Vanessa Pires: uma completa apaixonada

Um pequeno livro foi o responsável pela decisão mais importante da sua vida, a de assumir o compromisso com o Jornalismo

Vanessa Pires - Crédito: Yul Barbosa

Dona de um sorriso largo e cativante, a jornalista Vanessa Pires decidiu, ainda na infância, o que queria para a sua vida. A mãe, Maria Luiza, advogada, via na filha sua sucessora, mas a ida a uma livraria foi determinante para mostrar que isso não seria possível. Como o prometido, poderia escolher um livro, logo uma obra chamou a sua atenção: 'O que é Jornalismo', de Clóvis Rossi, da Coleção Pequenos Passos, para ela "foi amor à primeira vista". "Vi que a profissão consistia em falar, escutar as pessoas, filtrar e depois transmitir a informação. Poxa, interessante, acho que quero ser jornalista. Aos 12 anos descobri a minha vocação", afirma.

Gaúcha de Esteio, Vanessa foi ainda criança para Ji-Paraná, município localizado em Rondônia (RO). O plano era ir ao casamento do tio, mas tudo mudou quando a mãe recebeu uma proposta de emprego. A estadia de alguns dias durou 10 anos. A jornalista relembra a infância difícil quando saíram daqui apenas com uma mala. Para conseguir viajar, foi necessário vender tudo que tinham, ainda assim não foi suficiente. A ajuda veio em forma de presente. Idione, na época esposa do avô materno, seu Demétrio, deu para ela e a mãe uma passagem de avião de ida para Porto Velho (RO). Posteriormente, o pai, seu Roney, e a avó materna, dona Maria Clementina, conseguiram ir encontrá-las. 

Para Vanessa, uma foto, tirada na chegada ao aeroporto, fala muito sobre a sua história. "Era a minha mãe com uma mala numa mão e eu na outra. Para mim, é uma imagem emblemática, pois quando retornei também tinha apenas uma mala na mão", conta. Durante quatro meses, moraram de favor na casa do tio. Quando a mãe conseguiu alugar uma quitinete, mudaram-se, levando emprestado um colchão, um fogão e uma geladeira. Roupas, livros e demais pertences eram organizados no chão. A jornalista conta que para não entrar insetos em casa sua mãe tapava o buraco do ar-condicionado com um papelão, porém não contava com as fortes chuvas todo fim de tarde. "A primeira noite de chuva alagou tudo. Os livros da minha mãe ficaram boiando. Foi um horror", ri ao lembrar.

Com a chegada do pai, alugaram também a quitinete da frente, assim em uma ficava o quarto e banheiro e na outra a cozinha. Com uma leve melhora na situação financeira, mudaram-se para um apartamento, mas, para Vanessa, o ápice foi quando foram para um de dois quartos, pois um seria só dela. "Todos os dias via a garra deles para vencer na vida. Como não me inspirar e querer ser alguém melhor todos os dias?", declara.

A emancipação

Aos 17 anos, convicta da decisão de ser jornalista, retornou para Esteio, já que na cidade não havia faculdade de Jornalismo reconhecida pelo Ministério da Educação (MEC). Sem desconfiar, seus pais haviam a inscrito no vestibular da Unisinos. Formada pela universidade, a mãe desejava que a filha estudasse lá. Durante um ano, se dividiu entre a casa da avó paterna, dona Marley, e do avô materno. Com o dinheiro, resultado de uma ação vencida pela mãe, ganhou um apartamento e foi emancipada. 

O início da trajetória profissional começou já no segundo semestre da faculdade. Em 2001, encarou o primeiro estágio em um site, algo inovador para a época. Durante alguns meses seu relógio despertava, todos os dias, às 5h. "Pegava dois ônibus e o trem. Gastava mais de passagem do que recebia de bolsa. Quem nunca, né? O objetivo era aprender", explica. Uma grande oportunidade estava por vir. Após uma seleção para monitoria, Vanessa ganhou uma bolsa de estudo. Para melhorar, ficou sabendo de uma vaga de estágio para auxiliar de produção para a TV Unisinos. Insegura, mas com muita vontade de encarar esse desafio, foi perguntar para os professores como era o trabalho. "Imagina eu, com essa altura toda, 1,55m, saindo para uma externa carregando câmera, tripé e grua? Mas funcionou!", conta, satisfeita. 

Interessada e curiosa, fazia mil perguntas para cinegrafistas e editores de imagens. Atuando como produtora e editora, Vanessa passou por todos os programas da emissora, mas estava na hora de ir para a frente das câmeras. Daniel Pedroso, na época coordenador da TV, achou que era o momento da jornalista apresentar o programa 'Zinco Quente', atração voltada para o público jovem. "Disse não, tu tá louco. Não levo jeito, além disso, diziam que eu tinha voz de Mickey", recorda. Como forma de a persuadir, Pedroso disse que se ela não aceitasse, teria que achar alguém, o que resultaria na perda da bolsa e do estágio. "Bom, já que tu falas com tanto carinho, quando eu começo?", relembra. Depois de formada, foi contratada como repórter de rede, onde também atuou no Canal Futura, veiculado à TV Unisinos. "Digo com muito orgulho que foi ele que me inventou repórter. Abracei isso de uma maneira inexplicável", evidencia.

Novos ares

Após dois freelas na Band, candidatou-se para um cargo de confiança na TVE. Seu currículo e portfólio chamaram atenção do jornalista Jorge Seadi, na época, responsável pela seleção. Durante um ano, apresentou o 'Jornal da TVE', junto com Marcelo Bergter. Com uma nova passagem pela Band, que durou quatro anos, fez de tudo, inclusive, a produção e apresentação do 'Agroband', então comandado pela jornalista Lizemara Prates. "Ela foi muito generosa. Sempre que tinha alguma dúvida parava para me explicar. Cresci muito como profissional", diz.

Mas um plantão de final semana vai ficar para sempre na sua memória: era 27 de janeiro de 2013, incêndio da Boate Kiss. Durante uma semana, ficou com a equipe em Santa Maria. Vanessa relata que foi a viagem mais silenciosa que já fez. "Quanto mais próximos da entrada da cidade, mais caminhonetes passavam em alta velocidade. Depois, descobrimos que eram as famílias das vítimas. No que chegamos, o silêncio era tão grande que nem o piar de um passarinho se escutava. Todas as noites chorava sozinha no quarto do hotel", conta, emocionada.

A oportunidade de ir para a Record TV RS chegou em 2013. Após conhecer seu trabalho, a então gerente de Jornalismo, Ana Raquel Copetti, a chamou para uma conversa. Logo, estava cobrindo as pautas da madrugada. No mesmo ano, passou a repórter oficial do programa 'Balanço Geral'. A sintonia com o jornalista Alexandre Mota se mostrou desde o início da parceria. Além dele, também contava com o apoio do editor-chefe do jornal, José Henrique Ferraro, um velho conhecido da TV Unisinos. Das filiais que produzem o programa, Vanessa foi a primeira mulher a apresentar a atração. Atualmente, também é apresentadora substituta do 'Cidade Alerta'. 

Tudo pela notícia

Durante uma viagem de férias para Europa, ficou presa em Portugal, após o vulcão Eyjafjallajoekull entrar em erupção na Islândia e fechar todo espaço aéreo. Trancada no aeroporto por três dias, Vanessa conseguiu chegar até o superintendente para entrar ao vivo na rádio para falar sobre a situação. "Jornalista é jornalista sempre e em qualquer lugar", justifica. O conhecimento da língua inglesa, um pouco da italiana e alemã, ajudou a fazer algumas amizades que, ao descobrirem que havia um avião saindo para o Brasil, correram para avisá-la: "Ser metida me ajudou a embarcar no primeiro voo de volta". 

A sua altura - ou falta dela - é sempre motivo de brincadeiras durante as externas. Pedras e até mesmo um case já foram utilizados para conseguir um bom enquadramento. Uma dessas ocasiões foi quando estava para entrar ao vivo com Giovani Feltes, ex-secretário da Fazenda do Governo Sartori. Aos risos, ela conta: "Ele é muito alto e o tempo tava acabando. Daqui a pouco um dos guris perguntou se topava subir no case e eu falei, quando neguei alguma coisa para vocês?".

Mas nada se compara aos minutos de emoção vividos na caçamba de uma caminhonete da Guarda Municipal de Cachoeirinha. A matéria era sobre uma ação policial ocorrida um dia antes, mas no meio da entrevista tocou o rádio do quartel anunciando o roubo de um caminhão. A equipe acompanhou os guardas. Após meia hora sem sinal do veículo pararam para aguardar informações. De repente um caminhão vermelho passou e o guarda identificou a placa: "É ele, gritou o homem. Nisso, o cinegrafista pulou na caminhonete e eu pulei junto. Toda torta no chão, disse: Mota, estamos ao vivo em perseguição". Já parado, foi confirmado que o automóvel estava em situação de furto e roubo, mas o motorista disse que não sabia. 

A fórmula perfeita

Casada com Felipe, policial rodoviário federal, é mãe da Nany People, uma calopsita, e duas cachorrinhas, Elke Maravilha, uma Shih Tzu, e Tina Tuner, uma buldogue francês. É inevitável não ter curiosidade em saber a origem dos nomes. "A crista amarela e o vermelho das bochechas lembram muito a maquiagem da Nany. Elke foi ideia da minha mãe, que conheceu a artista pessoalmente quando recebeu o prêmio 'Oscar Mulher'. Já a Tina, foi em um momento que fiquei olhando ela caminhar com aquelas coxinhas bem formadinhas e musculosas, que são iguais as da cantora", explica.

Completamente apaixonada pelo ofício, Vanessa não se vê trabalhando em outra área e se mostra agradecida por tudo que já viveu e pelos profissionais que já fizeram parte da sua trajetória. Valoriza muito aqueles que a acompanham diariamente, como os cinegrafistas e auxiliares: "Chamo eles carinhosamente de meus meninos. TV não se faz sozinha. Sem eles, seria impossível".

Filha única, Vanessa sempre foi incentivada a correr atrás dos seus objetivos, mesmo diante das dificuldades. "Sua família é composta por mulheres fortes", lembra as palavras da mãe. "Ela sempre me deu o suporte necessário para que eu corresse atrás dos meus sonhos. Para que eu fosse uma pessoa realizada", completa. Ainda no Canal Futura, assistiu a uma palestra do jornalista José Hamilton Ribeiro, que dizia ter uma fórmula para ser um bom profissional: "Uma grande reportagem precisa ter um bom começo e um bom final, regados a talento e trabalho na potência necessária". "Guardei as palavras dele no coração".

Com pouco tempo de conversa é possível perceber o quão alegre e brincalhona é Vanessa, mas ela faz questão de frisar que é muito séria e profissional: "Sou caxias e muito certinha". Para ela, ser jornalista é muito difícil, exige persistência e uma dose de amor. "É muito pé no barro, chuva e sol na cabeça. Costumo dizer que somos guerreiros da notícia e operários da informação", finaliza.

 

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