde passou a primeira infância, e a 50 quilômetros dali, em uma chácara do município de Santiago, onde nasceu. Mesmo em uma cidade maior, a plantação de milho e a criação de galinhas, porcos e de uma vaca leiteira mantiveram o estilo simples de vestir e de ser. Anos mais tarde, ainda que repórter e apresentador da RBS TV do Centro do Estado, o jornalista não se sentia à vontade com o reconhecimento nas ruas da cidade. Enquanto ele era uma personalidade da televisão para as pessoas, via em si ainda o retraído Deni que, até os 16 anos, trabalhava entregando leite na vizinhança.

A timidez, entretanto, não barrou a curiosidade do guri, que cursou Jornalismo na Universidade Federal de Santa Maria, fez MBA em Gestão e Liderança e galgou tantos outros degraus que o levaram até ser gestor da TV Diário, colunista do Diário de Santa Maria e um dos principais nomes na edição do periódico regional. Falando em nome, não ouse chamá-lo de Dêni - a pronúncia correta é Dení, apesar da ausência do acento no nome. Não que do alto de sua simpatia ele vá se importar, mas seria uma afronta à bela homenagem que o seu Leonir fez ao seu repórter preferido. Foi ouvindo Deni Menezes com as notícias do Esporte, que chegavam ao Sul direto do Rio de Janeiro, pelas ondas da Rádio Globo, que o pai decidiu o nome do caçula e, indiretamente, colocou a primeira pitada de Jornalismo na história dele.

No coração do RS

O apoio da família foi fundamental, desde que os pais deixaram Jaguari, para que os filhos continuassem os estudos, até os aprendizados sobre tecnologia com os irmãos Ocimar, Edson e Sidnei. Inclusive, quando a sede por conhecimento levou Deni a ser um dos únicos dois colegas do ensino médio a passar no vestibular da UFSM, foi com Edson que passou a dividir a casa em Santa Maria. A chegada na nova cidade foi repleta de expectativa: "Um mundo mágico". Ele nem imaginava o que estaria por vir.

Se houve algo de mágico naquele período, foi o que Deni conseguiu fazer com as 24 horas de cada dia. Ele participou do Programa de Educação Tutorial (PET), fez estágio em assessoria de imprensa, participou de um programa de rádio, aprendeu com um amigo do irmão da Base Aérea a fotografar, ajudou a diagramar projetos de colegas e usou os ensinamentos de um curso de cinegrafista para ocupar voluntariamente o cargo vago na faculdade. Ainda sobrava tempo para praticar natação no campus. "Tinha dias em que eu não almoçava", conta.

O frenesi intelectual não foi o único que a cidade 'Coração do Rio Grande' provocou no jovem. Recém-formado, foi em uma noite de 1999, divertindo-se em uma boate local, que conheceu Daniela Carmo. O guri acanhado conhecia ali o amor. Com a farmacêutica, enfrentou as dificuldades do romance a distância, quando atuou em São Gabriel e também no período em que ela trabalhou na Região Metropolitana da Capital. A primeira namorada tornou-se esposa seis anos depois e também mãe de Leonardo, de oito anos, e de Vinícius, de dois anos e 10 meses, os filhos de Deni.

Nas telinhas

A timidez que acompanha o santiaguense desde quando ele assistia aos noticiários com os pais durante os almoços e jantares não impediu que o jornalismo televisivo cruzasse seu caminho. Esta história, que começou na TV Campus da UFSM e o fez deixar de lado a carreira acadêmica, o colocaria, mais tarde, na bancada do RBS Notícias, ao vivo para toda a Região Central. O guri que admirava o trabalho do seu veterano de faculdade Glauco Pasa  não esquece da primeira vez em que assumiu a apresentação no lugar do colega: "Foi marcante".

Para chegar ao comando do telejornal, Deni trilhou um caminho não tão longo, mas intenso. Foi convidado para estagiar na RBS TV na reta final da graduação e teve sua primeira matéria exibida em junho de 1998. "Fui com o mesmo ímpeto que tinha na faculdade." E deu resultado. Apenas nove meses depois, o jovem estava contratado como repórter da emissora. Do período, relembra com carinho: uma equipe legal, com competições saudáveis de quem fazia as melhores matérias e dedicação para emplacar bons conteúdos no noticiário principal, veiculado para todo o Rio Grande do Sul.

A jornada em televisão teria um hiato de mais de uma década, iniciado quando, em 2002, o jornalista estava na sucursal de São Gabriel da RBS TV e aceitou o convite para a editoria de Geral do recém-criado Diário de Santa Maria - que, em 2017, seria vendido pelo Grupo RBS a 10 empresários da cidade. Ele já havia, inclusive, se candidatado a trabalhar no periódico, mas desistira por imaginar que não se adaptaria. Porém, encontrou-se no impresso. A possibilidade de fazer textos mais aprofundados e a objetividade que levava como bagagem da reportagem de TV rendiam elogios às suas matérias. Ele, novamente, não pensava que voltaria a atuar com televisão no próprio Diário.

Em ação

Muitas das vivências que Deni teve como jornalista sequer eram consideradas pela mente do guri simples do Interior. Foi assim quando se viu a mais de oito mil quilômetros de distância de Santa Maria: em Nova Iorque, nos Estados Unidos. A oportunidade de concretizar o sonho de conhecer a 'Big Apple' veio a partir de uma cobertura feita por Zero Hora, de um evento na cidade estadunidense de Minneapolis, no estado do Minnesota. 

Não é somente em terras estrangeiras que o jornalista sente a satisfação da profissão. A trajetória na editoria de Economia do Diário SM, da qual chegou a ser editor, e a coluna que assina no impresso o possibilitaram dar notícias positivas à população local. Como retribuição, destaca os depoimentos de pessoas que se colocaram no mercado de trabalho a partir das vagas divulgadas. "Uma vez estava no shopping e a atendente disse ter conseguido emprego por causa de uma notícia que eu tinha feito no jornal", recorda, com gratidão.

Enquanto a repercussão social positiva marcou Deni em algumas coberturas, em outras o profissional foi impactado pela complexidade da história que contava. Foi o caso quando, como 'catador de lixo por um dia', acompanhou uma senhora que sobrevivia da atividade levando a neta de 10 anos consigo. A indiferença de quem passava doeu: "Ninguém olha na tua cara". Mas alguém o enxergou. A menininha faminta, que caminhava junto do repórter e da avó, vendo potes com restos de iogurtes e doces, fez uma pergunta que ele não esqueceria: "Tio, quer pra ti?".

Dos tantos choques de realidade vividos pelo jornalista, esteve a fatídica madrugada de 27 de janeiro de 2013, quando um incêndio ceifou 242 vidas na boate Kiss, no Centro de Santa Maria. Após aproveitar o chá de fraldas do primogênito, Deni dormiu e foi acordado às 5h35 da madrugada, com a ordem de ir imediatamente para o jornal, com a informação de oito mortos e 20 feridos na danceteria. O dia foi interminável para um dos três principais editores do Diário de SM, vendo o número de vítimas subir, reorganizando a redação para receber profissionais de Porto Alegre, Santa Catarina e, inclusive, da Globo, além de monitorar o delicado conteúdo produzido em tempo real.

A memória do jornalista não apaga a tensão vivida pelo acontecimento que parou o município gaúcho, e chocou todo o Estado, e o País, mobilizando até a imprensa internacional. O medo da depressão após a tragédia abateu o profissional, que não via sequer um sorriso entre os colegas - preocupação que se estendia à Daniela, prestes a ganhar Léo. E, mesmo se considerando "um pouco cético", Deni teve a certeza, ao ver o filho, que haviam ganhado "um presente de Deus". E a família seria 'abençoada' novamente, seis anos depois, com a chegada de Vinícius.

Em essência

A família segue sendo o refúgio de Deni, que adora passar seu tempo livre se divertindo com eles na sede campestre do tradicional Clube Recreativo Dores, contando com área verde, churrasqueiras e, ainda, uma praia artificial. As séries tiveram que sair de cena, visto que o dia é preenchido pela rotina jornalística. A pandemia de Covid-19 também dificultou os momentos de lazer do profissional, que aposta, quando possível, em passeios matutinos com os filhos e o mascote do grupo: o yorkshire Tobi, que acompanha Deni há 13 anos e tem muito ciúme do dono.

O estilo tranquilo do fã de Queen, U2 e Pink Floyd se reflete também no trabalho. A busca pelo "bem de todos" é, inclusive, considerada por ele uma das maiores dificuldades como gestor, já que acaba tendo dificuldades de cobrar a equipe. No entanto, a característica beneficia sua relação com as fontes. Deni fala com orgulho de como sua dedicação em ouvir as pessoas e de aprender mais sobre o assunto antes das entrevistas lhe rendeu boas relações e notícias exclusivas, ensinamentos que costuma passar adiante aos repórteres.

"Se eu acordo todo dia, é pra tentar ajudar alguém", afirma. E nada abala esse propósito que ele carrega consigo. Nem a tristeza pela morte de dona Maria Helena e o agravamento do Alzheimer de seu Leonir, ocorridos durante a pandemia, o que o impediu de estar mais próximo dos familiares, lhe tiram a fé na bondade - que aprendeu com os pais. "Nossa religião é o bem. Ser ético e justo." E, assim, o jornalista se mantém na missão de fazer a diferença na vida das pessoas, seja nas páginas do jornal impresso, no noticiário da televisão ou na estrada, retirando perigosas pedras do caminho de quem virá.

Comentários