E agora? Reflexões sobre eventos e seus novos formatos

Por Daniela Sallet, para Coletiva.net

Eis que meu mundo de mestre de cerimônias, mediadora e apresentadora mudou. E o de tanta gente envolvida com o setor. A pandemia impactou todos os eventos deste inusitado 2020. Congressos, feiras e premiações tradicionais ou foram para o final do segundo semestre, ou para o ano que vem, sempre com a chance de nova transferência de data. Ou adiados, ou cancelados, simples assim. Se esta nova era "pandemiática" trouxe algo de bom foi a necessidade de todos usarem talento, imaginação e criatividade para fazer o que precisa ser feito de forma diferenciada. O tantas vezes repetido "reinventar-se". Não foi diferente com os eventos, substituídos por lives, webinars ou os híbridos quando o apresentador está num estúdio enquanto os convidados/palestrantes entram online de suas casas ou locais de trabalho. E o público pergunta nos chats.

Mediei alguns eventos diretamente do meu home office e um híbrido de um estúdio. Aliás, muitas produtoras já se especializaram nisso, sem falar no mercado que se abre aos profissionais que, remotamente, dão todo suporte técnico. Os próximos estão na agenda e até lá aproveito o que estes tempos tem de bom: TEMPO para acompanhar tendências, fazer cursos, participar de aulas, e aprender diretamente de casa, conectada, sem tirar o carro da garagem. É uma preciosa oportunidade para observar o que dá certo e o que não funciona à distância. Afinal, com notificações pulsantes no alto da tela, smartphones avisando freneticamente a chegada de cada nova mensagem e a sedução de aplicativos como o TIK TOK, o desafio é manter a atenção de quem acompanha uma programação online. Como, enfim, engajar esse público não presencial?

Qualidade da internet é o número 1 dos quesitos. Pode até cair a conexão de um convidado, mas, não é aceitável um evento virtual que apresente, de cara, problemas genuínos da virtualidade, ou seja, de rede. Em especial, se isso ocorrer exatamente no estúdio, onde está o apresentador. Pega mal, é o próprio anticlímax logo na largada. Qualidade técnica também significa um cenário agradável, iluminação primorosa, recursos visuais tecnológicos.

A informalidade é inevitável. Esqueçam púlpitos, nem os de acrílico funcionam num evento virtual. Esqueçam também vocativos, aquelas intermináveis citações de nomes, algo que já cansa presencialmente, imagine online. Nada do tom professoral ou litúrgico, o Mestre de Cerimônias (MC) ou apresentador deve ser um anfitrião que dialogue com espontaneidade, com uma interação que aproxime verdadeiramente quem está no computador ou no celular. Aliado a isso, a objetividade. As pessoas cansam mais no ambiente da tela. Que os agradecimentos aos patrocinadores sejam breves, e os longos currículos dos oradores dispensados. Nem pensar naqueles detalhes sobre a vida privada dos convidados, às vezes, equivocadamente incluídos para dar sinais de descontração. É preciso espontaneidade, sim, mas sem perder de vista quando o evento em questão é corporativo. Para o MC, importante é focar nas informações essenciais e aproximar, da forma mais acolhedora possível, o público que ele não vê dos palestrantes com quem ele conversa. É aquela "costura" complementando temas apresentados, chamando o que vem em seguida, dando unidade ao que acontece. Certo que, para isso, precisa ter familiaridade com o tema, apenas ler o roteiro é algo que não prospera num evento online. O mesmo vale para a figura do mediador, muitas vezes incluído nos painéis. Ele assume o papel de linkar conteúdo e pessoas, fazer o contraponto. A informalidade também vem sendo a marca das estrelas de uma programação. O palestrante, orador ou speaker, chame da forma que preferir, abre mão do formato acadêmico e vai direto ao ponto. Com domínio do conteúdo, traz tendências e inovações. E acerta muito quando aponta possibilidades a quem deseja ampliar seu conhecimento. Dia desses acompanhei a diretora de Marketing Regina Monge falando de Neurobranding, um conceito que alia o conhecimento das ciências cognitivas ao processo de construção das marcas. Ela finalizou indicando uma master class sobre o tema ao público interessado em saber mais. 

Claro que são observações mais adequadas ao público heterogêneo. Num encontro virtual científico, onde especialistas falam para especialistas, os temas são aprofundados pelos palestrantes, tudo foi planejado para isso. Mas a tão desejada pontualidade vale para todos. Cabe à produção orientar bem os participantes e ao MC ou moderador cumprir a tarefa, nem sempre fácil, de controlar os falantes. Pontualidade é sinônimo de respeito e também deve ser considerada por aqueles anfitriões que ainda se arriscam com discursos arrastados de boas-vindas que, além de chatos na autopromoção, atrasam o cronograma já no início. Ninguém-aguenta-mais!  Se no evento presencial o público não levanta e sai por constrangimento, no mundo virtual é simples retirar-se discretamente, basta um clic para deixar o orador falando sozinho.

Ainda estamos em construção, não se sabe exatamente quais mudanças vão se consolidar neste universo. Porque o contato direto faz a diferença também nos negócios e, cedo ou tarde, congressos, seminários e feiras voltarão a reunir muita gente. Por ora, tudo indica que os eventos híbridos vieram para ficar. É um formato que representa economia com viagens e hospedagem, facilita a participação, evita deslocamentos para áreas movimentadas das cidades quando fugir do trânsito é ganhar tempo, um ativo para qualquer profissional. Sem falar que, quando disponibilizada, a gravação pode ser acessada a qualquer momento pelos inscritos. Aos organizadores, um evento virtual  ganha ainda outra relevância quando os melhores momentos são editados e se tornam peças de divulgação para os próximos. O melhor das apresentações acaba instigando e ajuda a fidelizar essa plateia virtual. 

Se o distanciamento tem apresentado novas possibilidades ao setor, o rei dos eventos continua sendo o conteúdo. Quem participa busca algo novo, qualificação, agregar conhecimento. Mais do mesmo dificilmente engaja alguém. Outro desafio atual é criar mecanismos para fazer conexões mesmo em ambientes virtuais. Como pode ser a network das lives? É necessário criar pontes que, ao final, tragam resultados aos participantes. O encontro online também precisa de empatia, a palavra do momento. Empatia com os interesses da plateia virtual, com o tempo das pessoas e com as características dessa nova forma de comunicar. Num mundo real que valoriza cada vez mais as relações humanas e o acolhimento do público, também os eventos online têm que encontrar a fórmula para se conectar com o coração das pessoas.

Daniela Sallet é jornalista e apresentadora de eventos.

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