Leandro Demori: Um tanto quanto sagaz

Natural de Santa Catarina, o jornalista veio a Porto Alegre para estudar e, hoje, marca presença no cenário nacional da imprensa

Ele defende o jornalismo investigativo e faz dele seu maior aliado. Inclusive, Leandro Demori se consagrou no cenário nacional como um dos principais nomes da imprensa, tornando-se adorado por uns e nem tão amado por outros. Natural da pacata São Miguel do Oeste, no interior de Santa Catarina, veio a Porto Alegre para estudar. A escolha da capital gaúcha se deu por seu "estilo underground", como ele mesmo rotula, e o cenário musical dedicado ao rock. "Poderia ter ido para Florianópolis, como a maioria dos meus amigos, mas optei por vir para cá", explica.

O "muleque de interior" começou a se interessar pela comunicação na adolescência. Foi influenciado por um tio de Francisco Beltrão, no Paraná, onde passava as férias de Verão do colégio e alguns finais de semana. "Ele trabalhava em uma rádio e me levava junto. Aí, fiquei antenado no negócio e, ali, decidi o que queria fazer da minha vida", lembra. Porém, por ser de cidade pequena, não sabia que existia faculdade de Jornalismo, então, pensava em cursar Psicologia, por entender que era a profissão que mais se aproximava de pessoas.

Notícias de Butiquim

A primeira função que mais se pareceu com o que viria a ser seu futuro profissional foi editando um pequeno jornal, 'O Butiquim'. Em formato A3, as páginas eram dispostas sob os plásticos que envolvem mesas de restaurantes. Para viabilizar financeiramente o material, Demori e um amigo vendiam patrocínio e distribuíam o informativo pela região. Vindo de uma família de agricultores e metalúrgicos, depois do tio, foi o único que seguiu no ofício. Sua origem, aliás, é gaúcha, pois o pai, de quem não revela o nome - assim como todos os membros da família, por questões de segurança - é natural do Estado, assim como o avô materno.

Em Porto Alegre, por fim, deu início aos estudos na PUC e começou, de fato, a se envolver com a profissão. Permaneceu na Capital de 1999 a 2008, quando foi para a Itália. Ficou lá pelos três anos seguintes, quando se especializou em jornalismo investigativo, com ênfase em máfia pela Associação de Jornalismo Investigativo de Roma, e conquistou certificado como Investigador Web pela City University London, da Inglaterra. De volta ao Rio Grande do Sul, foi morar na Serra Gaúcha, já com a esposa - natural de Passo Fundo -, que recebeu uma proposta profissional. O que era para ser um período de transição se transformou em cinco anos, tempo ao qual se dedicou ao livro-reportagem 'Cosa nostra no Brasil, a história do mafioso que derrubou um império', lançado pela Companhia das Letras.

Ao longo da carreira, também atuou como repórter, produtor ou editor no Brasil e na Itália para a TV Globo, Canal GNT, Globonews, portal Terra, Globoesporte.com, revistas Galileu e IstoÉ, jornal Zero Hora e Rádio France Internacional. Além disso, cobriu eventos em diversos países da Europa, desde o terremoto de L'Aquila, em 2009, na Itália, até a beatificação de João Paulo II, na Polônia, em 2011.

Com todas essas experiências, foi marcando presença na imprensa nacional, e, com um nome mais conhecido no meio, recebeu a proposta para integrar a equipe da Revista Piauí, da qual ajudou a desenvolver a plataforma digital no Rio de Janeiro. Um ano se passou até que foi convidado para trabalhar na equipe do The Intercept Brasil. E, assim, Leandro Demori lançou, definitivamente, seu nome no jornalismo nacional, como editor-executivo do site que levou à tona notícias que abalaram o sistema brasileiro envolvendo a Operação Lava-Jato e o governo federal.

Entre fraldas, aviões e o mar

Tempo livre é o que mais lhe falta. Nas horas vagas, poucas, é verdade, troca as fraldas do filho de pouco mais de um ano de idade. Dormir, por outro lado, é um luxo em meio às viagens que faz pelo Brasil por conta do trabalho. "Adquiri a experiência de cochilar em avião e cadeira de barbeiro", brinca, com seu humor um tanto quanto sagaz.

Entre uma fralda trocada e uma viagem, gosta de pegar a bicicleta e a prancha e se jogar nas ondas do mar do Rio de Janeiro. Descobriu o esporte há pouco mais de um ano, quando um amigo lhe aconselhou a aproveitar as vantagens que a Cidade Maravilhosa oferece. "Quando fui morar no Rio de Janeiro, não gostava de lá, até que me disseram: 'Cara, tu não vais conseguir mudar o sistema, ninguém conseguiu. Então, desfrutas do que a cidade tem de bom para oferecer', e foi assim que aprendi a surfar", aponta.

Outro esporte que ganha sua atenção é o futebol. Não como praticante, pois deixou as 'peladas de fim de semana' depois que a esposa insistiu para que parasse de se machucar tanto. Quem ganha mesmo seu coração é o Grêmio, time para o qual começou a torcer na juventude. Confessa que, quando criança, o pai não o incentivou, nem a seus dois irmãos mais novos, a acompanhar futebol. "Então, não tinha tanta paixão e acabava torcendo para qualquer time que estivesse ganhando." Relembra, inclusive, que tinha várias camisetas de outros times, exceto a do Internacional, claro.

Quando começou a torcer mesmo, ainda não tinha oportunidade de ir aos jogos, realidade que mudou quando veio a Porto Alegre. "Aí, virei rato de estádio. Vi muita partida do Tricolor de 2000 a 2008 e, quando voltei da Itália, também", diz. Hoje, no Rio, procura ir ao Maracanã sempre que seu time joga contra alguma equipe carioca.

Tem lido muito livro colateral ao trabalho, que trata, especialmente, do mundo digital e de seu lado perverso, comos os algoritmos. Admite que pouco assiste a programas de televisão, pois não encontra tempo para isso, sempre dividido entre a profissão e o filho. "Não tenho conseguido desligar da função."

Eclético quando o gênero musical é rock, acompanha as mesmas bandas e músicas que ouvia na adolescência. "Não sei nada de novo e fico perdido quando meus amigos falam sobre as atrações do Loola Palooza, por exemplo", assume, listando entre suas preferidas Black Sabbath, Pink Floyd, Legião Urbana, e as gaúchas TNT e Cascaveletes.

Ele faz o que quer

Demori não tem religião, embora esclareça que tampouco é um assunto que lhe incomoda, ou, mesmo, importa. Foi batizado na igreja católica e, curioso como sempre foi, logo que começou a ler, consumiu as obras de Paulo Coelho, assim como outros livros de ocultismo e magia. "Fiquei meio viciado nesse mundo, me interessava muito e minha avó é de umbanda. Então, já tinha tradição na família", explica. A onda passou e, depois, nunca mais se interessou a ponto de professar uma religião. Prefere se rotular como agnóstico, pois acha difícil, também, dizer se existe ou não uma força maior, mas prefere dizer que é um "agnóstico meio nem aí". "Não é um problema se existe ou não. Isso não me perturba. Cada um que se apegue ao que acredita", resume.

Estabelecido no Rio de Janeiro, não passa pela cabeça voltar ao Rio Grande do Sul, talvez mais devido à localização. Sobre sair do site The Intercept Brasil, tampouco pensa que será logo, pois, conforme acredita, tem muito a contribuir para o veículo. "Minha cabeça está totalmente focada no que estou fazendo e não sou de pensar em longo prazo. Gosto de ter uma ideia de onde as coisas estão." Contudo, alega não ser uma pessoa que se apega e, se um dia cansar, ou se o TIB optar por sua saída, tudo bem. "Meu trabalho tem que fazer sentido e me fazer bem. Se isso acabar, busco outra coisa, pois não quero gastar meu tempo em algo em que não acredito", afirma.

Ao se autodefinir, o jornalista é categórico e logo certifica: "Sou um cara que faz o que quer. Não gosto que me limitem, policiem ou ditem o que tenho que fazer. Já me ferrei muito por causa disso, mas OK. Gosto de saber que estou me dedicando a algo que quero e gosto. Quando isso não acontece, vou para outro lugar fazer outra coisa. Não digo que não engulo alguns sapos, mas busco negociar comigo e, quando preciso, é porque optei por isso, não porque alguém me obrigou. Sei que tem consequências, mas, ao mesmo tempo, deito e durmo tranquilo comigo mesmo".

Comentários