Marta Sfredo: Fome de aprender

Com uma inesgotável curiosidade pela vida, Marta Sfredo se diz uma apaixonada pelo desconhecido

Marta Sfredo - Reprodução

Tão serena, mas tão divertida. Marta Sfredo pode parecer reservada e retraída, primeira impressão que não dura muito. Logo, a editora de Economia de Zero Hora, de 49 anos, mostra-se mais expansiva. A origem italiana fica clara pela aparência, com sua pele bem branca e olhos azuis - aliás, é quase como se ela falasse através deles. Natural de Sananduva, cidade da região norte do Estado, ela confirma a descendência: "Italiana pelos quatro costados", brinca com o fato de a genealogia vir de avós paternos e maternos.

Filha da dona de casa Odila e do agente de estatística Samuel, que trabalhava no Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), ela credita ao pai parte do interesse pela área em que atua. "Minha obsessão por números e gráficos não é gratuita, tem um componente genético", diz, para em seguida lembrar da infância, quando descobriu que a janela da cozinha media, exatamente, três réguas de 30cm. Ao contar a descoberta para o pai, ouviu: "Sim, minha filha, isso se chama multiplicação. Vais aprender sobre isso no colégio". No que a criança respondeu: "Nossa. É fácil assim? Achei que era mais difícil".

Marta passou por assessoria e rádio, atua em jornal e televisão - com um comentário semanal sobre economia no programa TVCOM Tudo+. Apesar da bagagem, garante que o impresso ainda é seu chão.

E o Jornalismo chegou?

Formada pela Fabico, em 1984, Marta está na Zero Hora desde 1992 e sobre as duas décadas faz uma brincadeira: "Se ninguém se arrepender antes, em agosto faço 20 anos de empresa". Antes de assumir como editora de Economia, também atuou em Política, mas é na primeira onde prefere estar. "Sempre gostei de coisa complicada. Parece brincadeira, mas não é. Gosto de me aprofundar, de ir atrás de informações que não estão claras", explica, destacando também que a curiosidade quase inesgotável faz com que se interesse por assuntos que, normalmente, as pessoas acham chatos. Como é o caso da Economia e seus números e siglas. Ser uma espécie de intermediária do leitor com o setor é um prazer para Marta, que compara: "Se as pessoas voltassem metade da atenção que dão para Esportes, para Política e Economia, nosso País seria outro".

A escolha pela área, garante ela, nunca foi planejada, nem mesmo o curso de Jornalismo. Entrou na faculdade para cursar Publicidade, mas conhecer a Comunicação mais de perto a fez se encantar pelo mundo das notícias. "Não escolhi o Jornalismo por acaso, foi mergulhando nesse mundo que acabei descobrindo minha verdadeira vocação", explica. Apesar do breve engano, tem certeza que a vocação sempre esteve mais próxima das palavras do que da criatividade, pois contou com muito incentivo desde criança, quando era rodeada de livros.

Antes de atuar em Zero Hora, passou por um estágio na assessoria de comunicação da Rede Ferroviária Federal, pela produtora de filmes Z Propaganda, pelo jornal A Semana, da região carbonífera - Butiá, São Jerônimo, Arroio dos Ratos -, e pela Rádio Guaíba. Na atual emissora do Grupo Record, trabalhou como produtora do programa Guaíba Revista, apresentado por Lasier Martins, por volta de 1986. Não demorou para acumular atividades com o Correio do Povo, como repórter. Economia? "Não. Cobria a editoria de esporte amador. Era a vaga que tinha e eu precisava começar de alguma forma", recorda, para em seguida registrar que chegou a escrever 14 laudas sobre Vela, um esporte elitista. "Tinha que agregar muita informação. Foi uma ótima escola", reflete.

Aprender com o dia a dia

A busca pelo novo e a paixão pelo desconhecido são alimentadas diariamente. Foi em março que Marta assumiu como editora, mas o pouco tempo é suficiente para fazê-la sentir saudade de escrever mais. Uma pauta sugerida quando ainda era repórter foi aceita recentemente pela equipe (quando ela já ocupava o novo cargo), no que ela reagiu: "Ah, mas eu quero ir pra rua fazer essa matéria, não pode?", brincou, completando que acredita que todo jornalista tem a reportagem no sangue. Estar em uma posição de liderança não é algo muito novo, uma vez que se considera "metida" e conta que sempre se envolvia com as edições de matérias, inclusive nas dos colegas. 

Outro aspecto que faz Marta ter prazer em trabalhar é contribuir com sua equipe. "Gosto de saber que a minha experiência pode ajudar os jovens. Também adoro trocar aprendizado." Em uma dessas trocas, ela conta que faz um alerta para a geração "mais acomodada com internet e telefone": "Até hoje conto que, no jornal A Semana, fazia minhas pautas em uma máquina de escrever dentro de uma Kombi, que me transportava entre uma cidade e outra. Não tinha nem sede. Isso é para mostrar que não podemos nos acomodar", ensina a editora.

Repórter premiada como poucos, Marta acumula cinco ARIs de Jornalismo em Reportagem Econômica (2000, 2001, 2003, 2009 e 2011), sendo um deles conferido em conjunto com a Associação Laitno-Americana de Propaganda. Também foi agraciada com uma menção honrosa no Prêmio Onip. Ela reconhece a importância de títulos e diz, ainda, que eles consolidam uma carreira, mas garante que há algo que a enaltece ainda mais: o elogio de um leitor. É neste momento que os olhos chegam a ficar marejados. "Olha, que boba", brinca sobre ela mesma. "A forma como as pessoas se expressam e te agradecem é realmente para entusiasmar. Acho que o fato de sempre ter gostado de conversar com as pessoas reforça a importância que dou para o retorno do leitor".

O que lhe faz feliz

Casada há 15 anos com o colega de profissão e de redação Luiz Adolfo Lino de Souza (editor executivo de Arte de ZH), ela conta que se conheceram quando ambos trabalhavam na Caldas Júnior. "É um grande parceiro, mas não posso falar muito, porque senão? Olha só", interrompe para conter os olhos novamente marejados. "A nossa parceria é mais humana e menos profissional", diz, para explicar o fato de, apesar de serem jornalistas, tentam, na medida do possível, deixar questões profissionais fora de casa, já que elas são vividas com intensidade durante o horário de trabalho.

Ao falar para a seção Perfil de Coletiva.net, em 2006, Luiz Adolfo contou que o casal adora viajar e que está sempre programando novos destinos, seja para onde for. O hobby é confirmado, seis anos depois, por Marta. "Qualquer viagem me diverte", ri. Das experiências, não há local visitado que não a fizesse voltar. Por motivos óbvios, a Itália é uma das viagens especiais, mais especificamente Fontana Freda, cidade de onde veio a família paterna.

Outro programa de lazer é a sétima arte. "Ela 'me arrasta' para o cinema todos os finais de semana, todos", revelou, na época. Não há gênero preferido para o casal, mas há os que não se prestam a ver: "Os muito idiotas". Na lista de melhores obras, estão os clássicos 'Casablanca', de Michael Curtiz, e 'Cidadão Kane', de Orson Welles, além do filme de Sérgio Leone, 'Era uma vez na América'. Para ouvir e curtir, garante que muitos estilos lhe agradam, desde que não seja o que chama de "esses tchu tcha tcha". Herdou do pai o gosto pela música clássica, por exemplo, mas samba e bossa nova também podem lhe fazer bem. Rata de livraria, como ela se chama, conserva o hábito da leitura, adquirido na infância, mas confessa que atualmente lhe falta tempo para tal prática.

Pode até surpreender, mas a comida preferida não é propriamente massa. Até gosta, mas na mesma intensidade em que cita sushi, por exemplo. Adora cozinhar e garante ter algumas especialidades famosas entre amigos e familiares, como bacalhau e lasanha. Já Luiz Adolfo escolhe sempre um prato que Marta considera muito simples, "um franguinho com queijo".

Marta, um personagem

Entre diversas situações marcantes da carreira, Marta cita uma do início na área de Economia. Quando foi cobrir uma reunião do Mercosul, na Argentina, pela primeira vez, achava que deveria ir vestida de forma mais social, e foi de saia justa e salto alto. O hotel onde seria o encontro ficava um pouco afastado da cidade, em meio à natureza. "O caos estava instalado", relembra. A imprensa ficava em uma barraca fora do hotel, o chão era gramado e, em determinado momento, era necessário pular um muro. Diante do desafio, olhou para o muro, para a saia, para o sapato, para os colegas e? "pulei como estava mesmo".

A história divertida é contada até hoje aos mais jovens para mostrar o total despreparo para o momento e, ao mesmo tempo, a forma como resolveu a situação. "Tive que usar jogo de cintura para fazer o que precisava ser feito, que era a cobertura". Para quem inicia na profissão, ela prefere não dar receita, mas diz que "estar com radar sempre ligado e se interessar por tudo, sempre ajuda". Mesmo com tanto conhecimento de causa, Marta não fecha suas habilidades apenas para o Jornalismo, tanto que se veria em outras áreas, como Botânica, Química, Engenheira - de preferência atividades fora do lugar comum.

São quase 30 anos de carreira, mas ela nem pensa em sentir-se realizada e explica o motivo: "Isso parece ser para pessoas que estão prontas. Eu quero muito mais ainda". Se o fato de estar em constante busca pelo aprendizado e o desafio puder ser considerado um lema, este é o seu, porém prefere encarar como uma atitude.

Marta se considera bastante flexível, pois não convive bem com a ideia de não poder mudar. Por outro lado, considera como defeito o seu pavio curto. "Acho que é coisa de sangue italiano. Estouro na hora, mas passa em seguida", pondera, explicando que sabe reconhecer quando explode sem razão. Outra característica que ela vê em si mesma é não ser nada impulsiva - aliás, até demora para fazer algumas escolhas -, nem consumista, já que só compra por necessidade. Afinal, quem é Marta Sfredo? Ela não sabe: "Se soubesse, contaria, mas ainda estou na busca desse personagem".

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