Magda Rodrigues da Cunha: Entre o mercado e a academia

Primeira mulher a assumir a direção da Famecos, Magda Cunha diz que a Universidade deve ser a vanguarda do mercado e propõe a criação de um programa de discussão da qualidade do ensino na instituição.

Magda Rodrigues da Cunha, 43 anos, não faz cerimônia para "botar o pé na porta". Primeira mulher a assumir a direção da Faculdade de Comunicação Social da PUC-RS (Famecos), ela evidencia através de seu trabalho a determinação e a ousadia que marcam sua personalidade. Opiniática, ela acredita que a Universidade deve ser a vanguarda do mercado e que o professor acadêmico deve sintetizar a experiência do exercício da profissão com a reflexão da academia e, se possível, ainda propor algo além disso.


A escolha pelo Jornalismo aconteceu ainda na adolescência, quando seu espírito aventureiro fantasiava a atuação profissional nas áreas de arqueologia e antropologia. Natural de Porto Alegre e estudante do colégio Sevignê, acabou visitando a sede da Caldas Júnior e conhecendo a rotina de trabalho do lugar para cumprir tarefas escolares. Foi paixão à primeira vista. A arquitetura antiga e a magia que envolve o prédio do grupo de comunicação encantaram Magda e influenciaram de forma definitiva em seus planos. "Há 25, 30 anos atrás as redações eram muito vivas e barulhentas. As pessoas fumavam loucamente, datilografavam as matérias na máquina de escrever", lembra com entusiasmo.


A graduação teve início em 1980, na Famecos, e fim em 1984. Suas primeiras experiências no mercado, os estágios, já surgiram nessa época, embora ela ressalte que "conseguir um estágio naquela época era muito mais difícil do que é hoje". Por sorte, um primo de seu pai, que trabalhava na rádio Guaíba, lhe abriu as portas da empresa. "Mas eu só fazia o que não ia para o ar", ela explica. Recém-formada, foi para a Folha da Tarde, seu primeiro emprego, onde permaneceu um ano. Na época, a Caldas Júnior estava no auge de sua crise e, nesse momento, a Rádio Pampa montou uma equipe de jornalismo a partir dos profissionais que saíam da Rádio Guaíba. Neste grupo, Magda estava incluída. Passou a atuar como redatora e permaneceu na emissora de 1985 a 1986.


Jornalismo a todo o vapor


Foi aí que surgiu o convite para trabalhar na rádio Gaúcha durante a cobertura dos preparativos da Assembléia Nacional Constituinte e responsabilizar-se, pela primeira vez, pela produção do programa Jornal das Eleições, criado por Eridson Lemos. "Ele era um jornalista experiente, organizou toda a cobertura e faleceu na véspera da eleição", relembra. Ainda em 1986, com 23 anos, começou a ministrar cadeiras de radiojornalismo na Famecos paralelamente à atuação na rádio Gaúcha. "Meu pai costumava dizer que jornalista morre de fome e, por isso, eu aceitava todos os trabalhos que me apareciam", conta lamentando que, ainda hoje, alguns pais orientem os filhos a partir desta concepção. No final de 1988, passou a integrar também a assessoria de Comunicação da PUC, na qual atuou por nove anos.


Com o final do programa, Magda foi convidada a continuar na emissora e tornou-se uma produtora de excelente currículo após dez anos de muito trabalho. Produziu jornalistas como José Antônio Daudt, Flávio Alcaraz Gomes, Rogério Mendelski e Lauro Quadros. Entretanto, em 1995, a necessidade de obter a titulação acadêmica necessária para seguir dando aulas - atividade que não interrompeu durante nenhum dos quase dez anos em que trabalhou na Gaúcha - lhe obrigou a optar pela docência ou pelo mercado. Pelo menos temporariamente, já que as "empresas de comunicação ainda não demonstravam interesse no aperfeiçoamento de seus profissionais". Contudo, a decisão viria a tornar-se definitiva alguns anos mais tarde.


O doutorado, realizado por ela na faculdade de Letras da PUC de 1998 a 2002, veio acompanhado de uma novidade: em 1999, assumiu a coordenação do departamento de jornalismo. Apesar de ter abandonado o mercado, a gestão do setor lhe trouxe de volta a prática jornalística. Isso porque a faculdade se mostrou para ela como uma pequena empresa jornalística, com laboratórios e veículos próprios. "Eu era especializada em rádio e tive que aprender coisas técnicas de outras áreas como fotografia, TV e internet", enumera. Como experiência mais tensa nesta fase, ela cita a migração de currículo. "Eu não podia trazer prejuízo para os alunos", justifica. As demandas do curso foram atendidas por Magda até o final de 2004. A partir de então, ela dedicou-se à vice-direção da Famecos. E, no dia 12 de dezembro, assumiu a direção e destacou-se na história da faculdade como a primeira mulher no cargo.


Preparada para o que vier


A diretora diz sentir-se preparada para as novas tarefas. Seu histórico comprova a afirmação. O período em que esteve presente na assessoria de comunicação da Universidade lhe garantiu o entendimento das rotinas e procedimentos do lugar. A coordenação do Curso de Jornalismo também ajudou nesse sentido. A produção de programas de rádio, que desempenhou por tanto tempo, a fez desenvolver desenvoltura, agilidade e eficiência, já que tudo "devia ser feito para ontem e não podia ficar sem solução". Em tom de brincadeira, ela diz não saber se procurou o rádio por ser desse jeito, ou se ficou desse jeito devido ao rádio. Por fim, a condição de vice-diretora, acompanhando de perto o trabalho do ex-diretor Jerônimo Braga, que ficou nove anos no cargo, lhe proporcionou um contato antecipado com suas novas atividades.


"Aprendi muito com o Jerônimo. Ele vem de outra área, é Relações Públicas, um planejador que trabalha a priori e previne as crises. Mas eu venho de uma profissão que gera crises", ironiza sem deixar de valorizar o trabalho do colega. A portaria de nomeação da direção é anual e, assim, Magda permanece na posição até o fim do ano podendo receber nova portaria. "Vai depender do desejo da Universidade e da minha disponibilidade se cruzarem", esclarece. O novo estatuto da instituição não prevê a função de vice-diretor e delega mais responsabilidade aos coordenadores de curso.


Em seu mandato, ela tem como objetivo criar um programa para discutir a qualidade do ensino com alunos, professores e representantes de empresas de comunicação. Será traçado um panorama do ensino na área de comunicação - a partir de temas como a atualização constante dos currículos dos cursos, a formação dos professores e a relação entre a academia e o mercado - e um comitê interno de avaliação permanente será formado. Para ela, falta em sala de aula um espaço para a reflexão. "Se a Universidade não for capaz de influenciar o mercado com o conhecimento que produz, o que nós estaremos fazendo aqui?", questiona enfatizando que o ensino não deve ser uma reprodução do espaço de trabalho.


O importante é viver bem


Filha de Carmen Duarte Rodrigues da Cunha e Clóvis Carneiro da Cunha, ambos de 70 anos, e irmã de Mirian Rodrigues da Cunha, 38, ela não tem filhos e revela que, quando sobra tempo, a televisão é a mídia que consume. O ritmo de trabalho acelerado reflete  diretamente na vida pessoal de Magda, mas não chega a ser um problema. É casada há cinco anos com o também professor da Famecos, Eduardo Pelanda, que leciona cadeiras da área de tecnologias da informação. "Mas não fui eu quem o contratou!", brinca ao contar que o conheceu dentro da Universidade.


Seu dinheiro, ganho com base em muito trabalho, ela gasta com apreço. "Gosto de viagens, de vinho, de bons restaurantes, de conforto e de viver bem. Dinheiro é para isso. Odeio mesquinharia", ressalta. "Só não gosto de formalidades", complementa, explicando que procura tratar bem a todas as pessoas com quem convive, indistintamente e com respeito ao trabalho de cada uma. "Quem teve boas oportunidades na vida tem o compromisso de ajudar quem não teve", é sua filosofia de vida.


O gosto pelas viagens é tão grande que ela pretende criar um blog para armazenar fotos e relatos. Nos últimos seis anos, a Bahia foi o destino escolhido para passar o mês de fevereiro, suas férias. "O povo de lá tem uma cultura diferente, aprendi a ser mais calma com eles", conta. Ela também planeja, no futuro, morar no exterior e fazer lá o seu pós-doutorado, embora ainda não tenha idéia de qual país será o escolhido. Sua certeza é de que não abre mão do contato com os alunos da Famecos. "A convivência com eles me mantém viva e alerta", conclui.

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