Mário Verdi: Design em outra categoria

Presidente da Apdesign quer reconhecimento da atividade como ferramenta fundamental em processos de inovação

É aconselhável pensar muito bem antes de contratar o designer Mário Verdi, 39 anos. Se o objetivo for apenas dar uma melhorada na aparência de produto ou serviço, é melhor esquecer. Sócio da Verdi Design e presidente da Associação de Profissionais em Design do Rio Grande do Sul (Apdesign), o empresário considera a atividade como a ferramenta fundamental em processos de inovação. Ou seja: reavaliar uma embalagem poderá resultar, por exemplo, em uma nova percepção do próprio negócio que você dirige. Mário é assim. Nada de meias-soluções.
Vem de longe o comportamento obstinado. Nascido em Porto Alegre, primeiro dos cinco filhos do engenheiro mecânico-eletricista José Vinicius Verdi e da dona de casa Maria Aparecida Spalding - filha do historiador e jornalista Walter Spalding (1901 - 1976) -, Mário tornou-se designer tanto pelo gosto por artes gráficas quanto pela insistência em torno dos detalhes e da perfeição. É um autodidata. Cursou Publicidade e Propaganda na Fabico, a faculdade de Comunicação da Ufrgs, ou, mais exatamente, esteve matriculado no curso entre 1990 e 1998. Acabou desistindo do aprendizado formal, sem, no entanto, desistir da paixão. Afinal, era algo que o acompanhava desde menino.
Aos nove anos, por exemplo, o garoto se interessou pelo vetusto hábito de colecionar selos - até hoje preserva a coleção com todos os selos emitidos no Brasil entre 1946 e 1976. Deve ter sido o mais jovem integrante da Sociedade Filatélica Riograndense, fundada em 1931, no tempo em que as estampas postais ainda eram elementos obrigatórios no cotidiano dos cidadãos e das empresas. O ingresso na entidade foi em razão do reconhecimento pelo esforço e pela seriedade com que encarava o hobby.
Sonho realizado
Verdi saía do Bairro Assunção - onde mora há 38 anos -, pegava o ônibus e desembarcava no centro de Porto Alegre para negociar selos em silenciosos estabelecimentos especializados. Eram outros tempos, é verdade, e uma criança ainda podia circular pela cidade sem grandes temores, mas havia a distância, a mobilidade mais reduzida e as dificuldades de comunicação. Enfim, uma pequena viagem. Mais do que isso, o guri tinha comportamento de colecionador adulto. "Eu já tinha temática, característica de coleções profissionais. Selos brasileiros e fauna", esclarece.
Mário admirava a arte gráfica encerrada nas pequenas imagens dos selos. Gostava tanto que ali começou, sem saber, a sonhar com a profissão. "Meu sonho era criar um selo", afirma. A oportunidade surgiu no ano passado, durante o processo de formação da Universidade Federal da Integração Latino-Americana (Unila), sediada em Foz do Iguaçu (PR). Ele ofereceu ao hoje reitor da instituição, Hélgio Trindade, a criação da identidade visual da instituição. Entre as peças, havia um selo postal, lançado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva por ocasião da aula inaugural da Unila, no dia 2 de setembro de 2010. O selo foi assinado pessoalmente por Mário, embora, no conjunto, o trabalho tenha sido uma doação da Verdi Design.
"Decidimos doar o trabalho, em retribuição aos anos de estudo no ensino público", explica. A primeira pessoa do plural - "decidimos" - refere-se ao irmão e sócio, José Antônio Verdi, 35, graduado em Publicidade e Propaganda pela Fabico. Os dois conduzem a Verdi Design há 16 anos. No total, 13 pessoas formam a equipe que já atuou em mais de dois mil projetos, para cerca de 400 clientes. "Um marco na nossa história foi fazer a identidade corporativa de Itaipu Binacional, uma oportunidade que surgiu por meio da Competence", destaca Mário.
Surfe e serigrafia
A Verdi desembarcou em Itaipu em 2007 e transformou Foz do Iguaçu, onde a geradora de energia está localizada, em um destino frequente para Mário. Foi no município paranaense que o ex-aluno da Fabico encontrou Hélgio Trindade, ex-reitor da Ufrgs, a quem ofereceu a colaboração voluntária para a Unila. Ainda em Foz, a empresa dos dois irmãos trabalhou para a criação da identidade visual turística da localidade e na execução do projeto de sinalização do campus da Unila, desta vez em colaboração com o escritório do arquiteto Oscar Niemeyer.
Do sonho do selo ao surgimento da Verdi Design, em 1995, Mário transitou por uma experiência riponga - ainda estudante do Ensino Médio no Colégio Mãe de Deus, no Bairro Tristeza, tecia pulseiras com fios de seda, negociadas com colegas de escola -, produziu adesivos com logotipos de bandas de heavy metal e acabou deslizando nas ondas do surfe. A combinação do esporte com o interesse por artes gráficas, no final dos anos 1980, certamente resultaria no encontro com a serigrafia.
Obstinado, começou pintando camisetas a mão, uma a uma, até adquirir máquinas e equipamentos para o processo silk-screen. Criou a marca 6 Pés - "um tamanho de onda considerado ideal", explica - e oferecia, junto com o amigo e sócio Nico Poli, camisetas, bermudas e moletons, o kit básico da indumentária surfista. O negócio durou seis anos, até 1992, quando Mário, já na faculdade, foi trabalhar na Liberty Comunicação Integrada, "uma pequena agência voltada para a área gráfica". O surfe também ficou para trás. Mário se diz agora um simpatizante do esporte e deixa a prancha de lado mesmo quando está em Imbé (RS) ou na Praia do Rosa (SC), onde costuma veranear. Nas noites de segundas-feiras, porém, costuma jogar futebol com amigos em Belém Novo, para manter os 79 quilos no corpo de 1,84 metro.
O início da Verdi
Aos poucos, o jovem profissional começou a ser chamado para trabalhos como free-lance e acabou abrindo o próprio escritório. Na largada, uma empresa de porte considerável como cliente - Stemac. "Eles queriam um projeto de comunicação visual para identificar a potência dos grupos geradores", relembra Mário, que percebeu que design vai além da questão estética. "Dizem que Deus fez o design do mundo", diz.
No caso da Stemac, o profissional identificou que a empresa enfrentava outra dificuldade, além da necessidade de informar a potência de grupos geradores: "Havia um problema na aparência do produto. Era feio. Embora montado com peças novas, parecia feito com sucata. Conseguimos resolver isso criando um sistema de cores para cada tipo de grupo gerador". O trabalho influenciou várias áreas da empresa, e Mário passou cinco anos assessorando diretamente a diretoria da Stemac. Era 1995 e estava aberto o caminho para a constituição da Verdi Design.
Em 2000, o empreendimento tinha cinco anos e Mário, dois anos de casado com a engenheira de software da IBM Graziela Kunde, quando surgiu a oportunidade de ir para a Califórnia, nos Estados Unidos - a dupla tem hoje os meninos Vítor, de quatro anos, e Henrique, dois anos. Graziela foi trabalhar na IBM no Vale do Silício e Mário se tornou designer-chefe da Corporate Sign Systems, uma empresa de comunicação corporativa que presta serviços para gigantes como Microsoft e Yahoo.
O retorno do designer
"Quando retornei, em 2005, estava com uma bagagem muito grande na área de sinalização", diz Mário. O irmão ficara em Porto Alegre tocando os negócios da Verdi Design, que a partir desta época passou a prestar serviços para clientes cada vez mais expressivos. Logo depois de sua volta, por exemplo, o escritório assumiu a unificação da programação visual e de leiaute de todas as unidades da AES-Sul. Ao mesmo tempo, ele foi percebendo cada vez mais a amplitude do design. "Hoje, há designers projetando o futuro de uma cidade", destaca o dirigente da Apdesign.
Sob seu comando, aliás, a entidade está contribuindo para os rumos da Capital gaúcha. Em março, iniciou a campanha Quero Ver Porto Alegre, para melhoria da paisagem urbana. "Esta ação barrou possível alteração na legislação para permitir aumento da área de publicidade externa", revela. De acordo com Mário, a mídia externa precisa ser reinventada. "Querem repetir o que ocorreu em São Paulo? Se a mídia externa seguir no modelo insustentável, ela irá acabar. É possível, no entanto, repensar", alerta, referindo-se à Lei Cidade Limpa, que proibiu qualquer publicidade externa na capital paulista desde janeiro de 2007.
Quem pensa a cidade, pensa também o Estado. Mário relembra entrevista do músico Nelson Coelho de Castro concedida a Ruy Carlos Ostermann, no evento Encontros com o Professor, em maio de 2009. Mais especificamente, recorda uma expressão utilizada por Nelson - "empatador" - ao abordar problemas do Rio Grande do Sul. "O empatador é uma pessoa com alto poder de persuasão e que se posiciona estrategicamente para dizer não. Para tudo, para qualquer coisa. Eles encontraram posição favorável aqui no Rio Grande do Sul, onde há mais de 30 anos celebra-se a cultura do erro zero", dispara Mário contra programas e ações que defendem a ideia de que qualidade é sinônimo de não errar. "Toda inovação nasce do erro", salienta o designer sempre concentrado no que está faltando, no que está errado e no que pode ser mudado. Três preocupações que, de acordo com ele, caracterizam a profissão que escolheu.
Clique aqui para conferir em imagens as lembranças de Mário Verdi.
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